quarta-feira, 26 de novembro de 2025

A aplicação provisória do Acordo UE-Marrocos de 3 de outubro de 2025 viola gravemente o Direito Internacional, a jurisprudência do Tribunal de Justiça da UE e o direito inalienável à autodeterminação do povo saharaui – Comunicado da AFAPREDESA



A AFAPREDESA — organização com estatuto de observador na Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e reconhecida pelo seu trabalho na defesa das vítimas de desaparecimento forçado e repressão no Sahara Ocidental — denuncia perante a comunidade internacional a grave violação do Direito Internacional cometida pela União Europeia ao aplicar provisoriamente o acordo comercial assinado com Marrocos em 3 de outubro de 2025.

O pacto, que altera os Protocolos 1 e 4 do Acordo de Associação UE-Marrocos, estende de forma fraudulenta as preferências pautais a produtos provenientes do Sahara Ocidental ocupado, recorrendo à manipulação administrativa de os apresentar como parte de “regiões” marroquinas — Laâyoune-Sakia El Hamra e Dakhla-Oued Eddahab — apesar de as Nações Unidas reconhecerem explicitamente o Sahara Ocidental como Território Não Autónomo por descolonizar.


Um ato contrário à jurisprudência internacional

A violação não é apenas política: é juridicamente insustentável.

Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE)

A sentença de 4 de outubro de 2024 (C-778/21 P e C-798/21 P), confirmada em 15 de janeiro de 2025, reiterou princípios firmados em decisões anteriores:

  • O Sahara Ocidental é um território “distinto e separado” de Marrocos.

  • Nenhum acordo internacional pode ser aplicado ao território sem o consentimento do povo saharaui, representado exclusivamente pela Frente Polisário.

  • Supostos benefícios económicos não substituem o consentimento, e devem ser concretos, verificáveis e sujeitos a controlos independentes.

  • A população colona marroquina representa cerca de três quartos da população total dos territórios ocupados, segundo dados utilizados pela própria Comissão Europeia e citados no ponto 157 da sentença de 4 de outubro de 2024. Essa população, transferida ilegalmente pela potência ocupante em violação do artigo 49º da IV Convenção de Genebra, não pode substituir o povo saharaui, titular legítimo do direito à autodeterminação. O ponto 156 da mesma sentença reconhece que a maioria dos saharauis vive fora dos territórios ocupados — nos campos de refugiados na Argélia ou na diáspora.

O acordo de 3 de outubro de 2025 viola todos estes princípios e contraria abertamente a jurisprudência consolidada do TJUE.

Nações Unidas

A União Europeia viola ainda:

  • A Resolução 1514 (XV) da Assembleia Geral, que consagra o direito à autodeterminação dos povos coloniais.

  • As Resoluções 34/37 (1979) e 35/19 (1980), que qualificam Marrocos como potência ocupante.

  • Pareceres jurídicos da ONU, nomeadamente o de Hans Corell (2002): “Qualquer exploração de recursos naturais sem o consentimento do povo saharaui é ilegal.”

  • A Resolução 2797 (2025) do Conselho de Segurança, que reafirma a natureza do conflito, o direito à autodeterminação e a necessidade de uma solução conforme ao Direito Internacional.

O acordo agora aplicado pela UE ignora deliberadamente estas bases jurídicas, apoiando de facto a ocupação e legitimando a expansão económica marroquina.


Um pacto que legitima o saque e alimenta a repressão

O acordo de 3 de outubro:

  • Foi assinado sem o consentimento do povo saharaui, representado pela Frente Polisário, que o rejeita e prepara novas ações legais.

  • Não gera benefícios reais para a população saharaui, favorecendo empresas marroquinas e redes ligadas à ocupação militar.

  • Não prevê mecanismos independentes de controlo: a certificação de origem fica nas mãos da potência ocupante.

  • Utiliza rotulagem opaca e enganosa, escondendo ao consumidor europeu a verdadeira origem dos produtos: um território marcado por tortura, julgamentos militares, desaparecimentos e repressão sistemática.

O acordo não é técnico nem neutro: é um ato de cumplicidade económica e política com as violações de direitos humanos cometidas diariamente por Marrocos nos territórios ocupados.

Enquanto a UE abre as portas a tomates, melões ou peixe do Sahara Ocidental, os saharauis continuam a ser presos, torturados ou desaparecidos por exigirem algo tão básico quanto o direito internacionalmente reconhecido à autodeterminação e à independência.


AFAPREDESA EXIGE:

  1. Suspensão imediata da aplicação provisória do acordo de 3 de outubro por violar o Direito Internacional e as sentenças do TJUE.

  2. Que o Parlamento Europeu rejeite definitivamente este pacto ilegal.

  3. Que a Comissão Europeia estabeleça um processo de consulta real com o único representante legítimo do povo saharaui: a Frente Polisário.

  4. Que os Estados-Membros, especialmente Espanha enquanto potência administrante de jure, assumam as suas responsabilidades jurídicas e históricas na descolonização do território.

  5. Que a UE deixe de financiar indiretamente a ocupação e passe a defender ativamente o Direito Internacional.


Uma mensagem clara: o povo saharaui não cederá

O povo saharaui não aceitará novas traições disfarçadas de pragmatismo. Continuará a lutar — nos tribunais, nas instituições e no terreno — com a força da justiça, da legitimidade histórica e do Direito Internacional.

Não ao saque!
Sim à autodeterminação!

Wilaya Chahid El Hafed, 26 de novembro de 2025

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