sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Javier Bardem fala do Sahara à CNN

Bardem: "Esta situação é muito injusta, e está mais 
do que provada. Não devemos fechar os olhos a esses abusos."
Javier Bardem é primeiro ator espanhol a ganhar um “Oscar”. Ele aparece no mais recente filme James Bond, "Skyfall" e entre os seus outros filmes estão "No Country for Old Men", "Biutiful" e "Vicky Cristina Barcelona". Clique aqui para mais detalhes sobre o filme "Filhos das Nuvens:. A última colónia".  Clique aqui para mais detalhes sobre a Petição Fundação RFK sobre o Sahara Ocidental.

Madrid (CNN) — A primeira vez que fui ao Sahara Ocidental em 2008 foi para assistir ao Festival Internacional de Cinema do Sahara, o único do seu tipo a ocorrer num campo de refugiados. Cheguei lá sabendo apenas um pouco sobre a situação na região, que tem sido esquecida pelas agendas da maioria dos países e ignorado pela media em geral.

Como acontece com todos os que visitam a área, voltei chocado com o abuso de Marrocos aos direitos do povo saharaui. Eu só passei lá 10 dias. Mas, desde então, venho tentando me envolver na questão, e fiz um filme ("Filhos das Nuvens: a última colónia") para tentar chamar um pouco de atenção para esta esquecida situação.

Marrocos é um forte aliado estratégico no Norte Africano da Europa e dos Estados Unidos. E claro que nós sabemos como o mundo funciona; nós entendemos aquilo que é conhecido como "real politik" — que os países têm de lidar com outros países, cujas ações eles desaprovam, em nome de um "maior interesse económico ou estratégico" — mas eu pergunto-me se não há algo mais importante do que a razões económicas e estratégicas... alguma responsabilidade moral que nos impeça de manter relações com países que violam os direitos humanos.


O Sahara Ocidental foi uma colónia de Espanha até à morte do ditador General Franco, em 1975. Depois disso, nós, uma fraca e instável a Espanha, abandonou o território para Marrocos, que o invadiu militarmente. Marrocos tomou o controlo militar de dois terços do território. Esta terra, rica em fosfatos e bancos de pesca, é uma área hoje conhecida como territórios ocupados. Uma grande parte da população saharaui fugiu para a Argélia, onde vivem cerca de 300 mil pessoas em campos de refugiados.

A morte de Franco foi o termo de um período muito escuro para a Espanha, e a última coisa que a Espanha queria era mais um conflito com Marrocos. Desde então, e de acordo com a ONU, Espanha tem um papel administrante no Sahara, e mais importante ainda: tem uma forte responsabilidade ética com o que acontece com as pessoas de lá. Não só a Espanha, mas os mais fortes aliados de Marrocos, França e Estados Unidos, também responsáveis ​​enquanto líderes mundiais e membros do Conselho de Segurança da ONU. Juntos, devem colocar um fim ao sofrimento do povo saharaui sob a ocupação marroquina.

O enviado das Nações Unidas, Christopher Ross, acaba de regressar da região com um relatório documentando muitos abusos dos direitos humanos por parte das forças de ocupação marroquinas. Ele colocou as duas partes opostas — o governo marroquino e a força política saharaui, a Polisario — juntos, numa tentativa de realizar um referendo, conforme o determina o plano de paz da ONU assinada por todas as partes, incluindo Marrocos, em 1991. Marrocos, em vez disso, tem falado na incorporação dos territórios ocupados num estado federal, mas o povo saharaui não quer ser parte de um Estado que o invadiu e dele abusou e o forçou a dar-lhe os seus recursos.

Nos territórios ocupados, está bem provado que o Marrocos tem violado os direitos humanos a cerca de 200.000 saharaius. Lá, é proibido o ajuntamento de duas ou três pessoas; enfrentam abusos generalizados na prisão, e não tem acesso a um julgamento justo. Essas pessoas estão a viver na escuridão. As autoridades marroquinas não permitem quaisquer testemunhas ou meios de comunicação internacionais nos territórios ocupados, numa tentativa de bloquear qualquer informação sobre os abusos de direitos humanos nos territórios.

Este mês, em especial, é de grande importância porque Marrocos assume a presidência rotativa do Conselho de Segurança das Nações Unidas, apesar do facto de isso ser errado enquanto aos saharauis lhe forem negados os seus direitos humanos.
Temo que isso vá atrasar o processo de resolução deste problema. Legalmente, o Sahara Ocidental tem a justiça do seu lado, da mesma forma que 2 +2 = 4, daí que tudo o que entrave o progresso deve ser superado.
Há outra razão para nos opormos a esses abusos: afinal, a Primavera Árabe começou no Sahara. Tudo está relacionado e, a menos que isto acalme, grupos que não pertencem ao Sahara Ocidental poderão surgir, e o extremismo possa eclodir, complicando ainda mais a situação.

A Polisario e os saharauis não concordam com extremistas muçulmanos. Eles são uma sociedade avançada, composta por pessoas que provaram a sua crença na resistência pacífica, na justiça internacional e na ONU. São pessoas que têm resistido aos abusos de Marrocos há 35 anos com uma enorme carga de paciência e fé nas resoluções da ONU.

É claro, pois, que é no melhor interesse de Marrocos, como do povo saharaui, e da comunidade internacional que o drama dos direitos humanos seja resolvido.

Todos os países que têm voto no Conselho de Segurança devem ter em conta essa questão, apoiando Ross nos seus esforços de trazer as duas partes ao imediato diálogo direto, e colocando pressão sobre os EUA, Espanha e França — os três países que mais tem a dizer e fazer sobre a opressão marroquina do povo saharaui — para resolver esta injustiça de uma forma justa e de uma vez por todas.

A situação é crítica neste momento, a instabilidade na região é crescente e os jovens saharauis estão perdendo a paciência e podem recorrer à violência por desespero e frustração. Toda a injustiça da situação está dramaticamente provada por muitos e muitos anos em demasia. Não devemos fechar os olhos a esses abusos. Não importa que razões comerciais e geoestratégicas sejam as dos nossos países, devemos continuar a permitir violações dos direitos humanos em nome do dinheiro?

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