Censura na
Universidade da Beira Interior
TEXTO: ANTÓNIO
GARCIA PEREIRA · 8 DEZEMBRO, 2016
Jornal
Tornado Online
A
Presidência da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas – FCSH da Universidade
da Beira Interior – UBI arrogou-se proibir uma Conferência organizada e
anunciada pelo CPRI – Núcleo de Estudantes de Ciência Política e Relações
Internacionais para o passado dia 6/12, às 14H30. Tal Conferência tinha como
tema “Sahara Ocidental: A luta pela autodeterminação de um Povo” e como
oradores Sidi Mohamed Balla, membro da Associação Saharaui de Presos e Vítimas
de Desaparecimento Forçado, José Manuel de La Fuente, Advogado e Presidente da
Fundación Sahara Occidental e Isabel Lourenço, membro da mesma Fundação e
colaboradora da publicação “Por Un Sahara Libre”.
Segundo foi
revelado pelo referido Núcleo de Estudantes, tal proibição foi decretada pela
Presidência da Faculdade na sequência e em obediência a manobras e pressões da
Embaixadora marroquina junto da Universidade contra a realização da dita
Conferência. E tentada justificar pela mesmíssima Presidência com o
absolutamente extraordinário pretexto de que “pretendia não criar um conflito
institucional de Estado que colocasse a Universidade da Beira Interior nos
órgãos de Comunicação Social” (sic). Ou seja, para agradar a um Governo
estrangeiro, neste caso o de Marrocos, uma Universidade portuguesa arroga-se
proibir a realização de uma Conferência organizada pelos seus estudantes sobre
um tema incómodo para o dito Governo!?
Proibição de um debate por o
considerar “político”
Ainda que
tal não seja inédito – recorde-se que já há dois anos atrás, em Novembro de
2014, a Direcção da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra também
tratara de proibir um debate por o considerar “político”… – este acto
absolutamente censório e prepotente não pode passar em claro (não obstante o
generalizado silêncio da chamada Comunicação Social “de referência”…) porquanto
se revela de uma enorme gravidade. Que aliás os organizadores e oradores não
deveriam ter aceite, realizando à mesma a dita Conferência, nem que fosse na
rua, à porta da Faculdade, para suprema vergonha desta e da sua Presidência.
É desde logo
inaceitável o argumento – usado por alguns defensores da censura – de que não
seria admissível que numa instituição pública se levasse a cabo algo de
incómodo ou desagradável para com um Estado estrangeiro com quem o Estado
Português mantém relações diplomáticas.
Direitos, liberdades e garantias
É que em
Portugal (ainda) vigora (artº 37º da Constituição), como um dos direitos,
liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos, precisamente a liberdade de
expressão e informação, e esta significa e implica que todos, sem excepção, têm
não só o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento por
qualquer meio, como também o direito de informar, de se informar e de ser
informado, sem qualquer tipo de impedimentos nem discriminações, não podendo o
exercício desses direitos ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma
de censura.
Ora se há
pessoas ou entidades que estão, também constitucionalmente e antes de todas as
outras, vinculadas ao estricto respeito por esses direitos são exactamente as
entidades públicas, com o Estado (e as suas universidades) à cabeça.
Mas a
questão é ainda mais grave exactamente por se tratar precisamente de uma
Universidade
É que uma
Universidade só faz real sentido se for um verdadeiro “campus” aberto, livre e
democrático, onde todas as correntes de opinião se possam expressar, e também
sujeitar ao debate e à livre troca de ideias.
Só assim se
pode ensinar e aprender e só assim se formam cidadãos activos e conscientes.
Esta teoria
fascistóide de que na Universidade não se podem levar a cabo conferências ou
debates que não sejam do agrado deste ou daquele Governo, ou deste ou daquele
Poder, é afinal a lógica da ditadura do pensamento dominante e da formação de
licenciados com mentalidade de carneiros, pré-dispostos a tudo aceitar.
Coisas
contra as quais os Jovens se devem erguer e lutar, resoluta e consequentemente.
E decerto, mais tarde ou mais cedo, o irão fazer!
Universitas magistrorum et scholarium
Começando
por não aceitar o ensino das chamadas “verdades oficiais” e da pretensa ciência
feita de teoremas indiscutíveis e indiscutidos. Mas também repudiando as
autênticas escolas de aprendizagem do servilismo e da humilhação que são a
esmagadora maioria das estupidificantes “praxes”. E, enfim, não aceitando nem
admitindo nunca qualquer tipo de discriminação (como se generalizou acontecer,
por exemplo, e até com as próprias associações de estudantes, com os debates em
tempo de eleições, para os quais apenas se convidam os partidos parlamentares…)
e muito menos de censura como o agora praticado na Universidade da Beira
Interior. Cujos responsáveis, do alto das suas borlas e capelos, nem sequer
conhecerão a origem etimológica da palavra Universidade (da universitas
magistrorum et scholarium, com a noção inerente de compartilha, discussão e
crítica de conhecimentos) e que sempre estarão prontos a tentar legitimar e
justificar o amordaçamento dos espíritos livres.
Mas que
jamais conseguirão compreender que, como dizia o poema de Manuel Freire e a
célebre canção da resistência, “não há machado que corte a raiz ao
pensamento”!…
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