quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

“O destino dos saharauis na zona ocupada é incerto, podemos a qualquer momento ser detidos, torturados e até assassinados”



Fonte e foto: Diario de Navarra / Por Unai Yoldi Hualde y Patxi Cascante

Ahmed Brahim Ettanji é presidente da Equipe Media e ativista saharaui. Viajou a Navarra para contar ao Parlamento as violações de direitos que Marrocos comete no Sahara Ocidental.

PAMPLONA – Ahmed Brahim Ettanji (El Aaiún, Sáhara Occidental, 1988) é um desses jornalistas que se formam na rua, daqueles a quem o trabalho os levou a sofrer detenções e torturas.
O seu ativismo a favor dos direitos humanos e da autodeterminação do povo saharaui é exercido desde a presidência da Equipe Media, um meio de comunicação saharaui que nasceu em 2009 para romper o bloqueio de informação e mostrar ao mundo as injustiças que Marrocos comete nos territórios ocupados do Sahara Ocidental. No final de janeiro, Ahmed e seus companheiros receberam María Pérez de Larraya, Iratxo Bakedano e Alberto Jolis, três ativistas de Navarra que pretendiam constatar e denunciar as violações de direitos cometidas pelas forças de ocupação contra os saharauis, mas acabaram por ser expulsos pelo exército marroquino. Agora, ele viajou para Iruña para participar de uma mesa de trabalho no Parlamento de Navarra.

Como foram estas semanas após a expulsão de María, Iratxo e Alberto?
Depois de sua expulsão, vim para o Estado espanhol, então tudo correu bem. Mas a verdade é que o meu destino e o de meus companheiros é sempre incerto e obscuro. Nós não sabemos o que nos vai acontecer, estamos sempre sujeitos à prisão, tortura e até ao assassinato.

No seu caso, você foi detido por sua atividade, como é o tratamento das forças marroquinas?
Bem, eles não lhe colocam o tapete vermelho. A partir do minuto 0 começa o processo: espancamentos, maus-tratos e uma venda nos olhos para que não saibas para onde te levam. Às vezes também te despem e te interrogam, eles podem fazer-te todo tipo de tortura.

Como é viver nos territórios ocupados do Sahara Ocidental?
É uma grande prisão. Nós, saharauis, vivemos sempre com a sensação de que estamos presos. Temos uma liberdade condicional, porque podemos mover-nos, mas quando eles decidem por-te na cadeia, eles o fazem.

E em relação ao dia a dia?
A marginalização que sofremos é absoluta. Eles tratam-nos completamente à margem, como cidadãos de terceira classe. Por exemplo, se ficarmos doentes e formos a um hospital, temos que pagar, somos maltratados e é certo que podemos contar com alguma negligência médica. Mas a discriminação afeta todas as áreas.

Sobretudo a laboral, não?
Sim. Para os saharauis, o acesso ao trabalho é complicado. Nos grandes setores, como a pesca ou as minas de fosfato, os saharauis não têm trabalho, apenas os colonos marroquinos.

Recentemente, um jovem saharaui incendiou-se para denunciar a repressão que estava a sofrer, tem que ser uma situação limite, não?
Este jovem que se imolou pelo fogo é um exemplo da impotência e da raiva sentidas pelos jovens que vivem sob a opressão e a violência. Quando um jovem decide se queimar vivo é porque está vivendo um inferno e, enquanto isso, a comunidade internacional e a União Europeia olham para o outro lado.

O que é que a comunidade internacional pode fazer?
Muito fácil, que o Conselho de Segurança da ONU aprove uma resolução para organizar um referendo no Sahara Ocidental e acabou. Estava marcado para 1991, mas até agora a MINURSO (a Missão Internacional das Nações Unidas para o Referendo no Sahara Ocidental) não o organizou. Mais, não foi realizado porque Marrocos colocou muitos obstáculos e porque tem o apoio da França e da Espanha.

E esses apoios tornam-no forte... Tem esperança que um dia Marrocos venha a aceitar um referendo?
Sim. A história tem mostrado ao longo do tempo que os povos acabam por alcançar a sua liberdade, seja a curto ou a longo prazo. Temos esperança que vamos vencer e, para isso, defendemos uma luta não violenta.

O Sahara tem uma indústria pesqueira, minas de fosfato ... é difícil para estes países deixarem de ter relações com Marrocos, não?
Depois do acórdão do Tribunal de Justiça da UE - que decidiu que nenhum acordo comercial pode incluir o Sahara Ocidental sem o consentimento dos saharauis -, fundos de investimento e navios decidiram cancelar as atividades no Sahara. No entanto, agora o acordo de pesca entre a UE e Marrocos foi renovado, pelo o que a Frente Polisario irá apresentar um recurso. Vai ser a armadilha em que a Europa vai cair, porque o Tribunal a obrigará a compensar os saharauis por firmar um acordo ilegal.

Embora lutem de maneira não violenta, chegará um ponto em que haverá saharauis que se cansarão, ou não será...?
Há jovens saharauis que perderam a confiança na ONU e pediram à Frente Polisario para regressar à luta armada. Mas defendemos a luta não violenta, a guerra diplomática e económica e o boicote.

Em suma, pressionar para que o referendo seja realizado ...
Sim. A luta não violenta leva tempo, mas resulta. A ONU reuniu a Frente Polisario e Marrocos em dezembro e em março haverá uma segunda ronda de diálogo.

E acha que isso servirá de alguma coisa?
-Quando há vontade… certamente; e parece que o novo enviado especial da ONU, Horst Köhler, tem muito vontade em resolver o conflito.



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