terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Gilles Perrault (*): «A França é cúmplice pela perpetuação de um regime inaceitável em Marrocos»



 Em alocução proferida numa sessão de solidariedade com os presos políticos e de opinião, organizada pela Associação de Defesa dos Direitos Humanos há alguns dias em Marrocos, o autor do livro “Notre Ami le Roi”, Gilles Perrault, afirmou que os presos políticos estão na primeira linha face à repressão que o Makhzen utiliza, desde sempre, contra todo aquele que ouse levantar a voz contra o rei.

«Os presos políticos estão na parte mais difícil dessa frente. Eles são vítimas da repressão. O pior é o sentimento de solidão. E saber que há quem se preocupe com eles, que se interessa por eles e que os defende, mesmo estando longe, é fundamental para os presos e para as suas famílias », afirmou o autor. Enquanto membro da campanha de apadrinhamento dos presos políticos em Marrocos, o escritor francês insistiu na necessidade de prosseguir e ampliar esta campanha pois o combate não terminou.

Temos de prosseguir esta campanha e levá-la por diante, e se possível expandi-la porque a luta continua ", disse, lamentando ver apagar-se a esperança suscitada pela entronização de Mohamed VI após a morte de Hassan II. «Que desilusões após a morte de Hassan II. As esperanças que suscitara a chegada do seu filho. É verdade que não há a repressão de outrora, o inferno hassaniano ; os desaparecimentos, a tortura à escala industrial, a morte. É verdade que já não é isso, mas não é a democracia ! Há ainda repressão, e o número de presos políticos não cessa de aumentar.»

Citando a frase tirada da célebre obra Le guépard : «É preciso que algo mude para que tudo fique na mesma», Gilles Perrault afirmou que em Marrocos, «quiseram dar a impressão que tudo ia mudar para que no fundo nada mudasse». Para o escritor, é preciso continuar o combate e não desesperar, pois um dia, tudo acabará por «rachar e ceder». «Marrocos é uma caldeira com tensões sociais. Um fosso que não pára de se aprofundar entre os muito ricos que são cada vez mais ricos e os pobres que nunca foram tão pobres. Isto não pode continuar por muito mais tempo», assegurou, questionando-se sobre de que serve uma Constituição quando o poder é detido por um punhado de homens.

Perrault incitou os cidadãos, em particular os franceses, a serem solidários, pois, segundo ele, a França «tem muito que se arrepender e a reprovar neste perpetuação de um regime inaceitável em Marrocos ». Lamentou que, em França, já não haja «diferença» entre os governos de direita e os governos de esquerda. «Que as pessoas de direita digam o nosso amigo o rei, não é de estranhar, e direi mesmo que é do seu interesse; mas que governos de esquerda digam quase a mesma coisa e não se insurjam contra as violações e as agressões aos direitos humanos em Marrocos, isso não é aceitável», denunciou.

Durante muito tempo proibido de entrar em Marrocos por ter denunciado as torturas praticadas pelo rei Hassan II, Gilles Perrault conclui com uma ponta de ironia ao declarar: « Hassan II não teria tido a coragem de organizar um fórum sobre os direitos humanos em Marraquexe. Isso, ele não teria feito!»

Mohamed El-Ghazi Algérie Patriotique



(*) Gilles Perrault é um advogado, escritor, jornalista e historiador francês que geralmente aborda temas políticos da relação do ocidente com outras regiões e culturas. Entre as muitas obras que escreveu, destaque para “L'Orchestre Rouge” (“A Orquestra Vermelha”, Fayard, 1967) sobre a história da espionagem soviética na Europa durante a II Guerra Mundial.

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