A intervenção de José Manuel Pureza teve lugar no dia 05 de outubro de 2023.
José Manuel Pureza, professor universitário e político português (foi deputado pelo Bloco de Esquerda em várias legislaturas e vice-presidente da Assembleia da República de 28 de outubro de 2015 a 28 de março de 2022). interveio nas Nações Unidas perante a 4.ª Comissão, defendendo a concretização do Referendo de autodeterminação no Sahara Ocidental. Traçou um paralelismo com a questão de Timor-Leste, que ele conheceu e acompanhou de perto durante muitos anos.
"Vossas Excelências,
venho de um país, Portugal, que foi uma potência colonial. Mas a revolução democrática de Portugal em 1974 abriu o caminho para a independência das suas antigas colónias em África. Tragicamente, isso não aconteceu na última das antigas colónias portuguesas, Timor Leste. No entanto, após 24 anos de ocupação, e graças à mobilização da comunidade internacional, a independência de Timor-Leste concretizou-se após uma expressão maciça da vontade do povo timorense num referendo organizado sob os auspícios das Nações Unidas.
Nesta breve declaração, gostaria de sublinhar três semelhanças cruciais entre os casos do Sahara Ocidental e de Timor-Leste que me parecem da maior relevância para o nosso debate aqui.
A primeira é a relevância da corajosa resistência de ambos os povos contra a ocupação e em defesa da sua identidade histórica e política, nomeadamente quando o ocupante tentou e tenta seduzir o povo com promessas de desenvolvimento. Essa resistência popular teve e tem o seu argumento mais forte na exigência do cumprimento do direito internacional. Em ambos os casos, as Nações Unidas condenaram a ocupação como uma violação do direito internacional. Esta centralidade do direito internacional como critério decisivo para avaliar a realidade dos dois povos trouxe para o primeiro plano dos dois processos não só a ocupação mas também as grosseiras violações quotidianas dos direitos humanos e do princípio da soberania permanente sobre os recursos naturais.
A segunda semelhança é que, em ambos os casos, os ocupantes tentaram impedir a realização do referendo, opondo-lhe aquilo a que chamavam planos de autonomia especial para os dois territórios. Contra isso, as Nações Unidas não deixaram de assumir a sua responsabilidade no caso de Timor-Leste e organizaram o referendo, algo que, até agora, não aconteceu no Sahara Ocidental, devido ao boicote permanente do ocupante e ao défice de pressão política dos actores internacionais relevantes.
Finalmente, a terceira semelhança. O rescaldo da autodeterminação de Timor-Leste inaugurou um clima de cooperação e de relações pacíficas entre o então novo Estado independente e a Indonésia. A mesma atitude já foi assegurada pela Frente POLISARIO no que respeita às relações entre o Sahara Ocidental autodeterminado e todos os países vizinhos. É a não concretização do direito fundamental à autodeterminação que cria uma condição de instabilidade e insegurança que afecta toda a região.
Excelências, estou aqui hoje para dizer que é imperativo que a ONU assuma todas as suas responsabilidades para com o povo do Sahara Ocidental e assuma a organização do referendo de autodeterminação como a única prioridade legítima. Como para todos os Estados individuais, também para a ONU, a coerência com o que a organização adoptou para Timor Leste é a única atitude credível a tomar no caso do Sahara Ocidental. É o cumprimento do direito internacional que o exige.
Obrigado pela vossa atenção".
A antiga colónia de Portugal, ocupada pela Indonésia em Dezembro de 1975, praticamente na mesma altura em que Marrocos invadiu a então colónia espanhola, viria a aceder à independência com base no resultado do referendo de autodeterminação realizado pela a ONU no território em 30 de agosto de 1999.
Como curiosidade histórica, refira-se que, logo que soube da assinatura do Plano de Paz entre o Reino de Marrocos e a Frente POLISARIO e a constituição da MINURSO (Missão das Nações Unidas para o Referendo no Sahara Ocidental) a 01 de setembro de 1991, Xanana Gusmão, o líder da resistência armada nas montanhas de Timor-Leste, fazia chegar pelos canais da Igreja a sua premência em ler e poder analisar o referido texto. Dizia, então, que ele podia constituir um precedente precioso para a autodeterminação e independência de TL...
"YOUR EXCELLENCIES,
I come from a country, Portugal, which has been a colonial power. But Portugal’s democratic revolution in 1974 paved the way to the independence of its former colonies in Africa. Tragically, that did not occur in the last of the former Portuguese colonies, Timor Leste. But, after 24 years of occupation, and thanks to the mobilization of the international community, the independence of Timor Leste took place after a massive expression of the will of the Timorese people in a referendum organized under the auspices of the United Nations.
In this short statement, I wish to emphasize three crucial similarities between the cases of the Western Sahara and of Timor Leste which I believe are of utmost relevance for our debate here.
The first is the relevance of the brave resistance of both peoples against the occupation and in defense of their historical and political identity, namely when the occupier tried and tries to seduce the people with promises of development. That popular resistance had and has its strongest argument in the demand for the accomplishment of international law. In both cases, the United Nations condemned the occupation as a violation of international law. This centrality of international law as the decisive criterium for assessing the reality of the two peoples brought not only the occupation but also the gross everyday violations of human rights and of the principle of permanent sovereignty over natural resources to the fore of both processes.
The second similarity is that, in both cases, the occupants tried to stop the referendum, opposing to it what they called plans of special autonomy for the two territories. Against this, the United Nations has not quit its responsibility in the case of Timor Leste and did organize the referendum, something that, so far, has not occurred in Western Sahara, due to the permanent boycott of the occupant and to the deficit of political pressure of relevant international actors.
Finally, the third similarity. The aftermath of self-determination of Timor Leste inaugurated a climate of cooperation and peaceful relations between the then new independent state and Indonesia. The same attitude has already been assured by Frente POLISARIO concerning the relations between self-determinated Western Sahara and all the neighboring countries. It is the non-accomplishment of the basic right to self-determination that creates a condition of instability and insecurity that affects the whole region.
Excellencies, I am here today to say that it is imperative that the UN assumes all its responsibilities to the people of Western Sahara and takes the organization of the referendum of self-determination as the only legitimate priority. As for all individual states, also for the UN, coherence with what the organization has adopted for Timor Leste is the only credible attitude to take in the Western Sahara case. It is the accomplishment of international law that demands it.
Thank you for your attention".
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