Refiro-me ao
assédio moral que já está a ser exercido sobre o novo rei. O ministro
García-Margallo [dos Negócios Estrangeiros], durante a sua recente estadia em
Marrocos, disse publicamente que o rei deveria fazer a sua primeira visita oficial
a esse país, seguindo a tradição dos últimos anos dos sucessivos chefes de
governo. Os meios de comunicação marroquinos, nas mãos do governo, reproduziram
imediatamente e de forma maciça a mensagem do ministro espanhol, dando-a por
adquirida, enaltecendo esta visita como forma de melhorar a imagem de sua
monarquia, a qual está muita abalada.
Percebo pouco
destas coisas, mas parece-me que um Rei não tem que seguir padrãos definidos
por quem, protocolarmente, tem um estatuto inferior; a acontecer, seria o contrário.
Mas felizmente, a ordem de visitas não vai começar por Marrocos; alguém com
mais cabeça terá interferido impondo-se às nada dissimuladas preferências de
García-Margallo. Penso que um ministro deve ser mais prudente com as declarações
que profere em solo estrangeiro e sobretudo quando afetam o país anfitrião,
como é o caso… Além disso, não se pode qualificar de tradição um acontecimento
que em quarenta anos só se repetiu quatro vezes.
O ministro
poderia ter-se referido às viagens do Rei Juan Carlos que, esse sim, criou uma
tradição com as suas visitas a Marrocos; tinha ali uma segunda casa. Com
muletas, e estivesse-se ou não no período do Ramadão, era lá que se instalava. O
Rei Juan Carlos parece que tinha interesses pessoais a defender em Marrocos, pelo
menos assim podemos ser levados a pensar dado o forte apoio que deu a este país
durante todos estes anos sobre a questão do Sahara Ocidental.
Parece também
que foram levados ao pé da letra aquela nefasta Lei 40/1975, que ele assinou, sobre
a descolonização do território do Sahara, na qual se afirmava que o Governo
espanhol não estava vinculado a qualquer compromisso formal sobre o destino do
mesmo ou da sua população. O que, dito depois de cem anos de colonização, soa
um pouco forte. Mas, de facto, assim tem sido: desde 1975, nenhum compromisso nem
com o território nem com o seu povo.
Lamentavelmente
esqueceu-se que essa Lei de descolonização, na sua disposição adicional, pedia
ao Governo para tomar medidas adequadas para que fossem indemnizados, de acordo com a lei geral, os espanhóis que se vissem obrigados a
deixar o território do Sahara. Os Saharauis eram espanhóis e viram-se invadidos
por Marrocos, levando centenas de milhares deles a abandonar o território, aí
continuando refugiados em Tindouf [na Argélia]. Nunca foram indemnizados e hoje continuam a ser-lhes colocados todos os obstáculos
às suas reivindicações.
O Rei Juan
Carlos signatário da referida Lei não se preocupou com os saharauis para nada nos
seus trinta e nove anos de reinado. Nem em todo este tempo foi capaz de se dirigir
uma só vez aos milhares de crianças saharauis que todos estes anos vêm a Espanha
nas férias de verão.
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