Pepe Taboada, presidente da CEAS Sahara |
José Taboada, o presidente da CEAS Sahara (coordenadora da
solidariedade com o povo saharaui no Estado espanhol), explica que o ministro
de Negócios Estrangeiros de Espanha procurou dissuadir as associações de regressar
aos acampamentos de refugiados saharauis na próxima semana.
Apenas quatro dias depois do ministério de Negócios
Estrangeiros ter repatriado doze cooperantes espanhóis que trabalhavam nos
acampamentos de refugiados saharauis, um grupo de associações, ONG, políticos e
militantes prepara uma viagem de regresso a esta zona do sul da Argélia.
Objetivo: desmontar a imagem de insegurança que o ministro Margallo propagou e
levar ajuda humanitária a essa população que, há mais de 37 anos, enfrenta um
conflito político com Marrocos perante a indiferença do Governo espanhol. A
expedição foi montada de urgência devido à "encenação" que, na
opinião de José Taboada, presidente da Coordenadora Estatal de Associações pro
saharauis em Espanha (CEAS), constituiu a medida do MNE, justificada com a
alegação de um alto risco de sequestro. Taboada, que há mais de três décadas
visita a população refugiada do Sahara, relata ao jornal Público (de Espanha)
os detalhes do encontro mantido com o ministro dos NE depois das associações
terem anunciado uma visita de quatro dias aos acampamentos de refugiados com
início no dia 7 de agosto.
- O ministro
Margallo, procurou dissuadi-los da vossa viagem?
Estivemos reunidos duas horas e ele procurou convencer-nos de
que abandonássemos os saharauis. É uma vergonhosa campanha aquela que está a
ser feita a partir do MNE. Pensamos que o Governo espanhol caiu numa
armadilhada de Marrocos e tiveram que justificar a medida de trazer de volta os
cooperantes afirmando haver um iminente risco de sequestro. Não há maior risco
do que o que possa haver na Palestina ou no Irão. Não é justificável a campanha
do ministro de recambiar doze cooperantes num avião militar quando muitos deles
já tinham o seu bilhete de regresso em voo regular. Trata-se de uma montagem.
- Qual o objetivo desta viagem de regresso aos
acampamentos?
- Vamos demonstrar que a segurança é muito grande, e ao
ministério que não vamos aceitar manobras políticas que possam afetar a
população saharaui. Milhares de famílias viajam aos acampamentos para ver as
crianças que acolhem durante o verão e que já nos estão a perguntar se é seguro
ir. Normalmente tende-se a acreditar no que diz o Estado mas, na realidade, o
Estado é uma das entidades que mais mente; por vezes por inconfessáveis razões;
e é uma vergonha.
- O ministro Margallo
explicou-vos quais as razões que o levaram a repatriar os cooperantes?
- Disse-nos que tinha informação confidencial, dados
cruzados, que era algo iminente, que não podiam esperar nem um minuto mais...
Exagerou tudo. Ao princípio disse que se devia a uma intervenção militar que ia
ter lugar no Mali, embora não se tenha referido aos países limítrofes… e os acampamentos
estão a mais de 1.000 quilómetros. Depois mudou o discurso e disse que nos
acampamentos havia infiltrados de uma cisão da Al Qaeda - os mesmos que
sequestraram os cooperantes [Ainhoa Fernández, Enric Gonyalos e Rosella Urru].
Não se podem aceitar essas manobras jogando com a ajuda a um povo. Eles [os
saharauis] vivem da ajuda internacional – muitos, da ajuda espanhola- e se a cortas e colocas dificuldades acabas
por os estar a encurralar pela fome.
- Fizeram-vos assinar
um documento eximindo o Governo de responsabilidade em caso de sequestro?
Margallo disse-nos que um Estado não pode fazer assinar algo
de semelhante a ninguém; que o que foi apresentado a esse moço [José Oropesa, o
único espanhol que decidiu ficar nos acampamentos] deve ter saído um erro ou
uma má interpretação da agência que coordenou a saída dos cooperantes. Essa
ameaça foi ilegal e o ministro diz que o seu ministério não é responsável.
- Que interpretação faz da medida do MNE em
relação aos cooperantes?
- Todo isso está ligado ao discurso do rei de Marrocos ontem
em Rabat quando afirmou que o seu país quer ajudar Espanha a sair da crise. A
isto há que juntar o espaço que França está a deixar no reino de Mohamed VI,
com a postura de Hollande, que não mantem um apoio claro. Estes sintomas
apontam no sentido de que o Governo espanhol está a procurar ocupar o espaço
económico em Marrocos que a França poderá deixar. O PP falava de
‘responsabilidade histórica' com o Sahara, mas era quando estava na oposição.
- Quem integra o grupo que viaja na próxima
semana para o Sahara?
- A lista ainda não está fechada mas contamos com membros de
associações, de ONG, deputados, representantes de partidos políticos e
jornalistas. Esperamos poder contar também com representantes de vários
municípios. Uma vez nos acampamentos vamos visitar os projetos de cooperação e
conhecer em primeira mão as medidas de segurança tomadas pela Frente Polisario.
Levaremos também toda a ajuda humanitária que pudermos.
- Quais são as necessidades mais urgentes que
tem a população?
- As alimentares: azeite, arroz, massas, atum. Também
material escolar e medicamentos para os hospitais. É vital continuar a
trabalhar nos projetos de alimentos, como as hortas, e nas escolas de formação profissional,
como a de cinema, no acampamento '27 de Fevereiro'.
- Quanto tempo mais irá durar a medida
preventiva do MNE?
- Não o sabemos. Mas o ministro disse que há que encontrar
um plano de segurança grande junto com a Argélia e as Nações Unidas para o
apresentar na Agência Espanhola de Cooperação. Nisso estamos empenhados para
que já não se possam encontrar desculpas para dizer que é perigoso viajar aos
acampamentos. Na próxima semana também irão regressar os cooperantes. Além
disso, há voluntárias de França e de Itália que seguem também connosco.
PUBLICO [Espanha] - entrevista de Patricia Campelo
02/08/2012
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