Os wikileaks do Makhzen constituem o golpe
mais duro sofrido pela diplomacia e o serviço secreto exterior marroquino em
toda a sua historia. Desde o princípio se suscitou a questão: quem está por detrás
de "Chris Coleman"?
A resposta continua sem ser conhecida. O que se sabe, sim, é que em dois meses
o regime marroquino deu já duas respostas diferentes... o que constitui a melhor
prova de que o Makhzen está completamente à mercê da divulgação dos documentos
de Coleman. @Desdelatlantico
Autor: Carlos Ruiz Miguel, pro. Catedrático
de Direito Constitucional na Universidade de Santiago de Compostela
I.
PRIMEIRA REAÇÃO DO MAKHZEN: ACUSAÇÃO CONTRA A FRANÇA
Neste blog num determinado momento fiz-me, pontualmente,
eco da primeira reação do Makhzen sobre as GRAVÍSSIMAS (repito, GRAVÍSSIMAS)
revelações do "Wikileaks do Makhzen" que, insisto de novo, são o maior
golpe sofrido pela diplomacia e o serviço secreto do Makhzen EM TODA A SUA HISTÓRIA.
Por isso mesmo chama a atenção o silêncio de tanto "perito" sobre
Marrocos (jornalista, analista ou professor) em relação a este assunto.
As revelações de "Chris Coleman"
iniciaram-se a 3 de outubro. No dia 10 de outubro publiquei neste blog a primeira
análise publicada em todo o mundo sobre este assunto. Repito-o com legítimo
orgulho: O primeiro. No mundo.
No dia 11 de outubro (um dia depois da
publicação do meu artigo sobre os "wikileaks do Makhzen"), o ministro
dos Negócios Estrangeiros marroquino, Salaheddín Mezzuar, teve um aparecimento público
onde, extraordinariamente nervoso, e sem citar a França, a acusava tácita, mas claramente,
pela visita da policia à Embaixada de Marrocos em Paris para requerer a presença
do chefe da espionagem interna marroquina, Hammushi e — sem a citar —, da
revelação de documentos sobre a vida privada da sua secretária de Estado dos
Negócios Estrangeiros (que foi feita, precisamente, pelos wikileaks do Makhzen).
Mas se a acusação do dia 11 não tinha sido
suficientemente clara, no dia 16 de outubro, o diário digital "Le
360" que, como já comentámos, é o diário oficioso do núcleo duro do Makhzen
(e
ao qual me referi neste blog na sequência da "advertência" que fez a Espanha
de um novo 11-M) publica um importante artigo, assinado (como o anterior
sobre o 11-M) por Mohamed Chakir Alaoui entitulado "France-Maroc: je
t'aime, moi non plus" cuja primeira frase já é todo um anúncio de intenções
Assim, num primeiro momento (11 a 16 de outubro),
o Makhzen acusou, claramente, a França de ser a responsável pela divulgação destes
"wikileaks do Makhzen".
II.
SEGUNDA REAÇÃO: ACUSAÇÃO CONTRA A ARGÉLIA
Após o surgimento dos "wikileaks do Makhzen",
o regime marroquino tentou por todos os meios silenciar "Chris
Coleman". Sem êxito. Coleman utilizou diversas plataformas para compartilhar
arquivos através das quais difundiu até ao dia de hoje qualquer coisa como mais
de mil documentos secretos. Marrocos conseguia desativar os links mediante os
quais esses documentos se tornavam acessíveis ao público (mediante o pagamento
de dinheiro, segundo "Coleman"). Mas "Coleman" continuou a encontrar
novos meios para prosseguir a difusão dos seus documentos. O resultado é que o
Makhzen se encontra, na sua vertente externa (diplomática e secreta) desarvorado.
O "Makhzen exterior" é um navio à deriva cujo rumo já não fixado pelo
seu timoneiro mas sim pelas correntes de documentos de Coleman.
Neste contexto de DESESPERO é possível entender
que o mesmo ministro de Negócios Estrangeiros marroquinos que a 11 de outubro
acusava a França... dois meses depois acuse a Argélia.
Com efeito, numa comparência ante a Câmara de
senadores da tirania alauita a 11 de dezembro, o MNE marroquino, Salaheddín
Mezzuar, acusou os serviços secretos argelinos de estarem por detrás da fuga, segundo
informou o digital marroquino "Yabiladi".
III.
QUEM ESTÁ POR DETRÁS DAS REVELAÇÕES DOS DOCUMENTOS?
O desejo de saber quem é "Chris
Coleman" levou alguns a procurar averiguá-lo caindo no ridículo. Porque a
tentativa, sem ir mais longe, de um serviço secreto muito, muito, muito perto
de nós se aproximar de "Coleman" (tentativa não muito bem dissimulado,
diria eu), quando o Makhzen o assediava desativando as suas redes de distribuição
tem sido, com todo o respeito, algo patético.
Um meio digital marroquino perseguido pelo regime,
"Demain" publicou a 4 de dezembro uma interessante análise sobre a questão
que só está disponível na "cache" de Google pois o serviço secreto
marroquino hakeou (pela enésima vez) este diário digital que é o meio que mais
se fez eco deste escândalo em Marrocos. Afirma-se
no artigo:
duas ou
três coisas são seguras agora (... Coleman) não se encontra em Marrocos. Seguramente
não está só. Preparou o seu golpe há muito tempo e, finalmente, os documentos não
são falsificações. Não foram manipulados como querem fazer crer alguns
colaboradores dos serviços secretos. Porque, se tivessem sido manipulados, Marrocos
teria tido oportunidade de denunciar esta grosseira falsificação.
A partir deste análise do "Demain"
podem-se discutir algumas questões.
Primeiro.
É muito provável que "Chris
Coleman" não seja UMA pessoa (um hacker individual) mas sim várias pessoas
e, mais provavelmente, UM SERVIÇO SECRETO.
Segundo.
É muito provável que este golpe tenha sido
preparado desde há muito, mas desde há quanto tempo? O "dies a quo" é
importante para determinar a eventual autoria.
Terceiro.
É difícil pôr em dúvida que os documentos não
sejam autênticos. São patéticos, quando não bastante desavergonhados os
intentos de alguns "especialistas" de desacreditar estes
"wikileaks do Makhzen" com o argumento de que "misturam"
documentos "verdadeiros e falsos". Este intento apenas procura criar
confusão.
Na verdade, não é surpreendente que esta
tentativa de confundir venha... da França. Esta foi a tentativa falhada do jornalista
francês Jean-Marc Manach a 27 de outubro e depois do "France
24" a 8 de dezembro.
Quarto.
É uma possibilidade que "Coleman"
esteja fora de Marrocos, mas eu não excluiria que possa estar dentro.
Quem está por detrás de Coleman então?
Em minha opinião há três elementos que há que
tomar em consideração.
Em primeiro lugar,
As divulgações de documentos destruíram o Ministério
dos Negócios Estrangeiros e o serviço secreto exterior, MAS NÃO afetaram os assuntos
de corrupção do secretário do rei nem dos serviços secretos internos. Tampouco parece
terem afetado o Exército, ainda que alguns documentos filtrados se refiram à compra
e fabricação de armas.
Em segundo lugar,
Há que determinar QUEM tem capacidade para
conseguir "infiltrar" as comunicações do Makhzen.
Em terceiro lugar,
Convém saber PARA QUE política ou para que desígnio
pode ter utilidade a filtração destes documentos.
Em minha opinião, parece-me que por detrás de
"Chris Coleman"
1º. se encontra "alguém" que ou é
externo a Marrocos ou não tem interesse em destruir TODO o regime;
2º. "alguém" com capacidade
tecnológica para penetrar em todas as comunicações do Makhzen;
3º. "alguém" que não está de acordo
com a política externa do Makhzen no assunto do Sahara Ocidental que é objeto
de, talvez, 90% dos documentos filtrados.
Em minha opinião, a leitura dos documentos filtrados
por "Coleman" leva claramente identificar estas três circunstâncias.
ARTÍGOS DESTA SÉRIE
- Wikileaks del majzen (IV): ¿quien está
detrás de "Chris Coleman"? (13-XII-2014)
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