O governo marroquino inicia um novo enfrentamento contra os
Estados Unidos, após a publicação de um comunicado ontem em tom muito duro
contra o Departamento de Estado, ao qual que descreveu como “profundamente
anti-marroquino” quando ainda não terminou a crise com o Secretário-Geral das
Nações Unidas, Ban Ki-moon.
Em apenas um ano Marrocos tem enfrentado a União Europeia,
com o congelamento os seus contatos durante meses devido ao acórdão do Tribunal
de Justiça sobre o Sahara Ocidental; posteriormente com Ban Ki-moon, acusando-o
de “insultar o governo e o povo marroquino”, referindo-se à “ocupação”
marroquina do Sahara, e outros gestos considerados inamistosos.
Agora chegou a hora de um dos aliados tradicionais de
Marrocos, como são os Estados Unidos: Rabat não gostou do tom do relatório que
o Departamento de Estado publica todos os anos sobre os direitos humanos em
países ao redor do mundo, onde são enumeradas abundantes críticas à situação no
país norte Africano.
Ontem, o governo marroquino, num comunicado do Ministério do
Interior, ,descreveu o relatório como “verdadeiramente chocante”, embora
ninguém sabe por que Marrocos levou mais de um mês para comentar, quando se
tornou público a 13 de abril.
“Há uma espécie de frustração de Marrocos com os seus aliados,
até mesmo uma sensação de estar a ser traído”, disse à Agência Efe o cientista
político Mohamed Madani, para quem não há dúvida de que a raiva com os Estados
Unidos tem no fundo a ver com a questão do Sahara e a atitude recente de
Washington no Conselho de Segurança.
Na última votação para a renovação do mandato da missão da
ONU no Sahara (MINURSO), os Estados Unidos apresentaram um projeto de resolução
que Rabat considera hostil, porque “pressionava e enfraquecia” a posição de
Marrocos, e que na sua versão final foi limado para remover críticas ao país,
norte Africano, graças a intervenção de outros aliados, nomeadamente a França.
Na questão do Sahara, os Estados Unidos já demonstraram em
2013 que os seus critérios não coincidiam com Marrocos: tentado dar
competências à MINURSO na monitorização dos direitos humanos no Sahara, mas o
projeto não foi em frente após uma intensa campanha diplomática marroquina.
“O objectivo final do Marrocos é o Sahara, uma questão
existencial para Marrocos e para a sobrevivência do regime -considera Madani-,
e isto também se aplica para a Argélia”, diz ele, referindo-se a rivalidade
entre os dois vizinhos do Magrebe, precisamente sobre o problema da Sahara.
A Marrocos tem incomodado, desde a sua nomeação em 2013, a
presença de John Kerry à frente do Departamento de Estado e os meios de
comunicação marroquinos continuaram a identificá-lo como um simpatizante da
tese saharaui.
Madani lembra também que neste momento histórico Rabat
comparte com as monarquias árabes do Golfo Pérsico o descontentamento com a
política dos EUA, que não “cuida” suficientemente os aliados que sempre foram
fiéis e não os defende contra os seus adversários regionais.
Em abril passado, o rei Mohamed VI viajou a Riad, tendo sido
convidado para uma reunião de cúpula do Conselho de Cooperação do Golfo, onde
fez um discurso que reivindicou o direito do seu país procurar novos parceiros
– citou a Rússia, China e Índia – porque o seu país “está livre nas suas
decisões e não é a coto de qualquer país.”
O monarca disse, então, que existe uma “conspiração” contra
as monarquias árabes do Marrocos, Jordânia e do Golfo, que constituem “um
refúgio de paz e estabilidade” e que a trama inclui um projeto para “aproveitar
os recursos dos países árabes e destruir as experiências bem sucedidas de
outros estados, como Marrocos “.
Para Madani, é prematuro falar em mudança de rumo na
diplomacia marroquina e acredita que há sim uma “fase de pressão ” marroquina
para recuperar o status de parceiro privilegiado dos EUA e da Europa que Rabat
sempre teve.
O fim da “era Obama ” por um lado, e o mandato de Ban
Ki-moon à frente da ONU criaram uma atmosfera de correspondência de interregno
em que Marrocos quer colocar seus peões e capacitar-se.
Com a União Europeia, a lógica é diferente: enquanto o
Tribunal de Justiça Europeu não decide sobre o recurso contra o acórdão de
Dezembro (invalidando o acordo UE-Marrocos), as coisas não vão ser
normalizadas. E Marrocos não aceitará mais um fracasso que não seja o
derrogatório.
Fonte: Terra Notícias
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