O blog "Por Un Sahara Libre" entrevistou o vice-presidente da CODAPSO, Hmad Hmad, sobre a recente
visita no passado dia 4 de Setembro da delegação da União Europeia
aos territórios ocupados do Sahara Ocidental. O objectivo da visita
era “consultar” a população sobre se era ou não beneficiada
com os acordos UE/Marrocos de comercialização de produtos e
recursos naturais deste território não autónomo ocupado desde 1975
militarmente por Marrocos. Recordamos que o Tribunal de Justiça da
União Europeia em dois acórdãos considerou que o Sahara Ocidental
é um território separado e distinto de Marrocos e não pode ser
incluído nos acordos. Uma vitória legal para a Frente Polisario, o
legitimo representante do povo saharaui junto dos organismos
internacionais e a ONU.
PUSL: Hmad Hmad qual foi o
objectivo da visita desta delegação da UE aos territórios
ocupados?
Hmad: Esta delegação da
União Europeia disse que queria “consultar” a população
saharaui sobre se tínhamos ou não algum beneficio da exploração
por Marrocos e empresas estrangeiras dos vastos recursos naturais
deste território não autónomo.
Uma pergunta retórica , uma
vez que a UE esta ciente que a população saharaui não usufrui de
nada. Denunciamos diariamente as várias violações dos direitos
humanos, o apartheid em que vivemos tanto a nível político,
social como também económico e não podemos esquecer que a
população saharaui não se encontra somente nos territórios
ocupados, as nossas famílias estão também nos campos de refugiados
perto de Tindouf, Argélia, do outro lado do Muro de separação
militar erguido por Marrocos, eles não só não usufruem de nada
como estão dependentes da ajuda humanitária desde 1975.
Todos os direitos do nosso
povo estão sequestrados por Marrocos e pela Comunidade Internacional
que permite a perpetuação desta situação.
A União Europeia devia estar
preocupada e actuar para que o nosso povo tenha uma solução para o
conflito de acordo com as resoluções das Nações Unidas ou seja a
autodeterminação.
PUSL: O que pensa desta
consulta?
Hmad: A União Europeia
trata-nos como se fossemos crianças, esta pseudo consulta confirma
isso em toda a linha.
Que tipo de consulta é esta?
Querem consultar um povo que vive sob ocupação, num território sob
controle militar? A única consulta que necessitamos é o referendo
que foi a base do nosso acordo de cessar fogo e que até aos dias de
hoje não foi realizado.
E quero acrescentar que o povo
saharaui tem um representante legítimo, o nosso representante é a
Frente Polisario e é ao nosso representante que têm que perguntar e
consultar.
Ora o nosso representante foi
muito claro, quando teve que recorrer aos tribunais e fazer uma
queixa ao tribunal de justiça da União Europeia, foi por que,
efetivamente, os direitos do nosso povo não estão a ser
respeitados, porque os nossos recursos estão a ser roubados. Que
mais há para preguntar?
Todas as associações que
estiveram presentes na reunião disseram o mesmo, fomos muito claros,
roubam-nos, ocupam a nossa terra, sequestram, torturam, põem-nos em
prisões e cometem um lento genocídio ao povo saharaui. E todos
reafirmámos que consultas devem ser feitas ao nosso representante
legal, a Frente Polisario.
Marrocos está a violar a lei
internacional e esta delegação está bem consciente disso, não é
necessário que sejamos nós a informar.
PUSL: A UE afirmou que já
tinha consultado vários representantes do povo saharaui, e na lista
de consultados apresentada antes desta visita incluía empresas
marroquinas. Sabe o que pretendem dizer quando dizem vários
representantes do povo saharaui?
Hmad: Repito, o nosso povo só
tem um representante: a Frente Polisario. Obviamente que Marrocos tem
um grupo de pessoas que se vende e atraiçoa, isso é uma táctica
conhecida e repete-se pela história, na Europa também os franceses
tiveram que suportar o governo fantoche de Vichy durante a Segunda
Guerra Mundial, franceses traidores que com o seu líder Pétain
construíram um regime colaboracionista com os nazis.
PUSL: Qual, na sua opinião,
o verdadeiro objectivo então desta visita?
Hmad: A única coisa que esta
delegação estava à procura foi de uma desculpa, de uma forma de
continuar a roubar o povo saharaui e aliar-se a Marrocos, sendo assim
a UE será directamente responsável por todo o nosso sofrimento.
Procuram uma desculpa porque
pensam que se podem argumentar que o povo saharaui beneficie de
alguma forma, directa ou indirecta da exploração e comercialização
ilegal dos nosso recursos, isso tornaria legais os acordos que
pretendem por em prática.
Isso não é assim, existe a
lei internacional, o território do Sahara Ocidental tem um estatuto
bem definido em termos legais e próprio TJUE foi claro a esse
respeito em ambos os acórdãos.
A UE busca uma forma para
poder seguir a atuar como até ao presente. Há que alertar para o
facto que a compra e comercialização de bens roubados é chamado
de Receptação Qualificada que pode ser definida pelo facto do
infractor adquirir, receber transportar, conduzir, ocultar, ter em
depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de
qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício
de actividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser
produto de crime.
E caso a UE pretenda
prosseguir esta via e o desrespeito pelo seu próprio tribunal é
este um dos crimes que comete, para além do óbvio financiamento da
ocupação e do poder ocupante e, consequentemente, de ser cúmplice
no financiamento de todos os membros das autoridades marroquinas que
cometem os crimes de violação de direitos humanos no território e
fora dele contra o povo saharaui.
Uma actuação contrária aos
princípios que a UE tem escritos e publicados e que diz advogar.
PUSL: O que pensa das
recentes declarações de Frederica Morgherini, a alta representante
dos negócios estrangeiros da UE?
Hmad: Frederica Morgherini foi
muito clara: o Tribunal de Justiça da União Europeia não pediu à
União Europeia para interpretar o acórdão deste tribunal que
estipula que o Sahara Ocidental é um território separado e distinto
de Marrocos e que não pode ser incluído nos acordos comerciais e de
pescas UE/Marrocos. O Tribunal de Justiça da União Europeia pediu
para aplicar o seu acórdão, aplicar, não interpretar. E foi isso
que Morgherini transmitiu aos Deputados e Chefes de Estado presentes.
PUSL: Acredita que os
acórdãos do TJUE irão ser respeitados?
Hmad: Até ao momento a lei
internacional nunca é respeitada quando se trata do povo saharaui.
Prova disso é o sequestro dos nossos direitos e o facto que não se
cumprirem as resoluções das Nações Unidas que foram aprovadas e
que continuamos nas lista de territórios não autónomos. Somos a
última colónia de África, uma vergonha para África e para a
Europa, e em especial para Espanha.
Há dois pesos e duas medidas,
e os dirigentes europeus apenas respeitam as decisões do seu
Tribunal quando isso os favorece, e se não aplicarem os acórdãos
do TJUE sobre esta questão, não estamos perante países democratas
nem perante uma União Europeia justa, integra e com ética, estamos
sim perante ladrões com roupas caras e edifícios modernos, mas que
não deixam de ser colonialistas que nos tratam com desdém e falta
de respeito.
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