A AFAPREDESA — organização com estatuto de observador na Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e reconhecida pelo seu trabalho na defesa das vítimas de desaparecimento forçado e repressão no Sahara Ocidental — denuncia perante a comunidade internacional a grave violação do Direito Internacional cometida pela União Europeia ao aplicar provisoriamente o acordo comercial assinado com Marrocos em 3 de outubro de 2025.
O pacto, que altera os Protocolos 1 e 4 do Acordo de Associação UE-Marrocos, estende de forma fraudulenta as preferências pautais a produtos provenientes do Sahara Ocidental ocupado, recorrendo à manipulação administrativa de os apresentar como parte de “regiões” marroquinas — Laâyoune-Sakia El Hamra e Dakhla-Oued Eddahab — apesar de as Nações Unidas reconhecerem explicitamente o Sahara Ocidental como Território Não Autónomo por descolonizar.
Um ato contrário à jurisprudência internacional
A violação não é apenas política: é juridicamente insustentável.
Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE)
A sentença de 4 de outubro de 2024 (C-778/21 P e C-798/21 P), confirmada em 15 de janeiro de 2025, reiterou princípios firmados em decisões anteriores:
-
O Sahara Ocidental é um território “distinto e separado” de Marrocos.
-
Nenhum acordo internacional pode ser aplicado ao território sem o consentimento do povo saharaui, representado exclusivamente pela Frente Polisário.
-
Supostos benefícios económicos não substituem o consentimento, e devem ser concretos, verificáveis e sujeitos a controlos independentes.
-
A população colona marroquina representa cerca de três quartos da população total dos territórios ocupados, segundo dados utilizados pela própria Comissão Europeia e citados no ponto 157 da sentença de 4 de outubro de 2024. Essa população, transferida ilegalmente pela potência ocupante em violação do artigo 49º da IV Convenção de Genebra, não pode substituir o povo saharaui, titular legítimo do direito à autodeterminação. O ponto 156 da mesma sentença reconhece que a maioria dos saharauis vive fora dos territórios ocupados — nos campos de refugiados na Argélia ou na diáspora.
O acordo de 3 de outubro de 2025 viola todos estes princípios e contraria abertamente a jurisprudência consolidada do TJUE.
Nações Unidas
A União Europeia viola ainda:
-
A Resolução 1514 (XV) da Assembleia Geral, que consagra o direito à autodeterminação dos povos coloniais.
-
As Resoluções 34/37 (1979) e 35/19 (1980), que qualificam Marrocos como potência ocupante.
-
Pareceres jurídicos da ONU, nomeadamente o de Hans Corell (2002): “Qualquer exploração de recursos naturais sem o consentimento do povo saharaui é ilegal.”
-
A Resolução 2797 (2025) do Conselho de Segurança, que reafirma a natureza do conflito, o direito à autodeterminação e a necessidade de uma solução conforme ao Direito Internacional.
O acordo agora aplicado pela UE ignora deliberadamente estas bases jurídicas, apoiando de facto a ocupação e legitimando a expansão económica marroquina.
Um pacto que legitima o saque e alimenta a repressão
O acordo de 3 de outubro:
-
Foi assinado sem o consentimento do povo saharaui, representado pela Frente Polisário, que o rejeita e prepara novas ações legais.
-
Não gera benefícios reais para a população saharaui, favorecendo empresas marroquinas e redes ligadas à ocupação militar.
-
Não prevê mecanismos independentes de controlo: a certificação de origem fica nas mãos da potência ocupante.
-
Utiliza rotulagem opaca e enganosa, escondendo ao consumidor europeu a verdadeira origem dos produtos: um território marcado por tortura, julgamentos militares, desaparecimentos e repressão sistemática.
O acordo não é técnico nem neutro: é um ato de cumplicidade económica e política com as violações de direitos humanos cometidas diariamente por Marrocos nos territórios ocupados.
Enquanto a UE abre as portas a tomates, melões ou peixe do Sahara Ocidental, os saharauis continuam a ser presos, torturados ou desaparecidos por exigirem algo tão básico quanto o direito internacionalmente reconhecido à autodeterminação e à independência.
AFAPREDESA EXIGE:
-
Suspensão imediata da aplicação provisória do acordo de 3 de outubro por violar o Direito Internacional e as sentenças do TJUE.
-
Que o Parlamento Europeu rejeite definitivamente este pacto ilegal.
-
Que a Comissão Europeia estabeleça um processo de consulta real com o único representante legítimo do povo saharaui: a Frente Polisário.
-
Que os Estados-Membros, especialmente Espanha enquanto potência administrante de jure, assumam as suas responsabilidades jurídicas e históricas na descolonização do território.
-
Que a UE deixe de financiar indiretamente a ocupação e passe a defender ativamente o Direito Internacional.
Uma mensagem clara: o povo saharaui não cederá
O povo saharaui não aceitará novas traições disfarçadas de pragmatismo. Continuará a lutar — nos tribunais, nas instituições e no terreno — com a força da justiça, da legitimidade histórica e do Direito Internacional.
Wilaya Chahid El Hafed, 26 de novembro de 2025

Sem comentários:
Enviar um comentário