sexta-feira, 28 de setembro de 2012

"Oxalá aqueles que apoiam Marrocos cheguem à razão"


Pescadores (marroquinos) descarregam
sardinha no porto de pesca de El Aaiún

 O delegado da Frente Polisario em Madrid, Alí Mokhtar, assegura em entrevista ao jornal “Publico” de Espanha que a pressão internacional acaba por dar os seus frutos…

Após anos de pressões para que as empresas se retirem das cidades do Sahara Ocidental — ocupadas por Marrocos desde 1975 —, a Frente Polisario reconhece que os interesses económicos estão cedendo aos pedidos de que se acabe com a espoliação dos recursos naturais saharauis. O proveito de que essas empresas internacionais ali obtêm não se traduz em nenhum benefício para o povo saharaui, daí que o braço político do seu governo — a Frente Polisário —, qualifique de "pilhagem" as atividades destas empresas no Sahara Ocidental ocupado. Ali Mokhtar, representante em Madrid da Frente Polisario, pede agora a Marrocos que comece a respeitar os direitos humanos, outra questão denunciada por parte das associações civis que trabalham na região.

Como avalia a Frente Polisario a decisão da empresa “Jealsa”(1) de deixar de embalar as suas latas de conservas na fábrica de El Aaiún?

Acolhemos com otimismo a notícia e felicitamos a empresa por ter tomado esta decisão que se ajusta ao direito internacional. Era uma reivindicação do povo saharaui, também da comunidade internacional, que estava pendente de que a justiça triunfasse.

Que explicações encontra a Polisario para esta mudança?

Sem dúvida às pressões sociais. Marrocos é sujeito a cada vez maiores pressões, não só em termos económicos, mas em relação ao respeito pelos direitos humanos. Estamos convencidos de que, mais cedo ou mais tarde, irá prevalecer em todas as áreas o direito saharaui, para que termine definitivamente a espoliação e se respeite a integridade territorial do Sahara. A pressão da sociedade civil em solidariedade com povo o saharaui cresce não só em Espanha, mas na Europa e em todo o mundo. Exemplos disso são o recente relatório do Centro Kennedy assim como a visita do relator especial da ONU sobre a tortura. Tudo isso leva a que Marrocos sinta, de facto, uma forte pressão internacional e que as empresas envolvidas na pilhagem dos recursos tomem consciência e se retirem. Esperamos que a pressão prossiga e oxalá que aqueles que apoiam Marrocos cheguem à razão.

A população saharaui beneficiava de alguma forma com os empregos oferecidos pela empresa de conservas galega na sua fábrica de El Aaiún?

Quem beneficia são as autoridades marroquinas e as empresas que apoiam a exploração. Os saharauis são cada vez mais marginalizados, social e economicamente. Por isso ocorreram os acontecimentos de Gdem Izik [o acampamento de protesto civil, erigido nas redondezas de El Aaiún e que foi arrasado pelas forças de segurança marroquinas em novembro de 2010, com um desfecho de vários mortos, feridos e presos] contra a marginalização e a pobreza cada vez mais evidentes. Tenho um parente nessa empresa e é um facto que o número de trabalhadores marroquinos é esmagadoramente maior do que o de saharauis. Além disso, há uma grande diferença entre os saharauis e os marroquinos, os primeiros são cidadãos de segunda classe.

Alí Mokhtar

A Polisário denunciou a pilhagem dos recursos naturais saharauis por parte de empresas europeias. Que respostas obtiveram dessas empresas?

Ao longo dos anos as empresas estão entendendo que nos Sahara estão a violar a lei internacional, estão sendo violados os direitos do povo saharaui, e que nenhum país ou organização internacional reconhece a soberania de Marrocos sobre o Sahara. Também a pressão que vem da sociedade civil ou da União Africana é muito importante. As organizações internacionais apelam às empresas que se mantenham afastadas do território até que se chegue a uma solução do conflito, que passa pela realização de um referendo de autodeterminação.

Sabe em que estado se encontra a negociação do próximo acordo das pescas entre a União Europeia e Marrocos?

Temos uma presença permanente no Parlamento Europeu e acompanhamos de perto a questão. Há um bom precedente e existe a consciência de não misturar as coisas, deixando claro que o Sahara é um território que está pendente de descolonização. Esperamos que a Espanha não pressione para que o acordo seja assinado contra a vontade do povo saharaui e que assuma, de uma vez, a sua responsabilidade histórica.
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(1) A presença da “Jealsa” no Sahara Ocidental data de 2006, quando conserveira da Coruña se estabeleceu na capital saharaui ocupada, procurando a proximidade com o rico banco pesqueiro da região [O Sahara Ocidental possui uma das mais ricas plataformas marítimas, em variedade e quantidade de recursos pesqueiros]. A conserveira galega aliou-se a um sócio local e formou a UTE Damsa, de que a Jealsa possui 55% do capital social. Até maio, a etiqueta dos produtos ali embalados — cerca de 30 milhões de latas ao ano — indicava "Marrocos" como país de origem. Estas conservas tinham como destino final os Supermercados Mercadona.

Publico.es

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