domingo, 26 de outubro de 2025

Bruxelas arrisca-se com novo mecanismo financeiro para integrar o Sahara Ocidental no acordo com Marrocos

Ursula von der leyen ou a estratégia de como ludribriar
as resoluções do Tribunal de Justiça da União Europeia

A União Europeia (UE) está a desenvolver um mecanismo orçamental complexo e controverso para justificar a integração do Sahara Ocidental no acordo de comércio livre com Marrocos — uma operação que, segundo a Africa Intelligence, poderá ter implicações políticas e jurídicas e orçamentais significativas.

Para contornar as sentenças do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), que consideram ilegais os acordos comerciais UE-Marrocos aplicados ao território ocupado do Sahara Ocidental, Bruxelas comprometeu-se a garantir que os benefícios desses acordos revertam de forma “precisa, concreta, substancial e verificável” para as populações saharauis — incluindo os refugiados nos campos de Tindouf, na Argélia - diz o portal Africa Intelligence, um órgão de informação geralmente bem informado.

Contudo, os contornos do mecanismo permanecem vagos - diz. Segundo a mesma fonte, a Comissão Europeia e Rabat acordaram que o financiamento será totalmente assumido por Bruxelas, decisão que tem causado mal-estar nos setores agrícolas francês e espanhol, que já contestam a concorrência dos produtos marroquinos, sobretudo dos tomates-cereja cultivados no Sahara Ocidental.

 

Um mecanismo controverso e de eficácia duvidosa

O plano prevê o financiamento de projetos de irrigação, energias renováveis e dessalinização no território, sob coordenação do diretor-geral da Comissão Europeia para o Médio Oriente e Norte de África, Stefano Sannino. No entanto, muitas das empresas que operam nesses setores são marroquinas — como a Nareva, pertencente à holding real Al Mada, responsável pela unidade de dessalinização de Dakhla — ou estrangeiras.

Na prática, os beneficiários diretos dificilmente serão as populações saharauis, o que levanta dúvidas sobre a conformidade do plano com as exigências do TJUE, adianta o portal.

A Frente POLISARIO, reconhecida pela ONU como representante legítima do povo saharaui, ainda não reagiu oficialmente, mas a Africa Intelligence sublinha que a aceitabilidade do dispositivo é incerta. O movimento independentista poderá contestar judicialmente o mecanismo, tal como já fez em processos anteriores contra Bruxelas e Rabat.

 

Bruxelas reforça ajuda humanitária em Tindouf

Paralelamente, a Direção-Geral da Proteção Civil e das Operações Humanitárias da Comissão Europeia (DG ECHO), dirigida por Maciej Popowski, deverá reforçar a ajuda humanitária aos campos de refugiados de Tindouf — onde a UE investiu cerca de 300 milhões de euros desde 1993, uma gota de água no oceano de negócios que a Eu tem mantido como o reino alauita.

O plano europeu contempla ainda apoios adicionais à educação, cultura e formação das populações saharauis, sob responsabilidade da DG Educação, Juventude, Desporto e Cultura, liderada por Pia Ahrenkilde Hansen - refere a ainda o Africa Intelligence.

Apesar dessas intenções, analistas ouvidos pela publicação consideram que o novo mecanismo poderá transformar-se num “exercício orçamental arriscado” — um gesto político para manter boas relações comerciais com Rabat, mais do que uma verdadeira política de redistribuição em favor do povo saharaui.

 

Fonte: Africa Intelligence, edição de 24 de outubro de 2025

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