quarta-feira, 6 de abril de 2011

Quem é quem no Conselho de Segurança da ONU?

Este texto, da autoria do sociólogo saharaui Salek Jatri Andala, procura analisar qual será a posição de cada um dos países com actual assento no Conselho de Segurança da ONU quando a questão do Sahara Ocidental vier a ser discutida e votada no final deste mês de Abril. Portugal está, por direito próprio no CS da ONU e, esperamos todos, não como mera figura de «corpo presente». No entanto, relativamente à questão saharaui o provável comportamento de Portugal naquele órgão internacional afigura-se-nos preocupante.

Sucumbindo às pressões de Espanha, de Marrocos e da França, Portugal tem apoiado as teses marroquinas relativamente à descolonização do Sahara Ocidental, negando, de cada vez, as obrigações do Direito Internacional e a sua própria experiência e posicionamento no caso de Timor-Leste. Isto não obstante, as mais importantes organizações internacionais de defesa dos Direitos Humanos terem vindo a denunciar fundamentadamente a intensificação, nos últimos meses, das violações dos direitos humanos do povo saharaui por parte das autoridades de Marrocos.

A comunidade internacional sabe, no entanto, que só a realização de um referendo, organizado e supervisionado pelas Nações Unidas, expressão da efectivação do direito do povo saharaui à autodeterminação, poderá pôr fim a estas violações. E só ele abrirá caminho à celebração de Acordos internacionais justos e transparentes (como o das Pescas, relativo às águas territoriais do Sahara Ocidental).

Portugal deve apoiar-se nos laços de amizade que tem forjado com o povo marroquino, assim como na autoridade moral e na competência diplomática que granjeou no processo de libertação de Timor-Leste, para aplanar o caminho que levará as negociações entre a Frente POLISARIO e o Reino de Marrocos a bom porto – ou seja, à concretização de uma consulta popular ao povo saharaui, livre e justa. Esta nova fase pode começar hoje. Será parte da contribuição portuguesa para a democratização do mundo, para que a justiça prevaleça sobre a mentira, a opressão e o terror. Precisamos desta coerência e desta coragem Eng.º José Sócrates e Ministro Luís Amado.
-----------------------------------------------------------------------------------------------
Este mês de Abril será um ponto de inflexão na luta do povo saharaui e será uma ocasião para avaliar o trabalho diplomático do Governo saharaui (a RASD). Existem aspectos positivos que podem ajudar a relançar a nossa causa e colocá-la na agenda internacional, esses acontecimentos todos nós os conhecemos: o acampamento de Gdeim Izik e o seu desmantelamento violento por parte do invasor marroquino (o que mostrou ao mundo a cara menos amável de Marrocos), o cerco informativo nos dias que se sucederam com a expulsão da imprensa internacional, a repressão contra os estudantes saharauis nas escolas del Aaiún e Smara por parte dos colonos incitados pelas autoridades marroquinas, assim como os ataques a bairros de cidadãos saharauis na cidade de Dajla, as dissoluções violentas das manifestações pacíficas dos trabalhadores de Fosbucraa, todos estes acontecimentos estiveram perante os olhos do mundo, que novamente se viraram para outro lado. Porém, a comunidade internacional viu-se na obrigação de encarar de frente a região do Magreb, depois de ver seguido o exemplo saharaui pelos povos irmãos da Tunísia, Egipto, Yemen, Líbia, etc.
A comunidade internacional e a ONU não podem continuar a marginalizar o nosso povo e a nossa causa, nem relegar-nos para o caixote de lixo da história.

O “majzén” sabedor de que estes acontecimentos não o favoreciam, não perdeu tempo e mobilizou toda a sua “fauna” diplomática para contrariar os efeitos. Os seus emissários voaram para todos os confins do mundo para adular governos e assegurar-se do seu apoio ao seu mais que fracassado projecto de autonomia. O embaixador alauita em Madrid (que finalmente assentou arraias em Espanha) não perdeu tempo e manteve reuniões com o PP, calculando que em breve o Sr. Rajoy (candidato à presidência do Governo espanhol) poderá ser o próximo inquilino da Moncloa, assim como também “visitou” a Região de Múrcia com o fim de adular o presidente da comunidade Murciana, Ramón Luis Valcárcel (o segundo presidente de uma Comunidade Autónoma, que efectuou uma viagem oficial aos acampamentos Saharauis). Os ministros marroquinos desfilam por Paris, Madrid, Washington etc. Unem-se à cruzada internacional contra Gadafi, acusam a Frente POLISARIO de enviar militares para a Líbia, compram vontades e escribas mercenários para que difundam as suas mensagens tóxicas e propagandísticas e, sobretudo, não se cansam de assediar os seus pares para lhes extrair algumas palavras de apoio para os seus fantasiosos planos de "regionalização e autonomia."

Tendo em conta que cada uma das partes realizou os seus movimentos no tabuleiro de xadrez, resta-nos destrinçar as possíveis actuações dos países que formam parte do Conselho de Segurança da ONU.

Os 15 membros do Conselho de Segurança, encarregados de reunirem-se em finais de Abril e avaliar e analisar a questão Saharaui, são os que a seguir mostrarei (por ordem alfabética), juntamente com um resumo daquilo que poderá ser a sua possível actuação.

Alemanha
A Alemanha de Ángela Merkel, sendo embora uma grande aliada de França em quase todas as frentes e, sobretudo, em políticas europeias, é um país muito independente na sua política exterior, priorizando sempre o diálogo e os métodos pacíficos que envolvam o respeito dos direitos humanos por cima de qualquer “solução militar”, isso sem esquecer os futuros interesses alemães no multimilionário projecto DESERTEC pelo qual a energia solar produzida na sua grande maioria no norte de África será empregue para abastecer o mercado Europeu. A Alemanha será cautelosa, mas apoiará as medidas que reforcem a MINURSO e que amplie as suas prerrogativas à vigilância dos direitos humanos.

Bosnia Herzegovina
Membro não permanente do Conselho de Segurança, este será o último ano em que o país terá assento como membro do Conselho (já que os membros não permanentes rodam cada 2 anos ). Em 2010, aliou-se às teses e posições marroquinas. O governo da Bosnia Herzegovina, agradece a Marrocos a sua participação na missão KFOR, nos Balcãs, e recordou que está firmemente aliado a Marrocos na sua cruzada contra aquilo que dizem ser o seu “apego aos princípios fundamentais do direito internacional, particularmente aos relativos ao respeito à integridade territorial e da soberania nacional dos Estados”- (talvez fosse necessário enviar ao governo deste país, o dictamen do Tribunal Internacional de Justiça de Haya do ano de 1975 referente à questão Saharaui.)

Brasil
Potência emergente no mundo e, juntamente com o México, um peso pesado na América Latina, com um governo progressista no poder e uma influência cada vez maior no mundo, é um baluarte para as causas justas, recordemos que o Brasil se opôs aos bombardeamentos na Líbia. Será um grande apoio a favor da causa saharaui. (A nossa diplomacia deveria dar mais interesse e atenção a este país)

China — Membro permanente
A posição da China é um tanto ambígua, foi neutral em varias ocasiões, mas pode ser um grande cavalo de batalha se a França teimosamente se obstinar em deitar por terra os esforços por ampliar as competências da MINURSO. A China tem um papel crescente na região (o governo chinês exerce uma política muito pragmática e deseja obter resultados a todo o custo) e a nenhum país da zona conviria "contrariar" a poderosa República Popular da China, mas lembremo-nos que para além da sua política externa bastante neutral na área (opôs-se à intervenção militar na Líbia, e enfrentou a França em várias ocasiões) a China está interessada nos mercados da região devido aos seus ricos recursos naturais, daí os seus interesses nos fosfatos marroquinos e nos fosfatos saharauis de Bu Craa explorados por Marrocos. Para o governo chinês é importante manter a sua neutralidade e abster-se, em particular à luz dos mais recentes desenvolvimentos nos países árabes, teme que qualquer posição numa direcção ou noutra possa vir a constituir uma arma contra ela (não esqueçamos o Tibete).

Colômbia
O governo colombiano preside neste mês de Abril ao Conselho de Segurança, e já anunciou que o seu principal objectivo será a região da América e o Caribe. Procurará impulsionar tudo o que esteja relacionado com a reconstrução do Haiti, pelo que outros assuntos, ainda que importantes, constarão da agenda colombiana em segundo plano. Devemos recordar que, ainda que o nosso embaixador naquele país, Mojtar Lebuhei, esteja a trabalhar de modo muito intenso e fazendo um bom trabalho, procurando consciencializar parte do arco político do país para a nossa causa e a nossa situação, o facto é que depara entre a classe política e a sociedade colombiana em geral com um grande desconhecimento sobre conflito existente, além da tradicional política de seguidismo por parte das autoridades colombianas em relação às doutrinas do seu aliado EUA. Pelo que a posição colombiana possa ser favorável a Marrocos.

Estados Unidos de América — Membro permanente
O que podemos esperar dos Estados Unidos? Creio serem suficientes as últimas declarações da Secretária de Estado Hillary Clinton, no seguimento da visita realizada recentemente pelo seu homólogo marroquino àquele país — (o governo marroquino não está perdendo tempo e há meses que está a mobilizar a sua diplomacia, e o teor das últimas declarações fazem suspeitar que os resultados não lhes são muito desfavoráveis) — apoiando claramente as posições marroquinas (não esqueçamos que a família Clinton é bastante assídua em passar férias em Marrocos, e todos conhecemos o peso dos Clinton na esfera política norte-americana).

Federação Russa — Membro permanente
A Federação Russa tem o seu principal aliado no norte de África no governo da Argélia, mas não esqueçamos que a Federação Russa tem interesses económicos em Marrocos, sobretudo no sector pesqueiro (renovaram por mais dois anos um acordo firmado em Junho de 2010) pelo que a Rússia tratará de manter-se à margem e abster-se de prejudicar nenhum dos seus interesses, tanto na Argélia como em Marrocos, mas se tiver que colocar o seu peso em cima da mesa, será sem dúvida para ampliar e melhorar a MINURSO, usando o apoio que lhe possa oferecer Brasil, China, Índia, Alemanha, Nigéria e África do Sul.

França — Membro permanente
O berço da democracia moderna, a terra da "liberdade"…! Se os corajosos parisienses que tomaram a Bastilha a 14 de Junho de 1789, mudando o panorama político na França e no mundo, levantassem a cabeça e pudessem observar a ridícula política externa do seu País, certamente que se levantariam das tumbas e tomariam o Palácio do Eliseu. Na sequência dos acontecimentos no norte da África e da sua inacção, a França procurou limpar a sua imagem (por isso não hesitou em apoiar os rebeldes da Líbia, e assumir a liderança dos ataques contra as tropas de Gaddafi), mas todos sabem até que ponto Marrocos é o "queridinho" da França, pelo que apoiarão, inclusive com o veto, se necessário, a proposta marroquina.

Gabão
Desde os tempos de Omar Bongo (esse sanguinário ditador já desaparecido), que o Gabão tem sido fiel às sentenças de Marrocos, o que lhe trouxe investimentos muito lucrativos no seu território por parte de empresas marroquinas, principalmente nos sectores da energia, das telecomunicações e transporte. Gabão é um fiel aliado de Marrocos.

Índia
O gigante asiático foi-se distanciando da causa saharaui após o congelamento das relações com a RASD, no momento em que começava a ficar interessado nos recursos naturais do território e na venda de armas na região, mas não esqueçamos que nos últimos anos voltou a olhar com mais atenção para aquela zona do Magreb, em grande parte devido à greve de fome de Aminatou Haidar, que encontrou um enorme eco na imprensa da Índia e, desde então, existe alguma simpatia pela causa saharaui.

Líbano
Uma dos grande incógnitas e um investimento futuro para a nossa diplomacia. É, talvez, o país árabe mais aberto, tanto política como religiosamente. No seu interior vivem milhares de refugiados palestinianos, e embora ainda haja turbulência política que aflora de quando em vez, não é surpreendente que o Líbano não se oponha à aprovação de uma resolução que inclui o monitoramento dos direitos humanos no Sahara Ocidental.

Nigéria
Juntamente com a África do Sul, são os mais claros e fortes apoios da causa saharaui no Conselho de Segurança, lutará com unhas e dentes para alcançar uma solução o mais favorável possível.

Portugal
Este país tem sido nos últimos tempos um “trampolim” para a política de Marrocos, o qual bem se tem esforçado em encontrar e afiançar o apoio do executivo português, através de uma bateria de declarações favoráveis ao fantasioso plano marroquino de "autonomia". Mas recorde-se -se que Portugal está mergulhado numa crise complexa de governo, pelo que a sua prioridade será a sua política interna, deverá actuar no Conselho de Segurança a «meio gás», sem muito interesse em se envolver em assuntos externos.

Reino Unido da Grã Bretanha e Irlanda do Norte — Membro permanente
O Reino Unido ocupa um lugar permanente no Conselho de Segurança e embora seja um aliado firme dos Estados Unidos e da França, sempre foi partidário de incluir a vigilância dos direitos humanos no leque de funções da MINURSO. Mais uma vez não se oporá a que isso se verifique.

África do Sul
Membro não permanente do Conselho de Segurança. É o seu último ano no Conselho. No ano passado, junto com o México, foi o principal defensor das justas posições do povo saharaui. Este ano, após os terríveis acontecimentos de Gdeim Izik e das revoltas nos países Árabes, continua fiel à sua política de apoio à causa saharaui e reivindica dotar a MINURSO de uma componente de monitoramento dos direitos humanos.

Este um resumo breve das possíveis posições dos membros do conselho de Segurança, mas recordemos que independentemente da resolução que se venha a votar no Conselho de Segurança, a questão saharaui continuará estagnada e sem vislumbre de solução a menos que, nós os saharauis, demos passos firmes e contundentes para reverter a actual situação, já que não podemos nem devemos conformarmo-nos apenas com a inclusão da vigilância dos direitos humanos no território, devemos e podemos fazer muito mais.

Salek Jatri Andala “El Ninserani”
salekjatri@yahoo.es
Múrcia. Espanha.

Sem comentários:

Enviar um comentário