quinta-feira, 5 de março de 2015

Empresa encontra petróleo no Sahara Ocidental: Questões que se colocam



Não há mais qualquer dúvida. No Sahara Ocidental há petróleo. A empresa Kosmos colocou fim à dúvida, embora tenha anunciado que, por enquanto, não o vai explorar. Mas há motivos para questionar não só a legalidade da presença da referida empresa no Sahara Ocidental ocupado, mas também a veracidade de suas declarações que, além disso, deixam aberta a porta à abertura de um novo poço @ Desdelatlantico



I. KOSMOS ENERGY ANUNCIA QUE HÁ HIDROCARBUNETOS NO SAHARA OCIDENTAL... MAS DIZ QUE RENUNCIA A EXPLORÁ-LOS (PELO MENOS DE MOMENTO)
A empresa Kosmos Energy, conjuntamente com a empresa estatal marroquina ONHYM (25%) e com a Capricorn (subsidiária da Cairn Energy PLC (20%), possui uma autorização de exploração na costa central do Sahara Ocidental ocupado. Uma autorização atribuída pelas autoridades de ocupação.
No dia 2 de março, a empresa Kosmos Energy difundiu uma informação, reproduzida em vários meios especializados do setor, segunda a qual

“the CB-1 exploration well located in the Cap Boujdour permit area offshore Western Sahara encountered hydrocarbons. The well penetrated approximately 14 meters of net gas and condensate pay in clastic reservoirs over a gross hydrocarbon bearing interval of approximately 500 meters.”

TRADUÇÃO
No poço exploratório CB-1 localizado na zona autorizada do cabo Bojador no offshore do Sahara Ocidental foram encontrados hidrocarbonetos. O poço penetrou cerca de 14 metros numa rede de gás e estrato condensado em reservatórios clásticos ao longo de uma extensão de aproximadamente 500 metros que contem hidrocarbonetos.

No entanto, logo acrescenta:

“The discovery is non-commercial, and the well will be plugged and abandoned”.

TRADUÇÃO

A descoberta não é comercial e o poço será selado e abandonado

Mesmo assim, Kosmos deixa claro que os resultados SÃO IMPORTANTES porque

“this first well in the basin has significantly de-risked further exploration by demonstrating a working petroleum system (...)
The well results confirm the substantial exploration potential of our 22,000 square kilometer Cap Boujdour block, (...)
Going forward, the key exploration challenge is finding reservoirs of commercial size and quality. We will analyze the information gathered from CB-1 and integrate it with the additional 3D seismic data we recently acquired to refine our exploration plan, including deciding on the location and timing of a potential second well (...)”

TRADUÇÃO
Este primeiro poço na bacia eliminou de forma significativa o risco de futuras explorações, ao demonstrar a existência de um sistema petrolífero(...)
Os resultados também confirmam o substancial potencial de exploração dos nossos 22.000 km2 do bloco do Cabo Bojador (...)
Daqui para frente, o principal desafio exploratório é encontrar depósitos de tamanho e qualidade comerciais. Analisaremos as informações recolhidas no CB-1 e confrontá-las-emos com os dados sísmicos 3D adicionais que adquirimos recentemente para afinar o nosso plano de exploração, inclusive para decidir quanto à localização e ao momento de um potencial segundo poço (...)


II. KOSMOS ATUA ILEGALMENTE NO SAHARA OCIDENTAL
Embora a empresa Kosmos pretenda, cinicamente, dar a entender que as suas atividades são legais, o parecer do Secretário adjunto para os Assuntos Jurídicos das Nações Unidas, emitido a 29 de janeiro de 2002 a pedido do presidente do Conselho de Segurança, é absolutamente claro:

Atividades de perfuração e exploração, a serem levado a cabo sem atender aos INTERESSES E DESEJOS DO POVO DO SAHARA OCIDENTAL, infringiriam os princípios jurídicos internacionais aplicáveis às atividades relacionadas com os recursos minerais nos Territórios não autónomos (maiúsculas minhas)

Mas se o texto não fosse suficientemente claro, Hans Corell, o jurista que emitiu o parecer e a voz mais autorizada para o interpretar, deixou bem claro que a atividade da Kosmos é ilegal.

É evidente que o POVO DO SAHARA OCIDENTAL não foi consultado, nem diretamente, nem através dos seus representantes internacionalmente reconhecidos (a Frente Polisario) sobre os seus DESEJOS em relação a esta exploração.
E isso para não falar em que medida essa exploração pode beneficiar os INTERESSES do POVO DO SAHARA OCIDENTAL



III. QUESTÕES GRAVES QUE COLOCA O ANÚNCIO DA KOSMOS ENERGY
A declaração da Kosmos coloca várias interrogações.

Primeiro: é credível a declaração da Kosmos?
A primeira pergunta é se uma empresa que, cinicamente, diz que atua em conformidade com o parecer das Nações Unidas (apesar de ser evidente que não) é credível nas suas demais afirmações sobre o Sahara Ocidental.

Por que devemos acreditar que, SIM, encontrou hidrocarbonetos?
Por que havemos de acreditar que — se for verdade que, SIM, encontraram hidrocarbonetos —, eles NÃO sejam economicamente viáveis?

Há uma razão evidente para duvidar da sinceridade da Kosmos.
Em janeiro de 2015, a Frente Polisario pediu ao Conselho de Segurança que parasse com as atividades da Kosmos. Dentro de umas semanas, será apresentado o relatório sobre o Sahara Ocidental do Secretário-Geral ao Conselho de Segurança e, em finais de abril, o Conselho de Segurança pronunciar-se-á sobre a questão do Sahara Ocidental.
É evidente que AGORA é o pior momento possível para anunciar uma EXPLORAÇÃO dos hidrocarbonetos do Sahara Ocidental. Daí que haja motivos para duvidar da sinceridade da Kosmos.

Segundo: por que razão a Kosmos não oferece os dados que possui às Nações Unidas, responsável do Território Não Autónomo do Sahara Ocidental?
A má-fé da empresa Kosmos prova-se desde o momento em que não põe nas mãos das Nações Unidas, ainda que fosse sob garantia de confidencialidade, os dados que possui sobre os hidrocarbonetos no Sahara Ocidental.


Estas perguntas são tanto mais pertinentes quanto, como se viu, a Kosmos não oculta a sua intenção de proceder à abertura de um segundo poço com vista a eventual exploração dos hidrocarbonetos do Sahara Ocidental.

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