sábado, 13 de dezembro de 2014

Wikileaks do Makhzen (IV): quem está por detrás de "Chris Coleman"?




Os wikileaks do Makhzen constituem o golpe mais duro sofrido pela diplomacia e o serviço secreto exterior marroquino em toda a sua historia. Desde o princípio se suscitou a questão: quem está por detrás de "Chris Coleman"? A resposta continua sem ser conhecida. O que se sabe, sim, é que em dois meses o regime marroquino deu já duas respostas diferentes... o que constitui a melhor prova de que o Makhzen está completamente à mercê da divulgação dos documentos de Coleman. @Desdelatlantico

Autor: Carlos Ruiz Miguel, pro. Catedrático de Direito Constitucional na Universidade de Santiago de Compostela


I. PRIMEIRA REAÇÃO DO MAKHZEN: ACUSAÇÃO CONTRA A FRANÇA

Neste blog num determinado momento fiz-me, pontualmente, eco da primeira reação do Makhzen sobre as GRAVÍSSIMAS (repito, GRAVÍSSIMAS) revelações do "Wikileaks do Makhzen" que, insisto de novo, são o maior golpe sofrido pela diplomacia e o serviço secreto do Makhzen EM TODA A SUA HISTÓRIA. Por isso mesmo chama a atenção o silêncio de tanto "perito" sobre Marrocos (jornalista, analista ou professor) em relação a este assunto.

As revelações de "Chris Coleman" iniciaram-se a 3 de outubro. No dia 10 de outubro publiquei neste blog a primeira análise publicada em todo o mundo sobre este assunto. Repito-o com legítimo orgulho: O primeiro. No mundo.

No dia 11 de outubro (um dia depois da publicação do meu artigo sobre os "wikileaks do Makhzen"), o ministro dos Negócios Estrangeiros marroquino, Salaheddín Mezzuar, teve um aparecimento público onde, extraordinariamente nervoso, e sem citar a França, a acusava tácita, mas claramente, pela visita da policia à Embaixada de Marrocos em Paris para requerer a presença do chefe da espionagem interna marroquina, Hammushi e — sem a citar —, da revelação de documentos sobre a vida privada da sua secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros (que foi feita, precisamente, pelos wikileaks do Makhzen).
Mas se a acusação do dia 11 não tinha sido suficientemente clara, no dia 16 de outubro, o diário digital "Le 360" que, como já comentámos, é o diário oficioso do núcleo duro do Makhzen (e ao qual me referi neste blog na sequência da "advertência" que fez a Espanha de um novo 11-M) publica um importante artigo, assinado (como o anterior sobre o 11-M) por Mohamed Chakir Alaoui entitulado "France-Maroc: je t'aime, moi non plus" cuja primeira frase já é todo um anúncio de intenções

Assim, num primeiro momento (11 a 16 de outubro), o Makhzen acusou, claramente, a França de ser a responsável pela divulgação destes "wikileaks do Makhzen".


II. SEGUNDA REAÇÃO: ACUSAÇÃO CONTRA A ARGÉLIA

Após o surgimento dos "wikileaks do Makhzen", o regime marroquino tentou por todos os meios silenciar "Chris Coleman". Sem êxito. Coleman utilizou diversas plataformas para compartilhar arquivos através das quais difundiu até ao dia de hoje qualquer coisa como mais de mil documentos secretos. Marrocos conseguia desativar os links mediante os quais esses documentos se tornavam acessíveis ao público (mediante o pagamento de dinheiro, segundo "Coleman"). Mas "Coleman" continuou a encontrar novos meios para prosseguir a difusão dos seus documentos. O resultado é que o Makhzen se encontra, na sua vertente externa (diplomática e secreta) desarvorado. O "Makhzen exterior" é um navio à deriva cujo rumo já não fixado pelo seu timoneiro mas sim pelas correntes de documentos de Coleman.
Neste contexto de DESESPERO é possível entender que o mesmo ministro de Negócios Estrangeiros marroquinos que a 11 de outubro acusava a França... dois meses depois acuse a Argélia.
Com efeito, numa comparência ante a Câmara de senadores da tirania alauita a 11 de dezembro, o MNE marroquino, Salaheddín Mezzuar, acusou os serviços secretos argelinos de estarem por detrás da fuga, segundo informou o digital marroquino "Yabiladi".


III. QUEM ESTÁ POR DETRÁS DAS REVELAÇÕES DOS DOCUMENTOS?

O desejo de saber quem é "Chris Coleman" levou alguns a procurar averiguá-lo caindo no ridículo. Porque a tentativa, sem ir mais longe, de um serviço secreto muito, muito, muito perto de nós se aproximar de "Coleman" (tentativa não muito bem dissimulado, diria eu), quando o Makhzen o assediava desativando as suas redes de distribuição tem sido, com todo o respeito, algo patético.
Um meio digital marroquino perseguido pelo regime, "Demain" publicou a 4 de dezembro uma interessante análise sobre a questão que só está disponível na "cache" de Google pois o serviço secreto marroquino hakeou (pela enésima vez) este diário digital que é o meio que mais se fez eco deste escândalo em Marrocos. Afirma-se no artigo:

duas ou três coisas são seguras agora (... Coleman) não se encontra em Marrocos. Seguramente não está só. Preparou o seu golpe há muito tempo e, finalmente, os documentos não são falsificações. Não foram manipulados como querem fazer crer alguns colaboradores dos serviços secretos. Porque, se tivessem sido manipulados, Marrocos teria tido oportunidade de denunciar esta grosseira falsificação.

A partir deste análise do "Demain" podem-se discutir algumas questões.

Primeiro.
É muito provável que "Chris Coleman" não seja UMA pessoa (um hacker individual) mas sim várias pessoas e, mais provavelmente, UM SERVIÇO SECRETO.

Segundo.
É muito provável que este golpe tenha sido preparado desde há muito, mas desde há quanto tempo? O "dies a quo" é importante para determinar a eventual autoria.

Terceiro.
É difícil pôr em dúvida que os documentos não sejam autênticos. São patéticos, quando não bastante desavergonhados os intentos de alguns "especialistas" de desacreditar estes "wikileaks do Makhzen" com o argumento de que "misturam" documentos "verdadeiros e falsos". Este intento apenas procura criar confusão.
Na verdade, não é surpreendente que esta tentativa de confundir venha... da França. Esta foi a tentativa falhada do jornalista francês Jean-Marc Manach a 27 de outubro e depois do "France 24" a 8 de dezembro.

Quarto.
É uma possibilidade que "Coleman" esteja fora de Marrocos, mas eu não excluiria que possa estar dentro.

Quem está por detrás de Coleman então?

Em minha opinião há três elementos que há que tomar em consideração.

Em primeiro lugar,
As divulgações de documentos destruíram o Ministério dos Negócios Estrangeiros e o serviço secreto exterior, MAS NÃO afetaram os assuntos de corrupção do secretário do rei nem dos serviços secretos internos. Tampouco parece terem afetado o Exército, ainda que alguns documentos filtrados se refiram à compra e fabricação de armas.

Em segundo lugar,
Há que determinar QUEM tem capacidade para conseguir "infiltrar" as comunicações do Makhzen.

Em terceiro lugar,
Convém saber PARA QUE política ou para que desígnio pode ter utilidade a filtração destes documentos.

Em minha opinião, parece-me que por detrás de "Chris Coleman"

1º. se encontra "alguém" que ou é externo a Marrocos ou não tem interesse em destruir TODO o regime;

2º. "alguém" com capacidade tecnológica para penetrar em todas as comunicações do Makhzen;

3º. "alguém" que não está de acordo com a política externa do Makhzen no assunto do Sahara Ocidental que é objeto de, talvez, 90% dos documentos filtrados.

Em minha opinião, a leitura dos documentos filtrados por "Coleman" leva claramente identificar estas três circunstâncias.

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- Wikileaks del majzen (IV): ¿quien está detrás de "Chris Coleman"? (13-XII-2014)





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