domingo, 30 de dezembro de 2012

Atentado ao Presidente mauritano: fracasso do Majzen para abortar a aliança Mauritânia-Argélia-RASD



A Mauritânia é um país que interessa muito a Espanha. É um dos mercados de Espanha através das ilhas Canárias e a porta de entrada de Espanha para os mercados da África Ocidental. E, no entanto, pouco se informa, muito pouco se fala, sobre esse país. No dia 13 de outubro o Presidente da Mauritânia, Mohamed Uld Abdelaziz, foi ferido por vários disparos de bala no momento em que falava a um grupo de militares. Quase ninguém em Espanha falou do assunto. Mas vão-se acumulando os indícios de que houve uma tentativa por parte de Marrocos de o assassinar. Motivo? A Mauritânia decidiu não se vergar à política do majzen no norte de África.

I. O PRESIDENTE MAURITANO FERIDO À BALA NUM "INCIDENTE" A 13 DE OUTUBRO
Só um jornalista espanhol, que me conste (se não for assim gostaria que me retificassem) informou sobre os disparos contra o Presidente mauritano:

Atentado para acabar com a sua vida ou disparo por engano? O Presidente da Mauritânia, Mohamed Ould Abdelaziz, de 56 anos, foi baleado, sábado à tarde, em circunstâncias confusas e no domingo foi evacuado para París em avião-ambulância. A sua vida não corre perigo.
(...)
Horas antes fora o ministro da Comunicação, Hadi Ould El Mahjoub, que compareceu ante as câmaras para afirmar que o presidente estava “ligeiramente ferido”, baleado, por causa de disparos efetuados por engano “por uma unidade militar que não sabía que se tratava do cortejo presidencial”.
Desde a cama do hospital o próprio presidente mostrou “compreensão pela reação do soldado que disparou”. Apesar disso, dois oficiais do Exército foram detidos pela sua responsabilidade no incidente. A explicação fornecida é difícil de acreditar. A grande movimentação da Guarda Presidencial, apoiada por outras forças de segurança, em redor do hospital levam a duvidar da sua sua veracidade.
O incidente teve lugar em Tweila, a uns 40 quilómetros ao norte de Nuakchot. A comitiva presidencial tinha saído de Tidjikja, no centro da Mauritânia, onde o presidente possui uma quinta em que costuma passar muitos fins-de-semana. Para além de Abdelaziz ficaram feridos vários elementos da sua escolta, segundo o web Sahara Media. Outras fontes indicam que o Presidente foi ferido por dois disparos, um no braço e outro no pulmão, e que a operaão terá permitido a extração de ambos os projéteis.

Ignacio Cembrero, o autor desta informação, aludia no final do seu artígo que Uld Abdelaziz tinha lutado na Mauritania contra a chamada AQMI.
Há tempo que tenho denunciado os indicios de que a AQMI está controlada pelos serviços secretos do majzen.

II. O MAJZEN MARROQUINO ACUSADO DE ESTAR POR DETRÁS DO "INCIDENTE"
A imprensa mauritana, nos dias posteriores ao acontecimento, publicaram informações segundo as quais os responsáveis da Mauritânia acusavam Marrocos de ter organizado o atentado contra o Presidente mauritano.
A 11 de novembro de 2012, a página mauritana "Aqlam" informava que o Presidente mauritano tinha recusado no hospital de Paris, onde convalescia, a visita de um enviado oficial marroquino.
Um dia depois, o diário marroquino "Demain" informava que o enviado marroquino era Riad Ramzi, encarregado de negócios da embaixada de Marrocos em França (cujo posto de embaixador estava por preencher nesse momento). Nem a embaixada marroquina em Paris nem o Ministério do Interior mauritano quiseram dar explicacações à imprensa que os questionou sobre o assunto.
A 13 de novembro de 2012, o diário mauritano "El Ajbar" publicava uma informação segundo a qual as autoridades mauritanas fizeram saber a algunos Estados amigos as suas suspeitas de que Marrocos teria estado por detrás da tentativa de liquidar o Presidente Uld Abdelaziz.
A imprensa mauritana revelou que Mohamed VI não havia contactado com o Presidente mauritano, nem por telefone nem por escrito, para o felicitar depois de ter escapado ao incidente do dia 13 de outubro passado.
A 18 de novembro, o diário argelino "El Watan" apontava que o atentado podia ser obra conjunta do Qatar (com "Q", por favor) e de Marrocos.
Segundo o "El Watan", o interesse do Qatar foi o de eliminar um presidente que resistira aos intentos de desestabilização promovidos por grupos islamistas armados, como o "MUYAO" financiado pelo Qatar na opinião de alguns serviços de inteligência ocidentais, refere o diario argelino.
O interesse qatarí conjugava-se com o interesse marroquino pois, segundo este diário argelino, a dinastia alauita tinha tentado, sem êxito, que a Mauritânia se alinhasse à posição marroquina no conflito do Sahara Ocidental.

III. O POUCO CREDÍVEL DESMENTIDO OFICIAL MAURITANO
No dia 20 de novembro, o Presidente Uld Abdelaziz concedeu uma entrevista à emissora "France 24". Nesta entrevista, questionado sobre os disparos de que fora alvo, afirmou que o que haviam declarado oficialmente as autoridades mauritanas era "verdadeiro". O Presidente Abdelaziz desmentiu que se tratasse de um atentado "terrorista". Pois bem, em nenhum momento da entrevista foi mencionada expressamente a hipótese de uma implicação de Marrocos que, todavia, não foi expressamente rejeitada, embora o tivesse sido implícitamente. Não obstante, a expressão física de Abdelaziz quando reiterava a versão oficial, produz uma certa desconfiança sobre a veracidade das suas palavras.
O facto é que, diplomaticamente, a decisão de acusar os serviços secretos marroquinos do atentado é algo de gravíssimo. Num contexto regional tão tenso como o norte-africano uma tal acusação, ainda que baseada em dados indesmentíveis, produziria uma comoção política internacional de consequências difíceis de calcular. É verosímel pensar que, ainda que a hipótese da autoria dos serviços secretos marroquinos corresponda à verdade, o governo mauritano não tivesse nenhum interesse em denunciá-la OFICIALMENTE, sobretudo quando essa tentativa de atentado resultou fracassada. A postura mais inteligente, em tais casos, não é tanto a de denunciar oficialmente os servicios secretos do majzen, mas a de "tomar nota, registar" e "atuar em consequência".
E isso parece que foi o que aconteceu.
No dia 21 de dezembro de 2012, Abdalá Baha, ministro de Estado marroquino e vicepresidente do partido islamista marroquino PJD, visitou a capital mauritana. Allí foi para participar no congresso do partido islamista mauritano "Tauasul" (partido que, por certo, defende as teses do majzen no conflito do Sahara Ocidental). Em Nuakchott concedeu uma entrevista ao "El Ajbar" e nela afirmou que as afirmações de uma implicação de Marrocos nos disparos contra Uld Abdelaziz são "uma fabricação e uma pura mentira".
O problema é que Abdalá Baha em relação a estas acusações disse também que

"não está nos hábitos de Marrocos nem faz parte da Ética marroquina realizar ações como esta
(...)
nego taxativamente este assunto"

A pergunta que devemos fazer é: porquê, para refutar a acusação, o ministro marroquino não utilizou as palavras do presidente da Mauritânia?
Talvez porque nem o governo marroquino acredita nelas.
"Yabiladi", uma publicação marroquina que comunga da política expansionista marroquina do Makhzen, falava no dia 26 de dezembro que "ainda não estão elucidadas as circunstâncias do incidente de 13 de outubro." O facto de, no próprio Marrocos, se continuar a falar sobre "circunstâncias ainda não elucidadas " demonstra que o alegado "desmentido" do próprio Presidente mauritano não é aceite como digno de crédito por ninguém. Além disso, esta publicação marroquina ("Yabiladi") assume que este "incidente" estreitou o entendimento consolidado entre Nouakchott e Argel.

IV. ASSASSINATO, INSTRUMENTO POLÍTICO DO MAJZEN
As declarações do ministro Abdalá Baha só se podem explicar ou por ignorância ou por cinismo. E a ignorância é difícil de acreditar neste caso.
O facto é que o assassinato tem sido um instrumento utilizado pelo majzen. Recordemos, sem ir mais longe, os seguintes casos:
- sequestro, tortura, assassinato e desaparecimento, em París, de Mehdi Ben Barka, em 1965, o mais importante adversário político de Hassán II;
- assassinato do general Ahmed Dlimi, ex-número 2 de Hassán II, num "acidente" de viação em Marrakech;
- assassinato em Málaga de Hicham Mandari, em 2004, o maior perigo nesse momento para Mohamed VI;
- inexplicado "acidente" de Hamidu Laanigri em setembro de 2011.

A esta lista se poderiam acrescentar mais nomes. Como recorda a publicação digital independente marroquina "Demain", a esta lista poder-se-ia acrescentar o nome de Abdellah El Hattach, conselheiro do presidente do grupo de Madia "Massae Media", que sofreu uma tentativa de assassinato. E não apenas esse. "Demain" "recorda" o ministro islamista marroquino Abdalá Baha que, juntamente com o atual "primeiro-ministro" islamista marroquino, eram militantes de um grupo islamista violento, a "Shabiba Islamía" que, em 1975, assassinou um opositor político que (oh, casualidade!) se opunha tanto a Hassán II como aos islamistas): Omar Benyelún.



V. O PRESIDENTE MAURITANO RECEBE UM MINISTRO SAHARAUI... E RECUSA-SE A RECEBER UM MINISTRO MARROQUINO
Como se tudo o que dissemos anteriormente fosse pouco, acrescentemos um dado final.
Enquanto o presidente e o ministro de Exteriores mauritano receberam o ministro de Negócios Estrangeiros da República Saharaui (RASD), Mohamed Salem Uld Salek, no dia 21 de dezembro de 2012, ... o mesmo Presidente mauritano recusava-se a receber o ministro marroquino Abdalá Baha que se encontrava na capital mauritana para participar no congresso do partido islamista mauritano que decorreu de 20 a 23 de dezembro.

VI. ALIANÇA ARGÉLIA-RASD-MAURITÂNIA FACE AO EXPANSIONISMO E ÀS MANOBRAS DE DESESTABILIZAÇÃO DO MAJZEN NA REGIÃO
A situação na região alterou-se substancialmente no plano político. O majzen há anos que procura desestabilizar a Mauritânia (por meios diretos e indiretos). A manobra do majzen para apropriar-se do lugar no Conselho de Segurança que devia corresponder à Mauritânia para o biénio 2012-2013 constituiu a gota de água que fez transbordar o copo. A partir daí os acontecimentos precipitaram-se e Nuakchott e Argel reforçaram o seu entendimento relançando importantes projetos estratégicos conjuntos de infraestructuras (como a estrada Tindouf-Shum).
Em segundo lugar, Nuakchott enviou uma mensagem clara de apoio à república saharaui com a recepçao concedida pelo Presidente mauritano ao ministro dos Negócios Estrangeiros saharaui em novembro do ano passado.
Estes e outros acontecimentos (como o sequestro dos cooperantes espanhóis nos acampamentos de Tindouf por grupos terroristas provavelmente coordenados a partir do aparelho do serviço secreto do Makhzen na embaixada de Marrocos na Mauritânia) fornecem o quadro em que, na minha opinião, temos de colocar contexto do "incidente" sofrido pelo Presidente mauritano a 13 de outubro.
Uma vez que o Presidente da Mauritânia sobreviveu ao "incidente" é compreensível que o Presidente mauritano tenha "registado" e decidido "agir em conformidade." E fê-lo não apenas tomando uma posição firme de apoio à República Saharaui (como demonstrou no acolhimento concedido ao ministro saharaui em 21 de dezembro deste ano, ao mesmo tempo que se recusou a receber um ministro marroquino), mas em outros aspectos "sensíveis" ao Makhzen. O primeiro, e mais importante, é o conflito do Mali. Mauritânia partilha inteiramente a posição da Argélia para resolver esta crise. Uma posição que é ... exatamente a oposta à preconizada pelo Makhzen. Posição do Makhzen que também é compartilhada pelo governo de Rajoy e terminais de media dos seus de centros de pseudo-análise. Enquanto o Makhzen defende uma intervenção militar, Argélia e Mauritânia consideram esta intervenção como inútil e contraproducente. É importante notar que o "aliado teórico" do Makhzen, os EUA, alinha-se com a Mauritânia e Argélia contra Marrocos neste ponto.

VII. MOMENTO CRÍTICO PARA RAJOY, COM O GRAVE RISCO DE PERDER A FACE NA ÁFRICA DO NOROESTE
De um ponto de vista geoestratégico, a situação na região em 2012 assemelha-se, fortemente (até mesmo com matizes), à existente em 2003, quando a Espanha, governada por José María Aznar, se encontrava aliada aos EUA, Argélia, Mauritânia e à Frente Polisário , e se obteve o apoio unânime do Conselho de Segurança para o Plano Baker para o Sahara Ocidental (que abortou a partir de dentro a então ministra espanhola dos Negócios Estrangeiros, apoiada pelo seu chefe de Governo).
 Estas são as coincidências:
por um lado, deparamo-nos com uma convergência de pontos de vista entre a República Saharaui, Argélia, Mauritânia... e EUA; por outro lado, Marrocos.
Há, no entanto, duas diferenças:
a primeira é que a França de 2012 não está tão alinhada com o majzen como a de 2003. François Hollande não é Jacques Chirac porque, ao contrário do corrupto Jacques, Hollande não deve nada ao pai de Mohamed VI;
a segunda é que em 2003 Aznar estava sólidamente alinhado com os EUA-Argélia-Mauritânia-Frente Polisario...enquanto agora a dupla Rajoy-Margallo faz uma aposta suicída pelo majzen.
Em maio, o governo Rajoy foi o único governo do mundo ocidental que apoiou a demencial proposta do majzen de recusar o Enviado Pessoal do Secretário-Geral da ONU para o Sahara Ocidental, Christopher Ross. Como é notório, ao apoiar essa proposta caiu no ridículo, embora não tanto como o próprio Mohamed VI, verdade se diga. Agora, o governo de Rajoy tem de novo que se definir. Porque se não se define, corre o risco de quedar-se onde está. E onde está agora é onde fez a sua primeira (e equivocada) viagem oficial. E quedar-se aí, receio, é ter uma grande probabilidade de perder.


Fonte: Desde El Atlantico
Artigo do Prof. Constituicionalista Carlos Ruiz Miguel

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Verde Esperança ou Verde Independência?




O meu avô Mohamed, é um senhor que há 38 anos vivia na região de Rio de Oro, no sul do Sahara Ocidental. Este território estava sob o protetorado espanhol e, posteriormente, foi invadido de forma ilegal por Marrocos. Mohamed viu-se obrigado a deixar tudo e a fugir, exiliando-se junto com toda a sua família na Hammada argelina, que é um dos piores desertos, árido e pedregoso. Ele sempre foi um beduíno, amante da natureza e do verde da natureza.

Era nómada, indo de um lugar para outro, em busca do verde, o verde que dependia da chuva: É um filho das nuvens. Hoje, ele tem mais de cem anos de idade, e continua a manter-se vivo graças ao leite de camela, de cabra e de ovelha. Apesar de sua idade avançada, não perde a esperança, está plenamente convencido de que um dia irá viver na sua terra livre e verde.

O verde é a cor dos saharauis, porque representa a esperança de que vivem dia a dia  e leva-os a lutar com o objetivo da independência, que está representada com a essa mesma cor na sua bandeira, pelo que simboliza de paz e de felicidade.

Ebbaba Mohamed

Fonte: Colectivo Saharaui

Jovem sequestrado encontrado no hospital em estado grave



Segundo informa a família de Mohamed Babbir, o jovem saharaui de 21 anos sequestrado ontem pela polícia marroquina em El Aaiún, este foi encontrado hoje no hospital em estado muito grave, com um profundo ferimento na cabeça. A família do jovem ativista, uma vez encontrado o seu familiar no hospital, dirigiu-se de imediato ao Comissariado da Polícia para presentar uma denúncia mas a polícia marroquina negou-lhes o direito de o fazerem.

A família de Mohamed Babbir visitou o Procurador Geral para apresentar-lhe uma cópia da denuncia, mas o Procurador recusou-se a recebê-la, argumentando que a polícia o havia informado que tinha estado na Comissaria depois de passar a noite no hospital.

A polícia marroquina há vários meses que procurava Mohamed Babbir, após a captura de dois dos seus amigos ativistas da Intifada.

Mohamed Babbir foi detido ontem, 25 de dezembro de 2012, no Barrio Al-Auda, da cidade de El Aaiún, após uma manifestação pacífica onde participaram dezenas de cidadãos saharauis.

Fonte RASD NEWS 

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Ciberterrorismo marroquino contra a liberdade de expressão e o direito à informação



Uma vez mais o sítio www.porunsaharalibre.org foi atacado por ciberterroristas ao serviço do governo marroquino. Com estes atos Marrocos demonstra, uma vez mais, o seu total desprezo para com o Direito de Informação e a Liberdade de Expressão, tentando silenciar e ocultar as contínuas violações dos Direitos Humanos que comete sobre a população civil saharaui nas zonas ocupadas do Sahara Ocidental.

Como afirmámos em mais de uma ocasião, com estes ataques não conseguem mais do que animar-nos em prosseguir lutando, dando-nos a certeza de um bom trabalho e a segurança de estar do lado certo.

Podem estar seguros que voltaremos como sempre fizemos, não nos irão calar.

Fito Álvarez e Conchi Fernández 
(administradores de www.porunsaharalibre.org)

Entrevista com Carlos Martín Beristain, coautor do relatório “El Oasis de la Memoria: Memoria Histórica y Violaciones de Derechos en el Sáhara Occidental”



«El oasis de la memoria. Memoria histórica y violaciones de Derechos Humanos en el Sahara Occidental», é um trabalho de Carlos Martín Beristain e Eloísa González Hidalgo. Este relatório recolhe as violações dos direitos humanos desde a invasão do território por Marrocos, em 1975, até ao desmantelamento do acampamento de Gdeim Izik (novembro de 2010) e assenta na metodologia desenvolvida em diferentes projetos de “Memória Histórica e Comissões da Verdade” em que o doutor Beristain participou na América Latina. A obra está dividida em dois volumes e foi publicada por Hegoa (Bilbao, 2012), estando acessível e podendo ser consultada através da sua página web:



 “Poemario por un Sahara Libre” entrevistou Carlos Martín Beristain horas depois deste ter apresentado o relatório em Saragoça. Quisemos saber em que consiste este trabalho: “O livro é uma tentativa de dar voz às vítimas saharauis, um espaço destinado à recolha de testemunhos, muitos dos quais nunca tinham sido relatados e, dessa forma, poder divulgar  e compartilhar essas histórias das 261 vítimas que foram entrevistadas, uma parte de uma história coletiva do povo saharaui e das violações dos direitos humanos no Sahara Ocidental. Muitas das vítimas entrevistadas tinham anteriormente falado”.

Os autores do relatório depararam-se com experiências dramáticas, como “crimes de guerra ou bombardeamentos, especialmente o de Um Draiga”. As experiências destas vítimas nunca foram investigadas em profundidade, nem esses casos foram considerados relevantes no âmbito do conhecimento do que ocorreu ao povo saharaui.

Partindo desta perspetiva de dar visibilidade ao impacte das violações dos direitos humanos da população saharaui fez-se um estudo “segundo os parâmetros internacionais de experiências como as Comissões da Verdade no mundo, em várias das quais eu participei”.

Pode-se dividir o estudo em duas grandes partes. Por um lado, “um estudo de diferentes casos de violações de direitos humanos que se deram no Sahara, desde os bombardeamentos e o êxodo do ano de 1976, até ao acampamento de Gdeim Izik, passando pelas diferentes épocas”. Nas palabras de Berastain, “as violações de direitos humanos contra o povo saharaui tiveram uma dimensão coletiva. Durante os primeiros anos foram o êxodo, o bombardeamento, a pilhagem, o desaparecimento forçado, tanto dos que permaneceram nos centros clandestinos e morreram, como de outros de que não há nenhuma informação até hoje, como daqueles que foram libertados no ano de 1991, e também depois, nos anos de 1993 e 1996; e a experiência de outros casos coletivos posteriores, das detenções arbitrárias, torturas, na época final de Hassan II e na época já do regime de Mohamed VI”.




O estudo tratou de documentar o conjunto de factos mais significativos de uma outra época que tem a ver com casos de tribunais militares a julgar civis, os casos da Intifada de 2005, o caso Aminetu Haidar, e o caso do acampamento de Gdeim Izik . Carlos explica que o primeiro volume do relatório “termina com uma análise do modus operandi, de quais as condições que tornaram possível o horror e as violações dos direitos humanos no Sahara". No segundo volume “pode-se encontrar uma análise do impacte das violações dos direitos humanos, que efeitos tiveram na vida das pessoas”. Recolher o impacte individual e coletivo, o impacte familiar, os impactes sobre as mulheres; sem esquecer “os impactes muitas vezes invisíveis sobre a população infantil, a geração seguinte, a dos filhos que tiveram os país e as mãos desaparecidos; também o dos filhos que se foram socializando na dor e no sofrimento da repressão contra as manifestações, que sofreram, por sua vez, detenções e torturas por terem tentado atravessar o muro, por participar em manifestações, etc”.

A partir daí há outra parte que Beristain designa por “a memória da solidariedade”, que tornou possível a resistência do povo saharaui, "a justiça da sua causa, a consciência social, política e cultural do povo saharaui, as formas de apoio mútuo em condições extremas em centros de detenção clandestinos, a mobilização social e a defesa dos direitos humanos como estratégias de defesa da vida face a essa repressão".

Por último, o relatório trata um capítulo chamado "Verdade, justiça e reparação no Sahara Ocidental". Nas palavras Beristain, faz-se uma análise de três fatores: "por um lado, quais as normas internacionais sobre a verdade, justiça e reparação em processos de transição política, que não foram implementados no caso do Sahara Ocidental; faz-se uma análise de quais são as demandas das vítimas e a experiência das vítimas sobreviventes".

Houve uma tentativa de organização no ano de 94, e principalmente do ano de 1999 em diante, de as vítimas sovreviuventes se unirem em comités, exigindo o reconhecimento dos factos, a investigação dos desaparecidos, a justiça, a reparação moral, a reparação económica. Esse conjunto de fatores produziu-se no Sahara com falta de resposta institucional por parte do Estado marroquino para atender a essas demandas e aos padrões internacionais.




No epílogo do relatório — nas palavras de Beristain — apela-se às linhas do que deveria ser um "repensar do conflito saharaui a partir da perspetiva dos direitos humanos". "O relatório tem como objetivo ajudar a colocar a discussão do Sahara em uma dimensão que tem a ver com os direitos humanos, já que estamos falando de um conflito armado e de uma repressão política que precisa ser revista a partir desses padrões para encontrar uma solução política também ".

Quisemos saber como surgiu a ideia de realizar esta pesquisa e o subsequente relatório. Carlos Beristain tinha um conhecimento prévio da situação do povo saharaui em questões relacionadas com a saúde, já que, há anos atrás, fez uma avaliação sobre o tema da cooperação nos campos de refugiados. O relatório surgiu da importância de fazer "um trabalho diferente sobre a situação dos direitos humanos", segundo as suas palavras. A sua experiência neste campo na América Latina, em países como a Guatemala, Peru, Equador e Paraguai, remonta a mais de 20 anos, no contexto de guerra, violência, assistência às vítimas, defesa dos direitos humanos de uma perspetiva psicossocial. Esta experiência também poderia ser útil no caso do Sahara que, porém, apresentava inúmeras dificuldades "num território, como o dos acampamentos, com o ‘stress’ climático, social, o isolamento e falta de consciência de que a questão dos direitos humanos poderia ser considerada como central na sua situação".

A importância de um trabalho como este era cada vez mais evidente desde que se começou a romper o isolamento em relação à situação dos direitos humanos no Sahara. Um aspeto muito importante foi conseguir "a confiança das vítimas, nada disto poderia ser feito sem essa construção de confiança, e que passou também por um processo de relacionamento com algumas das organizações, com algumas vítimas que têm um conhecimento muito bom da situação, para estabelecer uma base que permitisse o acesso às vítimas em condições que permitissem o trabalho: confidencialidade, e proteção do espaço, para que o trabalho pudesse ser feito com certas garantias”.  Tudo com a intenção de romper com uma tendência muito comum no caso do Sahara, em que, muitas vezes, são recolhidas denuncias excessivamente genéricas, ou com uma componente política do testemunho, mas "sem aprofundar a experiência das vítimas".

O relatório tem múltiplos usos, Martín Beristain vê-lo como "um presente para o povo saharaui. A memória que as pessoas compartilharam connosco, sistematizámo-la e devolvemo-la. Oxalá as pessoas sintam que a sua história está ali, que há uma construção coletiva que lhes pertence (...) Que seja uma memória em que as vítimas se sintam reconhecidas, respeitadas e tidas em conta". Nas palavras do autor, o relatório deixa linhas de trabalho para "uma agenda de transformação no conflito, desde o acompanhamento às vítimas, aos defensores dos direitos humanos; linhas de trabalho para cuidar das vítimas nos acampamentos de refugiados, o que fazer com as famílias dos desaparecidos e com as vítimas de violência".

Martín Beristain destaca que também se propõem programas de assistência e acompanhamento que se poderiam pôr em marcha; se apresenta toda uma linha de trabalho de atuações não implementadas ainda no Sahara, e que são necessárias. Como diz o autor, "são coisas que foram aplicadas em outras situações de conflito e de guerra e têm sido importantes para as vítimas." O relatório também fornece "elementos para que seja feita uma política de reivindicação contra o Estado de Marrocos", além de diretrizes para trabalhar com as agências da ONU relacionadas com o tema dos direitos humanos. Na opinião de Martín Beristain, o "Sahara esteve muito longe de todos esses mecanismos internacionais durante anos, porque o Estado de Marrocos não o permitiu que eles fossem ativados; a situação está a mudar, nos últimos meses tem havido um grande número de visitas relevantes e bem importantes e o relatório pode ser útil para todos os setores do campo dos direitos humanos que não tiveram conhecimento real da dimensão do problema do Saara, ou se deixaram levar pela representação da realidade dominante, promovida pelo regime de Marrocos nos fóruns internacionais".


Nota: Carlos Martín Beristain, é médico, especialista em Educação para a Saúde e doutor en  Psicologia.

sábado, 22 de dezembro de 2012

Timor Leste, Palestina. E o Sahara Ocidental?

Assembleia Geral das Nações Unidas



A Palestina empreende agora o caminho que há pouco mais de uma década foi iniciado pelos timorenses. Quando alcançaram a independência depois de duas décadas e meia de ocupação estrangeira. Na fila de espera para o acesso ao numeroso, embora selecionado, clube de Estados soberanos, o próximo na fila parece ser o Sahara Ocidental.
Apesar dos paralelismos entre os três, os casos que maior similitude têm são os de Timor-Leste e do Sahara Ocidental.

Descolonização inacabada e Guerra Fría

15.000 kilómetros separam Dili, capital de Timor-Leste, de El Aaiún, capital do Sahara Ocidental. Dois pontos do globo sem conexão aparente que, durante mais de 24 anos, compartilharam os destinos.

Espanha e Portugal mantiveram durante a sua história muitos pontos de encontro. A partir de 1945, ambos os países, como também o fez a França, puseram em prática políticas de “maquilhagem”, e procuraram evitar as pressões das Nações Unidas para que iniciassem processos de autodeterminação dos territórios que ainda controlavam, chegando, inclusive, a dar o estatuto de província às suas colónias.

Nessa longa jornada através da história em comum, 1975 marcou um ponto decisivo de viragem para a Península Ibérica. Portugal, com a sua Revolução dos Cravos, tinha posto um ponto final há um ano à ditadura de Salazar-Caetano e dispunha-se a liquidar com o seu império colonial. Em Espanha, o regime de Franco aproximava-se das suas últimas horas mas, ao contrário dos portugueses, os espanhóis não tinham prestado muita atenção à questão do Sahara Ocidental (então a 53.ª província espanhola), até que o rei Hassan II de Marrocos decidiu desencadear a "Marcha Verde ", fazendo saber assim ao mundo a sua intenção de assumir o controlo do território.

1999: Referendo de autodeterminação em Timor-Leste

Um mês após a "Marcha Verde", em Dezembro de 1975, do outro lado do mundo, os timorenses viram como o seu processo de autodeterminação parecia liquidado pela invasão do território pelas forças armadas da Indonésia. A comunidade internacional não pareceu dar demasiada importância àquela ação. A Guerra Fria orientava os interesses dos líderes de ambos os lados, que procuravam ganhar o apoio dos novos territórios independentes que nasciam. Essa rivalidade mostrou a sua face mais sangrenta nas guerras civis em Angola e Moçambique e que acabaram por envolver países vizinhos, como a África do Sul ou o Congo, e outros tão distantes como Cuba.

Neste contexto, não é difícil imaginar que o controle pela Indonésia de Timor-Leste, e do Sahara por Marrocos e pela Mauritânia (que depressa abandonaria as suas pretensões) fosse interpretado mais como um alívio do que como uma complicação. No entanto, tanto Timor-Leste, tal como o Sahara, permaneceram como exemplos de violação das regras do direito internacional público sobre aquilo que as potências mundiais, com as Nações Unidas como farol orientador, tinham construído a realidade do sistema internacional.

Independência vs. Factos consumados

Neste jogo de paralelismos históricos, 1991 marcou o segundo marco na evolução dos destinos do Sahara Ocidental e de Timor-Leste. No primeiro caso, Marrocos e a Frente Polisario assinaram um acordo de paz que pôs fim aos combates armados que duravam desde 1976. No segundo caso, a matança pelo exército indonésio de mais de 200 pessoas a 12 de novembro no Cemitério de Santa Cruz, em Díli desencadeou os acontecimentos que marcariam o seu destino. O massacre colocou Timor na agenda da política internacional. 


Os mortos e desaparecidos aumentaram a pressão e o interesse mundial crescente sobre o que ali se passava. O que, até então, tinha sido considerado um conflito esquecido voltou às primeiras páginas de todos os jornais. As atrocidades do exército indonésio ganharam destaque quando os media internacionais decidiram concentrar a sua atenção naquela pequena ilha do sudeste asiático. As críticas sobre Jacarta aumentaram, atos de protestos tiveram lugar em vários países, como na Austrália (até então defensora ferrenha das teses indonésias) e em Portugal, a antiga potência colonial, gerou-se uma mobilização social como nunca antes tinha acontecido até então. Em 1996, dois líderes da luta pela independência, José Ramos Horta e o bispo Ximenes Belo ganharam o Prémio Nobel da Paz, no que foi um reconhecimento da sua luta e um revés para as intenções de Jacarta.

Timor finalmente acedeu à sua independência em 1999, quando 80% da população votou pela autodeterminação, ingressando, em 2002, na Organização das Nações Unidas como Estado soberano. Uma viagem não sem escolhos, com reações violentas das fações residentes pró-indonésias e com a dificuldade acrescida de recenseamento e se chegar a acordo sobre a população com direito a votar.

O mesmo ponto parece intransponível nos diálogos estabelecidos entre Marrocos e a Frente Polisario. No entanto, e apesar da descrença de muitos e a crítica de outros tantos, Timor é um exemplo da eficiência do trabalho das Nações Unidas.

Os saharauis aguardam há 37 anos
a possibilidade de escolher o seu destino

O Sahara Ocidental espera e ambiciona ainda por essa autodeterminação. O conflito torna-se ciclicamente num dos principais obstáculos nas relações entre Marrocos (potência ocupante ainda) e Espanha. O reconhecimento, há poucos dias, pelo Parlamento Sueco, sobre a necessidade da via da estabilidade para o contencioso e para a população saharauis que se arrasta há 35 anos, colocou-o, temporariamente, sob os holofotes da atenção mundial. Ainda assim, poucos prenunciam uma resolução do conflito em 2012 e, quem sabe, se mesmo na década em que vivemos. A presença de Marrocos no Conselho de Segurança das Nações Unidas como membro não-permanente para o período 2012-2013 não constitui certamente uma ajuda para os defensores do povo da autodeterminação do povo saharaui. Isso, apesar de Marrocos ter votado positivamente a favor da candidatura da Palestina como Estado Membro Observador na ONU no passado dia 29 de novembro.

Comunicado da família Dambar no 2º aniversário do assassinato de Said



Hoje, 22 de dezembro de 2012, cumprem-se dois anos do assassinato indiscriminado do Mártir Saharaui SAID DAMBAR às mãos da polícia marroquina. Um assassinato cobarde que ceifou a sua juventude (26 anos) deixando atrás de si uma família destroçada. Uma mão assassina que apertou um gatilho e apagou a luz de um jovem e lançou para a desgraça toda uma família. Que depois de pedir explicações iniciou um terrível calvário que ainda perdura.

O governo marroquino, longe de aclarar o sucedido, limitou-se a enviar os seus verdugos (agentes sem escrúpulos) à casa da família Dambar, cujos membros foram agredidos no seu próprio domicílio apenas porque pediram explicações sobre o sucedido. Agrediram toda a família, irmãs, mãe, pai, de 85 anos, e todas as pessoas que nesse momento dramático lhes prestavam os seus pêsames. Destruíram a casa e as agressões foram inumanas e de uma enorme selvajaria. Um assalto a uma casa de uma família humilde e indefesa cujo único delito foi preguntar pelo seu filho assassinado.

Este é o “modus operandi” de um governo invasor e criminoso que despreza o ser humano. O pai de SAID faleceu após muito sofrimento e ao ver com os seus olhos como assaltavam a sua casa e batiam na sua família com uma agressividade totalmente desproporcionada. À família é-lhe recusado trabalho, é acossada permanentemente, ameaçada por todos os meios que não são poucos, já que falamos de um governo com todos os meios de repressão ao seu alcance.

Esto é um triste exemplo do sofrimento indescritível que padece o povo Saharaui nas zonas ocupadas, enquanto o mundo vira os olhos para outro lado, um povo que está sendo literalmente massacrado sem que por ele nada se fala. Para que acabe a construção dos milhares de fogos para colonos marroquinos nas zonas ocupadas.

Marrocos aproveita-se da nossa caraterística de povo pacífico para fazer uma limpeza étnica. O povo sofre em silêncio e sem mais testemunhos que o seu próprio sofrer.

O corpo do Mártir SAID DAMBAR foi retirado ilegalmente da morgue do hospital e desconhece-se o lugar para onde foi levado pelas autoridades marroquinas. A sua família não lhe pode dar uma sepultura digna.

Pedimos uma investigação internacional neutral e a proteção da população Saharaui, ante este role de atropelos e atrocidades inqualificáveis. Fazemos um apelo desesperado ao mundo, antes que seja demasiado tarde.

Fazemos um apelo à Comunidade Internacional, às Organizações Defensoras dos Direitos Humanos, ao Tribunal Internacional de Haia, à O.N.U, à União Europeia e a todas as Instâncias Internacionais que intercedam junto do governo marroquino para que este ponha fim ao sofrimento do povo saharaui.

Pedimos à MINURSO um papel mais ativo como força de proteção da O.N.U que, até agora, tem sido passivo e simplesmente presencial.

a) Que os responsáveis das torturas, desaparecimentos forçados, assassinatos se sentem no banco dos réus do Tribunal de HAIA, com todas as garantias, e respondam por crimes contra a humanidade.

b) A proteção dos defensores dos direitos humanos nas zonas ocupadas do SAHARA OCIDENTAL.

c) A proteção da família DAMBAR.

d) Saber do paradeiro de todos os presos de consciência.

e) A realização de um referendo de autodeterminação, segundo o acordado no cessar-fogo de 1991. Que se cumpra a legalidade internacional.

f) O boicote à compra das riquezas espoliadas do Sahara Ocidental, incluindo o pescado, os fosfatos, os produtos agrícolas, etc…

Queremos, para finalizar, agradecer de todo o coração a solidariedade de todas as Organizações, Instituições, pessoas, ao Espaço Sahara Lanzarote e ao povo canário irmão que nos acolheu de braços abertos durante estes 37 anos de exílio involuntário fora da nossa terra e separados da nossa família e da terra que nos viu nascer. A nossa desgraça é a vergonha da comunidade internacional.

A nossa arma é a PALAVRA LIBERTADE.

BASTA DE MAIS GENOCÍDIO CONTRA o POVO INDEFESO.

MUITO OBRIGADO DE TODO O CORAÇÃO EM NOME DO POVO SAHARAUI.

Mohamed Daddach, Prémio Rafto dos Direitos Humanos, objeto de insultos e humilhação por parte de militares marroquinos em El Aaiun



No 2º Aniversário do assassinato do jovem saharaui Said Dambar, o aparelho repressivo marroquino continua a acossar a população e a intimidar os defensores de direitos humanos saharauis em El Aaiun.

Segundo a Rede Mazrat da cidade ocupada de El Aaiún, as forças marroquinas deslocaram um forte dispositivo de dezenas de polícias marroquinas e forças auxiliares para a frente do domicílio da família do jovem saharaui assassinado pela polícia marroquina em 2010.

As forças deslocadas fecharam algumas das ruas que conduzem ao domicílio dos Dambar para impedir que cidadãos saharauis chegam à sua casa e possam participar na homenagem a Said Dambar.

Sidi Mohamed Daddach, prestigiado ativista dos Direitos Humanos, o ex-preso político que mais anos passou no cárcere em toda a África a seguir a Nelson Mandela, Prémio Rafto dos DDHH, e presidente do Comité de Defesa da Livre Determinação do Povo do Sahara Ocidental declarou à Rede Maizira que agentes marroquinos vestidos à paisana e uniformizados o haviam agredido e a um grupo de ativistas com insultos humilhantes e palavras degradantes quando tentavam se acercar do domicílio da família de Said Dambar para informar-se da situação.

Na mesma tarde uma multidão de cidadãos saharauis organizaram frente à estação de gasolina Ljanchi uma manifestação para exigir a livre determinação do povo saharaui, entoando lemas políticos em que pediam a independência, e manifestavam a sua solidariedade com a família do mártir  Said Dambar.

Nesta situação de levantamentos contra a ocupação marroquina em diferentes bairros da cidade gritaram-se palavras-de-ordem a favor da independência, arvoraram-se bandeiras saharauis em edifícios e grafitaram-se muros e paredes com consignas contra a ocupação apesar do assédio dos serviços de segurança marroquinos.

Segundo a Rede Maizirat a população saharaui prepara-se para sair hoje, sábado, de forma massiva às ruas para apoiar a família do mártir Said Dambar dois anos após o seu assassinato.

Fonte: Rede Rede Maizirat e Poemario Por un Sahara Libre

O jovem Said Dambar foi assassinado há dois anos - Aminatou Haidar fala da sua morte




 "as vítimas saharauis não são passivas, lutamos para desafiar a impunidade das forças de segurança marroquinas".
  
Após o ataque e a destruição do acampamento de Gdeim Izik, durante a madrugada do dia 8 de novembre de 2010, grupos de jovens saharauis tiveram uma reação espontânea de raiva, impotência e ira sem precedentes na história do Sahara Ocidental. “É verdade que se produziu uma resposta violenta, com muitos incidentes, contra todo aquilo que representava o Estado marroquino, não só em El Aaiún, mas em muitas outras cidades do Sahara ocupado, mas era uma resposta provocada pela frustração que acumula o meu povo contra a arbitrariedade com que actuaram os marroquinos no Acampamento da Dignidade”, afirma Aminetu Haidar, a mais destacada e conhecida ativista defensora dos Direitos Humanos da causa saharaui.

Marrocos ordenou então toda um drástico role de medidas de força e opressão contra a população saharaui, argumentando a necessidade de “travar a escalada de extrema violência” que se estava produzindo na capital do Sahara Ocidental. As invasões e buscas de domicílios, as detenções arbitrárias, a introdução de um toque de recolher a partir das 19 horas, as tortura, agressões e espancamentos por parte da polícia marroquina e militares estavam na ordem do dia. Houve muitas vítimas de diferentes características, mas o caso mais chocante e dantesco foi o do jovem Said Dambar,  de 26 anos, que foi baleado na cabeça por um polícia no dia 22 de dezembro de 2010, durante o toque de recolher em El Aaiún.

Como relatam responsáveis do Centro RFK no livro "El Oasis de la Memoria", "às 3 da manhã do dia 22 de dezembro, a polícia chegou à casa dos seus pais pedindo os seus documentos de identidade, alegando que ele tinha batido num polícia. Na altura, a polícia não informou a família que ele já estava morto, nem que o seu corpo estava sob custódia policial.

Em vez disso, foram informados de que Said tinha uma lesão no braço e que estava no hospital a receber tratamento. A família Dambar esperou várias horas no hospital, sem saber se ele estava vivo ou morto. A 23 de dezembro, Said Dambar foi oficialmente declarado morto e a família pôde apenas ver a sua cabeça: tinha um ferimento de bala no centro da testa. A família recebeu relatos contraditórios sobre o que aconteceu em 22 de dezembro. "

Cumprem-se dois anos desde o seu assassinato e e família Dambar não teve ainda acesso à sua história clínica, porque o hospital Bem El Mehdi Ben não lho entregou. E também não poderá vir a saber saber as circunstâncias da morte de Said, uma vez que, em junho passado, as autoridades marroquinas invadiram a casa da mãe de Sai Dambar, Jira Ahmed Embarek, para lhe entregar um documento emitido em 04/06/2012/ pelo Gabinete do Procurador Geral do Rei e do Tribunal de Apelações, informando que os restos mortais de Said foram enterrados a 9 de janeiro de 2012.

O pai de Said, falecido em agosto de 2011, não chegou
a ver feita justiça sobre o assassinato do seu filho... 

O caso de Said Dambar é um desafio ao Coletivo de Direitos Humanos dos Saharauis (CODESA), cujo máximo responsável é a própria Haidar. Ela refere que "depois de 17 meses de espera com o corpo de Said no necrotério do hospital, à espera de que se fizesse a autópsia, a família recebe uma visita em que se lhes informa que, em menos de uma hora, o corpo seria enterrado. Sem tempo para reagir, a mãe de Said Dambar recusou-se expressamente a assinar a ordem de consentimento, porque ainda não tinha sido feita a autópsia. "

De acordo com Aminatou , "as informações são muito contraditórias e, se as coisas continuam assim, não creio que se venha a saber a verdade. Os marroquinos dizem que o sepultaram em janeiro, depois que ele seria enterrado naquele dia de junho, tendo fechado o cemitério Jat Eramla e o rodeado muito a polícia e presença militar. Ninguém sabe o que realmente aconteceu, nem onde ele está enterrado, nem quem é responsável último por esta barbaridade, mas é necessário que se abra uma investigação exaustiva para determinar os factos deste assassinato, que continua impune, porque o polícia marroquino julgado foi protegido pelo próprio sistema, onde são os executores dos saharauis que fazem investigações dos casos denunciados e, entre eles, nunca se acusam de nada."

Desde o CODESA, Aminatou Haidar lançou uma enérgica mensagem de repulsa e condenação pelo assassinato de Said Dambar, assegurando que "a história das violações dos direitos humanos no Sahara Ocidental foi e está sendo ocultada de uma maneira consciente e instrumentada, porque está sujeita a um absoluto bloqueio informativo. Por isso, a ativista diz categoricamente que "as vítimas saharauis não são passivas, estamos em luta para desafiar a impunidade das forças de segurança marroquinas. Abrimos vários caminhos no âmbito da investigação. Principalmente exigimos que se chega até ao fim na averiguação da verdade no caso de Said Dambar e no de tantos outros mártires, desaparecidos ou presos políticos, bem como se localizem os responsáveis ​​e que estes sejam levados a julgamento; que as vítimas e suas família tenham justiça, o reconhecimento do dano lhes foi causado e a restituição dos seus bens".

Fonte: © Elisa Pavón

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Entrevista à Dra. Lehdia Mohamed Dafa - Presidente do SAHARA MEDICAL

A Dra. Lehdia Mohamed Dafa (ao centro) 
com duas colegas da direção do SAHARA MEDICAL

FUTURO SAHARAUI : Como surgiu a ideia de fundar uma Associação de médicos saharauis em Espanha?

A ideia de continuar a ajudar a população saharaui nos acampamentos de refugiados está na mente de todos os profissionais saharauis da diáspora. Encontrar fórmulas para prosseguir nessa ajuda sempre esteve no cerne de todas os debates fossem eles oficiais, como a tentativa que fez o anterior ministro da Saúde no ano de 2007 ou informais, como na reunião que tivemos vários médicos saharauis em finais de 2009 e que seria o ponto de partida para a organização do Sahara Medical.

FUTURO SAHARAUI : Receberam algum tipo de apoio por parte do ministério da Saúde saharaui?

Antes de responder, gostaria de esclarecer que SaharaMedical é uma organização totalmente independente e não-governamental constituída e registada em Espanha, que surge da convicção de que, embora tenhamos decidimos emigrar, não queremos perder a ligação com o nosso povo e sentimos a obrigação moral de continuar ajudando, de levar a assistência médica, de compartilhar conhecimentos com os nossos companheiros nos acampamentos e de defender o direito à saúde da população saharaui. Somos uma parte do que se designa por sociedade civil e a nossa filosofia é ajudar a partir do compromisso, mas também a partir da total independência do Ministério ou de qualquer outra instituição.
Com o anterior ministro da saúde pública, Sidahmed Tiyeb (Beri) tivemos várias conversas relacionadas com a necessidade de que os médicos na diáspora estivessem ligados aos acampamentos e que pudessem ajudar a população. Em determinado momento, recebemos uma carta escrita pelo seu punho dirigida mim pessoalmente, onde o ministro pedia ajuda urgente para organizar e animar os companheiros nos acampamentos para fazer frente à preocupante situação sanitária aí prevalecente. Esse foi, talvez, o tiro de partida para organizar Sahara Medical. Constituída a Associação, convidámos o Ministério, dirigido já pelo atual ministro, para participar no nosso primeiro ato público: as 1ªs Jornadas científicas e solidárias de Médicos Saharauis em Espanha, que organizámos em maio de 2012, em Madrid. Embora o ministro não tenha assistido, alguns dos seus colaboradores responderam de forma positiva participando nas jornadas, o que é de agradecer naturalmente.

Acampamentos de refugiados perto de Tindouf (Sudoeste argelino)

FUTURO SAHARAUI : Estiveram recentemente nos acampamentos, poderia dizer-nos qual foi a vossa atividade nesse período?

Sahara Medical é uma ONGD bastante jovem, temos apenas um ano de vida e, no entanto, levados pelo nosso desejo de ajudar, realizámos já vários projetos. Além da organização dessas primeiras jornadas científico-solidárias de médicos saharauis em Espanha, que constituiu uma experiência de grande êxito em termos de aprendizagem mútua entre saharauis e espanhóis ligados ao mundo da Cooperação sanitária, e de ter participado no Congresso da Associação de Médicos Árabes na Europa (ARABMED), realizado em Madrid, em outubro de 2011, promovemos nos acampamentos um Curso de Farmácia para Cuidados Primários na nossa Língua, o Hassania, a todo o pessoal ligado à farmácia dos dispensários, hospitais regionais e do hospital nacional, uma experiência pioneira, já que, até então, a formação era dada normalmente por estrangeiros com tradutores nem sempre profissionais o que levava a que se perdesse grande parte da informação. Enviámos também três comissões médicas mistas constituídas por voluntários espanhóis e saharauis entre médicos especialistas e enfermeiras, ação que decorreu entre setembro  e novembro. Estas comissões atenderam a mais de 3.000 pessoas nas wilayas de El Aaiún e Smara.

FUTURO SAHARAUI :  Hoje em dia contam-se pelos dedos da mão os médicos que ficaram nos acampamentos. Há alguma iniciativa ou medida no futuro para restringir a emigração dos médicos?

Estamos conscientes de que a situação sanitária nos acampamentos é cada dia mais precária, e que quaisquer esforços que se façam serão insuficientes frente a tanta necessidade. Não sabemos quais são as iniciativas do Ministério para travar a saída maciça dos profissionais dos acampamentos, já para não falar nos estímulos a dar para o seu retorno ou à forma em que, pelo menos, possam temporariamente prestar ali os seus serviços, mas a presença de quase 200 médicos saharauis em Espanha é uma realidade que faz parte do drama que vive o nosso povo. De nada serve fazer juízos de valor em relação à questão, trata-se de adotar medidas eficazes para que os nossos compatriotas nos acampamentos, e fora deles, recebam toda a assistência médica de que precisam. Sahara Medical nestes meses demonstrou que os médicos saharauis podem organizar comissões médicas aos acampamentos e recolher apoios para melhorar a saúde dos nossos irmãos. Iniciativas como esta são as que julgamos que há que apoiar e fomentar.

Medico Pediatra nos acampamentos

FUTURO SAHARAUI: Como ONG pensaram em prestar algum tipo de ajuda a algum dos casos de doentes mais graves que estão em Espanha?

Entre os nossos objetivos, expressos nos estatutos, está o de levar assistência médica e defender o direito à saúde da população saharaui, onde quer que esteja. Estamos evidentemente dispostos a ajudar os pacientes que estão em Espanha na medida das nossas possibilidades e, de facto, alguns de nós já o tem o feito a título individual. E também gostaríamos de chegar à população nas zonas ocupadas, mas onde cremos que o nosso trabalho é insubstituível é, neste momento, nos acampamentos.

FUTURO SAHARAUI :  Pensaram em ampliar a associação aos médicos e pessoal sanitário em geral que está fora de Espanha?

Estamos abertos a colaborar com todas as pessoas, profissionais da saúde e da cooperação que compartilhem os nossos objetivos, tanto dentro como fora de Espanha. Procuramos ter uma importante presença nas redes sociais para que qualquer pessoa que queira colaborar possa pôr-se em contato connosco.

FUTURO SAHARAUI : Que projetos têm para o futuro?

Gostaríamos de continuar a enviar comissões médicas aos acampamentos enquanto persistir a escassez de médicos e encontremos colaboração necessária, tanto lá, como aqui em Espanha. Pensamos também que a formação e atualização de conhecimentos dos companheiros sanitários e farmacêuticos locais é uma área onde podemos realizar um trabalho eficaz e, por último, não descartamos a possibilidade de desenvolver projetos de educação para a saúde e de sensibilização para a população que, numa situação como a que se vive nos acampamentos, pode ter uma incidência importante. Neste momento estamos esperando que o Ministério da Saúde Pública, nos dê via verde para prosseguir o nosso trabalho.

مرسلة بواسطة futurosahara في quinta-feira, dezembro 20, 2012

Espanha empenhada em acelerar o espólio no Sahara Ocidental

Miguel Arias Cañete, ministro espanhol da Agricultura, 
Alimentação e Meio Ambiente,
Sobre o espólio das riquezas que o Sahara Ocidental possui escreve-se muito pouco nos meios de Comunicação espanhóis mas, como diz uma colaboradora, “o ministro Arias Cañete volta de novo às andanças com o tema da pesca no Sahara”. E é verdade, o site http://www.FishElsewhere.eu, afirma que o ministro espanhol da Agricultura, Alimentação e Meio Ambiente, Miguel Arias Cañete, está a pressionar a Comissária Europeia da Pesca, Maria Damanaki, para que “acelere o processo de renovação do acordo de pesca entre a UE e Marrocos”.

Arias Cañete — comenta a mesma fonte — “pretende usar o dinheiro dos europeus para espoliar ilegalmente a pesca em águas do Sahara Ocidental ocupado”.

Por outro lado, a Europa Press afirma que o ministro Cañete “pediu à Comissária da Pesca, Maria Damanaki, que negoceie com “celeridade” um novo acordo pesqueiro com Marrocos que permita à frota espanhola voltar a fainar na região. O ministro não especifica a que “região” se refere nem tão pouco faz alguma menção sobra a necessidade de excluir as águas do Sahara Ocidental do acordo. Este foi um dos motivos pelos quais o Parlamento Europeu recusou em dezembro de 2011 a prorrogação do acordo que estava em vigor”.

Nas declarações que proferiu, o ministro espanhol faz referência às ajudas recebidas pela frota pesqueira espanhola, indicando que “As ajudas por paralisação têm um prazo de seis meses, prorrogável por outros seis, e não existe (mais) possibilidade de nova prorrogação. Porém, outro dos motivos da decisão do Parlamento Europeu de não prorrogar o acordo foi o seu péssimo resultado económico, segundo revelaram diversos relatórios elaborados a pedido da UE”.

A Comissária da Pesca da UE, Maria Damanaki

Javier García Lachica, Presidente da WSRW (Western Sahara Resources Watch) em Espanha, declarou que “a UE e todos os seus Estados Membros, Espanha incluída, deveriam trabalhar para a paz internacional, apoiando os esforços da ONU para negociar uma solução para o conflito. Neste sentido, qualquer movimento do ministério espanhol para concluir o acordo de pescas UE-Marrocos, sem considerar os desejos e interesses do povo saharaui, sabota diretamente os esforços de paz da ONU e envia uma mensagem de apoio às reivindicações anexionistas de Marrocos sobre o Sahara Ocidental ".