sábado, 13 de outubro de 2018

Gdeim Izik: o acampamento da dignidade saharaui, oito anos depois (Cronologia)



Fonte e foto: Cuarto Poder / Por Ahmed Ettanji, jornalista do coletivo Équipe Média

Oito anos se passaram desde que milhares de saharauis nos territórios ocupados por Marrocos levantaram o acampamento de Gdeim Izik, brutalmente desmantelado pelas forças de ocupação marroquinas

Em outubro de 2010, um levantamento saharaui começou no Sahara Ocidental ocupado pelo regime marroquino. Foi ergudido um campo de dignidade que procurou ser ouvido pela comunidade internacional. O acampamento de Gdeim Izik foi o começo, para o povo saharaui, do que mais tarde se tornou a chamada Primavera Árabe.

Cronologia do levantamento
A 10 de outubro, um grupo de cidadãos saharauis montaram a primeira ‘jaima’ (tenda tradicional saharaui) no deserto, a oeste de El Aaiún ocupado. Este ato pretendia ser o começo de um protesto contra as más condições políticas, económicas e sociais em que vivem os saharauis desde há mais de quatro décadas sob a ocupação do regime marroquino.

A 11 de outubro, foi criado o Comité de Saneamento, Limpeza e Vigilância para organizar o acampamento. A 13 de outubro, o número da população saharaui instalada no acampamento aumenta, como mais de 487 ‘jaimas e serca de 7.000 saharauis que chegaram da capital do Sahara Ocidental para a zona de Gdeim Izik. Ao mesmo tempo, as forças de ocupação usam armas para proibir a entrada de mais saharauis e, com isso, cortam o fornecimento de alimentos e remédios, e começam a fortalecer o bloqueio militar em redor do campo.

A 15 de outubro, enviaram funcionários do Ministério do Interior e militares para convencer os saharauis de que tinham que abandonar o campo, uma tentativa que fracassou porque não garantiam nem as exigências reivincadas nem a integridade física dos manifestantes.

A 18 de outubro, a Frente Polisario informa o Conselho de Segurança da ONU sobre o perigo que enfrentam os milhares de saharauis que se deslocam massivamente para Gdeim Izik. As autoridades de ocupação marroquinas cercam a capital do Sahara Ocidental ocupado, usando helicópteros para impedir que mais pessoas se desloquem para Gdeim Izik. Os saharauis do porto de Marsa, a 25 quilómetros de El Aaiún, erguem mais de 20 ‘jaimas’ para protestar contra as terríveis condições de trabalho. A falta de trabalho para a população saharaui é uma estratégia do ocupante para empobrecer e marginalizar o povo saharaui nos territórios ocupados. Teme-se o pior, face ao elevado número de efetivos das forças de segurança deslocados para a zona.

A 19 de outubro, os saharauis de Gdeim Izik apelam à comunidade internacional a intervir, com o objetivo de romper o bloqueio imposto pelo exército marroquino e fornecer água, medicamentos e alimentos. A 20 de outubro regista-se uma forte deslocação de militares, alguns deles vêm do "muro da vergonha" para reforçar as medidas de bloqueio no campo. O "muro da vergonha", com mais de 2.700 quilómetros de extensão que divide o Sahara Ocidental em dois e é uma das áreas dos planeta com mais minas antipessoal.

Milhares de saharauis continuam o êxodo em massa para os campos, na periferia de outras cidades ocupadas, que se reproduzem com Gdeim Izik como exemplo. A 21 de outubro, as forças do exército marroquino (a Gendarmaria e as forças auxiliares) cercam o acampamento e proíbem o acesso aos carros. O exército marroquino começa a construir uma parede de areia a leste de El Aaiún para impedir o fluxo de saharauis para Gdeim Izik. Confiscam mais de 40 carros que transportavam saharauis para o campo.

A 22 de outubro, o exército marroquino ataca mais de 41 saharauis que tentavam entrar no acampamento. Regista-se um aumento de reforços militares para cercar os deslocados saharauis. O exército marroquino fere gravemente três cidadãos saharauis nas proximidades de Gdeim Izik.

O exército marroquino impede pela força o deslocamento de centenas de saharauis nos arredores da cidade ocupada de Dakhla (extremo sul do Sahara Ocidental). Três saharauis são levados para o hospital de El Aaiún para receber tratamento após terem ficado gravemente feridos, vítimas da repressão exercida pelo exército marroquino.

A 24 de outubro, as Forças Armadas de Marrocos disparam contra um carro que tenta entrar no campo, o que causa a morte de Najem Elgharhi, um menino de 14 anos e o ferimento grava de outros cinco ocupantes da viatura.

A 25 de outubro, as autoridades de ocupação marroquinas enterram o corpo do menor Najem Elgharhi sem o consentimento e a presença de sua família. A mãe do menino exige uma autópsia ao corpo do seu filho e uma investigação independente que leve os responsáveis pelo assassinato à justiça. As autoridades marroquinas impedem a entrada de jornalistas espanhóis em El Aaiún.

A 27 de outubro, as autoridades de ocupação sequestram três vítimas do hospital da região vítimas dos disparos dos militares. A 28 de outubro, as vítimas saharauis do tiroteio relatam que foram espancadas e torturadas antes de serem levadas para o hospital. Oito observadores espanhóis são detidos no porto de El Aaiún. Chegavam de barco vindos da Gran Canarias e são expulsos e impedidos de chegar ao acampamento de Gdeim Izik.

A 31 de outubro, as autoridades de ocupação expulsam o deputado da Esquerda Unida (IU), Willy Meyer, e, ao mesmo tempo, expulsam o presidente da Federação Mundial da Juventude Democrática. A 3 de novembro, o número de pessoas deslocadas para o campo chega a mais de 25.000 e 8.000 ‘jaimas’. As forças de repressão marroquinas sitiam o aeroporto de El Aaiún, impedindo a entrada de sete observadores internacionais. As autoridades de ocupação começam os preparativos para atacar o campo. Lançam uma campanha de propaganda que descreve o Comité de Diálogo do Campo como "uma gangue que sequestra mulheres e crianças" para usar como desculpa contra Gdeim Izik.

A dia 7 de novembro, os saharauis do campo confirmam, através de um comunicado, a sua adesão aos princípios nacionais saharauis e a exigência de independência. As autoridades de ocupação, por sua vez, detêm três deputados espanhóis no aeroporto marroquino de Casablanca. Pouco tempo depois são expulsos para Espanha. Entretanto, proibem a passagem de um comboio de viaturas saharaui que transporta alimentos e medicamentos para Gdeim Izik. O regime de ocupação prossegue com uma campanha de prisões e perseguições. Expulsam um deputado francês. Impedem a entrada no território de um eurodeputado e de três jornalistas espanhóis. O exército marroquino cerca o acampamento de Karama e intima por alto-falantes a população sair, dá-lhes três horas para deixar o acampamento.

A rede telefónica é cortada no acampamento e na cidade de El Aaiun. Milhares de soldados, policias armados com cassetetes, gás lacrimogéneo e camiões com mangueiras de água posicionam-se no terreno. As entradas e saídas de El Aaiún são encerradas. Grandes manifestações têm início em El Aaiún exigindo a autodeterminação e a condenação do bloqueio imposto ao campo.

No dia 8 de novembro, às 5h da manhã, as forças de ocupação atacam com enorme brutalidade e desmantelam o acampamento de forma muito violenta: armados com armas, gás lacrimogéneo, canhões de água, camiões e 4 × 4, atacam o povo enquanto ele dormia. Atacam crianças, mulheres, homens, idosos, deficientes e queimam o acampamento. Saqueiam todos os pertences dos manifestantes, dos telemóveis, aos portáteis ... Prendem centenas de pessoas e fazem cerca de 2.000 feridos.

A resistência transfere-se para El Aaiún. Há manifestações que também são reprimidas com novas armas: os colonos marroquinos que são transportados dentro de camiões militares. Têm também a ajuda de um helicóptero. Saqueiam casas, torturaram muitas pessoas, saqueiam e incendeiam lojas de saharauis. Matam dois saharauis (Babi Gargar e Brahim Doudi), prendem centenas de pessoas, deixando muitas vítimas feridas na estrada. Levam para a Prisão Negra de El Aaiún mais de 200 saharauis e 24 presos saharauis são levados para julgamentos militares em Marrocos.

El Aaiún vira uma cidade fantasma. Ninguém sai de suas casas com medo de represálias e detenções arbitrárias. Os comandos das forças marroquinas arrombam muitas casas, detêm muitas pessoas e causam muita destruição nas casas dos saharauis. Alguns dos detidos são libertados depois de serem torturados e violados em locais secretos.




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