sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

Alemanha fundamental para travar "regresso da guerra" ao Saara Ocidental


Oubi Bouchraya


O Saara Ocidental vive a ameaça do "regresso da guerra"[nota: de facto, a guerra já regressou. Há dois anos que o exército saharaui ataca diariamente as posições marroquinas ao longo do muro de 2.700 km que divide o território] e a Alemanha tem um papel fundamental numa solução diplomática para o território controlado por Marrocos, defendeu Oubi Bouchraya, representante da Frente Polisário para Europa e União Europeia.

No dia em que começa a 46ª edição da EUCOCO, a Conferência Europeia de Apoio e Solidariedade com o Povo Sarauí, até 03 de dezembro em Berlim, na Alemanha, Oubi Bouchraya sublinhou à Lusa a "importância" e "significado" do lugar escolhido.

"A Alemanha é um país muito importante, com muito peso, não apenas económico, mas que está agora a recuperar um papel muito mais relevante dentro da União Europeia depois do Brexit", indicou.

"A Europa está a fazer campanhas sobre a necessidade de respeitar o direito internacional no contexto ucraniano, enquanto se esquece do Saara Ocidental. É uma obra complexa de contradições onde a Europa não tem argumentos, e nesse sentido a Alemanha pode fazer muito", realçou Oubi Bouchraya.

O programa da EUCOCO arranca com uma reunião interparlamentar no Bundestag, na sexta-feira. Para a Frente Polisário, movimento de libertação que luta desde 1976 [de facto, desde 1973] pela independência do Saara Ocidental, esta é a altura de a Alemanha "ver as coisas de outra perspetiva, e não desde o ponto de vista propagandístico de Marrocos".

"A Alemanha está chamada, como todos os países individualmente e coletivamente, a fazer parte da solução, e não continuar a fazer parte do problema. Marrocos tem estado a receber umas mensagens erróneas por parte da União Europeia que o motivam muito a desafiar a comunidade internacional", indicou Bouchraya, apontando o financiamento como exemplo.

Localizada na costa noroeste de África, o Saara Ocidental é uma antiga colónia espanhola que foi anexada por Marrocos em 1975. Em 1991, uma trégua mediada pela Organização das Nações Unidas (ONU) pôs fim a 16 anos de violência entre Marrocos e a Frente Polisário. Uma trégua quebrada quase trinta anos depois.

"O conflito encontra-se agora num grande ponto de inflexão depois do quebrar do cessar-fogo há dois anos", admitiu o representante da Frente Polisário para a Europa e União Europeia.

"Regressou a guerra, as dinâmicas regionais, as tensões que se vivem dentro da região e a consumação definitiva do fracasso das Nações Unidas, com a recusa por parte do Conselho de Segurança de mudar a forma de abordar o conflito", lamentou.

"Infelizmente muitas coisas mudaram no terreno, na região, há muita tensão, estão reunidos todos os ingredientes para haver uma escalada de violência. Mesmo assim, o Conselho de Segurança das Nações Unidas, em Nova Iorque, está a uma velocidade completamente diferente que corresponde à realidade do conflito antes de 2020", acusou.

Para o também embaixador Oubi Bouchraya o conflito no Saara Ocidental não está esquecido, mas sim "silenciado propositadamente" e "negligenciado".

"É um conflito que existe, que toda a gente sabe que é uma ameaça regional e ao mediterrâneo, mas como a Marrocos não lhe convém que seja falado, os círculos de `lobby` e pressão da União Europeia seguem essa mesma linha. Mas quando essa realidade estalar, já será demasiado tarde", avisou.

A EUCOCO, que se realiza anualmente desde 1975, surge num momento muito importante, referiu o diplomata, convidando movimentos, associações solidárias, para "estarem à altura das exigências do tempo atual" em que o povo sarauí pode enfrentar consequências graves para o seu futuro.


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