segunda-feira, 6 de março de 2017

O Enviado da ONU para o Sahara Ocidental renuncia a continuar a sua missão


Christopher Ross





Fonte: Desde el Atlántico / Por Carlos Ruiz Miguel - Prof. Catedrático de Direito Constitucional na Universidade de Santiago de Compostela


Na quinta-feira 2 de março de 2017 o digital do núcleo duro do makhzen “Le 360” anunciou em primeira mão que o Enviado da ONU para o Sahara Ocidental, Christopher Ross, havia deixado de visitar o seu escritório no edifício da ONU. Uns dias depois, sem citar o digital do núcleo duro do makhzen, o diário argelino “TSA” informava que Ross havia renunciado em prosseguir a sua missão. Posteriormente vários meios se fizeram eco do artigo do TSA silenciando que tinha o digital do núcleo duro do makhzen quem deu a notícia em primeira mão. Que causas poderão estar por detrás desta renúncia? Que perspetivas se podem abrir depois dela?


I. CHRISTOPHER ROSS RENUNCIA A CONTINUAR A SUA MISSÃO: QUAIS OS POSSÍVEIS MOTIVOS?

Quinta-feira 2 de março “Le 360”, o digital do núcleo duro do makhzen, anunciava em primeira mão que Christopher Ross tinha deixa de ir ao seu escritório na sede das Nações Unidas em Nova Iorque. Três dias depois, e sem citar esta informação, o digital argelino TSA informava que Ross tinha “atirado a tolha ao chão” e renunciava a prosseguir a sua missão após o fim do seu mandato que finaliza no termo deste mês de março de 2017. Posteriormente, vários meios e “analistas” distorceram a realidade para dizer que Ross se havia “demitido” (“resignado”) do seu posto.


II. POSSÍVEIS CAUSAS DA RENÚNCIA DE ROSS A SOLICITAR A CONTINUAÇÃO DO SEU MANDATO

De momento, não há uma tomada de posição oficial das Nações Unidas sobre este assunto, pelo que só podemos especular acerca das eventuais causas desta renuncia. Quais podem ser?

1) Recusa de Marrocos.

É notório que Marrocos procurou desde o primeiro momento boicotar a tarefa de Ross (o único dos Enviados Pessoais do SG que até agora dominava a língua árabe) e inclusive há cinco anos, em maio de 2012 procurou, sem êxito, provocar a sua demissão. Desde então, o makhzen de Marrocos utilizou toda a classe de chicanices para boicotar o seu trabalho.

Pode ter a recusa de Marrocos a causa desta renúncia? É pouco provável, porque a recusa explícita de Marrocos a Ross não provocou até agora a sua demissãodimisión.

2) Recusa dos EUA

Não é nenhum secredo que dois dos três Enviados Pessoais do Secretário Geral da ONU para o Sahara Ocidental eram homens do Departamento de Estado norte-americano. Não havia nenhuma dúvida desse vínculo direto a respeito de James Baker III e de Christopher Ross. Mais discutível era essa ligação no caso de Peter Van Walsum.

Nos EUA acaba de se produzir uma mudança muito profunda no governo. Tão profunda que alguns acreditam que pode chegar a ser revolucionaria. A decisão de Ross tem a ver com este cenário?

É uma hipótese provável. Há a possibilidade da nova Administração norte-americana ter solicitado a Ross que não prossiga no seu cargo para aí colocar uma figura mais próxima dos interesses do novo presidente. Se esta hipótesé é ou não certa é algo que se verá quando for nomeado o substituto de Ross.

3) Recusa do Secretário-Geral da ONU

A terceira hipótese é que Ross tenha renunciado por não contar com o apoio do novo Secretário-Geral da ONU. Esta falta de confiança pode-se ter manifestado de forma expressa ou implícita. O porta-voz do novo Secretário-Geral da ONU emitiu a 25 de fevereiro de 2017 uma declaração, atribuída ao Secretário-Geral (isto á, avalizada) com um claro favorecimento do makhzen em relação à crise de Guerguerat.

Foi consultado Ross para quando esta declaração foi proferida? Foi consultado e mostrou desconformidade?

Se não foi consultado ou foi consultado mas mostrou a sua desconformidade com esse comunicado, Ross poderá entender que o novo Secretário-Geral da ONU está secretamente do lado de Marrocos. Só se António Guterres estiver secretamente alinhado com Marrocos (algo que se confirmará ou não nas próximas semanas, quando apresentar o seu relatório ao Conselho de Segurança ) esta tese será credível.


III. QUE PERSPETIVAS SE ABREM?

As perspetivas que se abrem após a decisão de Ross dependem, claramente, das causas que a motivaram. Neste sentido as perspetivas possíveis podem ser analisadas de um ponto de vista formal e material.

a. Perspetivas formais.

Quem será o próximo Enviado Pessoal… se é que continuará a existir esta figura?
Podem ocorrer várias coisas:

– é possível que desapareça a figura do “Enviado Pessoal” e que o Secretário-Geral assuma pessoalmente a gestão do assunto.

– se continuar a existir esta figura, importa ver  se:

— o novo “Enviado Pessoal” é uma pessoa ligada à visão política da nova administração norte-americana

–se pretende confiar a responsabilidade a alguém de outra região (África, Rússia, China?).

b. Perspetivas materiais.


– Mas pode também acontecer o contrário: pode ocorrer aquilo que já aconselhou James Baker em 2002 e se considere que é inútil prosseguir com o processo de negociação entre as partes e se inste a que o Conselho de Segurança, por via do capítulo VII da Carta, imponha aquilo que o próprio Conselho de Segurança qualificou como “solução política ótima” (o plano Baker) ou proceda à partição do território.

– Finalmente, pode suceder que se opte por continuar a manter o assunto como agora. No entanto, os acontecimentos como a crise de La Güera e de Guerguerat mostram que esta via é extremadamente frágil.



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