O governo marroquino perdeu o “braço de ferro” com a ONU ao
rejeitar o enviado pessoal do Secretário-Geral, o americano Christopher Ross,
disseram analistas.
Este fim-de-semana passado, Ban Ki-Moon confirmou Ross no
cargo e telefonou ao rei Mohamed VI de Marrocos para "reafirmar que o seu Enviado
Pessoal e seu novo Representante Especial (o alemão Wolfgang Weisbrod-Weber,
nomeado em junho) cumprirão os seus respetivos mandatos para promover o
processo de negociação e incentivar a melhoria de relações marroquino-argelinas".
Em maio, o governo marroquino anunciou que "retirava a
sua confiança" em Ross devido ao que qualificava de "comportamento
desequilibrado e tendencioso" (supostamente contrário à tese de Rabat), e
desde então os media marroquinos davam como certo a sua substituição por uma
figura de renome internacional, para o que chegaram a aventar nomes como o do
norte-americano Colin Powell.
Embora os porta-vozes do secretário-geral tivessem, por várias
vezes, deixado claro que Ban continuava a contar com Ross, o governo marroquino
continuou a criticar o diplomata, mas o telefonema do Secretário-Geral acaba de
vez com a controvérsia.
"É uma bofetada para o Marrocos", disse à Efe Ali Nouzla,
diretor do portal Lakome.com e um dos poucos jornalistas que escreveram sobre o
caso para além das interpretações de cunho nacionalista.
"Retirar a confiança a Ross sem ter consultado os
parceiros internacionais de Marrocos nem as forças dentro do país foi um disparate
e ainda estamos a pagar as consequências", lembrou Nouzla.
Interpretação semelhante é compartilhada pelo professor e
politólogo Larbi Benotmane, que não duvida em falar de “uma enorme derrota
diplomática” para o seu país que, no caso Ross, teve “ um comportamento de
amador, alimentado por uma excessiva autointoxicação”.
Benotmane considera que o governo marroquino “não avaliou as
consequências” ao recusar Ross, a quem ele considera um político do "establishment"
norte-americano, o que significa que Rabat pôs contra si um dos seus teóricos
aliados, os EUA.
Uma das principais queixas contra Ross por parte de Marrocos
é sua insistência em se agarrar à independência da missão da ONU no Sahara
(MINURSO que, segundo ele, tinha sido
negligente quando se tratava de afirmar a sua neutralidade) e o seu suposto
intento de fazer com que esta missão tivesse um mandato sobre questões
relacionadas com os direitos humanos.
O governo marroquino considera plena a sua soberania sobre o
território que ocupa no Sahara e não vai aceitar qualquer cedência ou permitir
que qualquer órgão não-marroquino tenha qualquer tipo de autoridade que se
sobreponha à do governo.
Embora não haja nenhuma visita de Ross anunciada à região, é
uma incógnita como irá ser recebido em Rabat na sua próxima viagem, depois de
todo este imbróglio diplomático.
Ontem, a agência oficial de notícias marroquina MAP repegou numa
entrevista ao secretário de Estado marroquino dos Negócios Estrangeiros,
Youssef Amrani, na qual este recordava que Marrocos "precisa de um novo
mediador da ONU", mas a agência viu-se forçada a retificar depois, por
duas vezes, que a entrevista fora realizada em julho, ou seja, muito antes do telefonema
de Ban Ki-moon ao rei Mohamed VI.
O Professor Benotmane considera que o atual ministro dos
Negócios Estrangeiros e da Cooperação, o islamita Saadedín al Otmani, não é o
homem adequado para sair deste "impasse" diplomático, embora não
tenha sido ele que o tenha criado, mas provavelmente alguém próximo do rei
Mohamed VI.
Enquanto isso, um outro interveniente norte-americano, embora
seja uma organização não-governamental, como é o Robert F. Kennedy Center for
Justice and Human Rights, também provocou a ira dos media e organizações pró-marroquinas
ao levar a cabo uma missão no território do Sahara de averiguação quanto ao respeito
pelos direitos humanos.
Embora a delegação tenha afirmado que durante três dias
reuniu "com um amplo espectro" da sociedade saharaui (tanto
pró-independência como pró-marroquino), ela tem sido alvo de ataques prontamente
recolhidos pelos principais meios de comunicação pelo seu suposto alinhamento "com
a tese dos inimigos da integridade territorial do Reino ", de acordo com a
versão da agência oficial de notícias MAP.
Javier Otazu (correspondente da EFE em Marrocos) / Rabat, 28
de agosto de 2012 (EFE)
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