“Le Soir d’Algerie” – 21-03-2022 - jornalista Tarek Hafid
Carlos
Ruiz Miguel, Professor de Direito Constitucional e Director do Centro de
Estudos do Sahara Ocidental da Universidade de Santiago de Compostela, acredita
que o apoio demonstrado pelo presidente do governo espanhol é "o resultado
da pressão marroquina e norte-americana". Segundo ele, esta reviravolta
imposta por Pedro Sanchez na questão do Sahara Ocidental pode ser a causa de
uma crise com a Argélia, o principal fornecedor de gás natural de Espanha.
Le
Soir d'Algérie: Qual é a natureza da mensagem enviada pelo Primeiro-Ministro
espanhol ao Rei de Marrocos, na qual anunciou que o plano de
"autonomia" é "a base mais séria, realista e credível para a
resolução do litígio"?
Carlos
Ruiz Miguel : Este é um documento que o governo espanhol queria manter em
segredo, mas foi revelado pelo gabinete do rei de Marrocos. O que foi dito é
que se trata de uma “carta” do presidente do governo espanhol ao rei de
Marrocos. Mas o texto completo e autêntico desta carta não foi divulgado.
Parece que esta carta é a expressão de um acordo secreto cujos termos são
desconhecidos. [NOTA: O teor da carta foi hoje dado a conhecer em exclusivo
pelo jornal EL PAIS – ver imagem]
O que
explica tal reação de Pedro Sánchez neste preciso momento? Ele foi pressionado?
Na
minha opinião, a posição do presidente espanhol é fruto de uma dupla pressão:
marroquina e norte-americana. Perante a pressão marroquina, a Espanha teria
solicitado a intervenção norte-americana que parece ter patrocinado este acordo
secreto.
Esta
declaração marca uma negação por parte do Estado espanhol (que continua a ser a
potência de administrante do Sahara Ocidental) do plano de resolução que prevê
a organização de um referendo de autodeterminação?
Esta
declaração é uma violação das obrigações da Espanha como potência administrante
do território. A Espanha tem a obrigação de completar a descolonização e, se
não tiver o controle do território, deve em qualquer caso agir para que a
descolonização seja completa. Quando há um conflito aberto entre a potência
ocupante e o movimento de libertação saharaui, esta declaração significa a
perda da neutralidade para se colocar ao lado do agressor. Isso ao mesmo tempo
em que a Espanha está se posicionando contra a Rússia por causa de sua invasão
da Ucrânia....
O que
a Espanha deve fazer para cumprir sua responsabilidade em relação ao Sahara
Ocidental?
Na
minha opinião, uma vez que Marrocos tenha demonstrado que não honrou os seus compromissos
oficiais para facilitar a descolonização, o único resultado de acordo com a
legalidade internacional será o reconhecimento da RASD (República Árabe
Saharaui Democrática). Esta é a doutrina estabelecida pelo ex-presidente
sul-africano Thabo Mbeki.
Como
reagiram a esta declaração a classe política espanhola e o movimento de
solidariedade que apoia o povo saharaui?
Reagiram
unanimemente com espanto e com deceção em alguns casos.
O que
é considerado uma "reviravolta" espanhola terá consequências nos
combates entre a Frente Polisario e Marrocos?
A
nível militar, penso que este acordo não terá consequências na guerra que está
a decorrer no Sahara Ocidental.
O
governo argelino disse estar "surpreso com a repentina inversão" da
posição da Espanha sobre a questão do Sahara Ocidental e decidiu chamar o seu
embaixador em Madrid. Será este o início de uma crise entre a Argélia e a
Espanha? Quais poderão ser as consequências?
Sim,
é o início de uma crise que terá graves consequências para a Espanha. No
preciso momento em que a eletricidade e o gás atingem preços mais altos, a
Espanha irrita o seu principal fornecedor de gás. Para evitar as consequências,
a Espanha queria que a Argélia aceitasse a proposta de aumentar as suas vendas
de gás reabrindo o gasoduto que passa por Marrocos. Mas esta é uma pretensão
fantasiosa que demonstra profunda ignorância.
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