quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Tribunal exclui Sahara Ocidental de acordos de comércio entre UE e Marrocos




Tribunal de Justiça da União Europeia decidiu que não se aplicam ao Sahara Ocidental os acordos de liberalização estabelecidos entre a UE e Marrocos. O Sahara Ocidental não é o deserto de Marrocos. 

Por Né Eme

Foi conhecido a 13 de setembro que o Tribunal de Justiça da União Europeia decidiu que “a Decisão 2012/497/UE do Conselho, de 8 de março de 2012, relativa à celebração do Acordo sob forma de Troca de Cartas entre a União Europeia e o Reino de Marrocos respeitante às medidas de liberalização recíprocas em matéria de produtos agrícolas, de produtos agrícolas transformados, de peixe e de produtos da pesca, à substituição dos Protocolos n.os 1, 2 e 3 e seus anexos e às alterações do Acordo Euro-Mediterrânico que cria uma Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados-Membros, por um lado, e o Reino de Marrocos, por outro, é anulada na parte em que aprova a aplicação do referido acordo ao Sahara Ocidental”. (acórdão do tribunal)

Um contundente golpe para a União Europeia, e para farsa jurídica que representam os acordos com Marrocos, que incluem trocas comerciais em grande, parte à custa do espólio, dos recursos naturais do Sahara Ocidental.

O advogado-geral, Melchior Wathelet, conclui que "nem o acordo de associação UE-Marrocos nem o acordo UE-Marrocos relativo à liberalização das trocas comerciais recíprocas de produtos agrícolas e da pesca se aplicam ao Sahara Ocidental" e propõe que "por conseguinte, ao Tribunal de Justiça que anule o acórdão do Tribunal Geral que declarou que estes acordos se aplicam ao referido território".

Caem assim por terra os acordos agrícolas e de pesca assinados entre Bruxelas e Rabat, e que abrangem o Sahara Ocidental.

Sublinha o Dr. Wathelet que a "União e os seus Estados-Membros nunca reconheceram que o Sahara Ocidental fazia parte de Marrocos ou que estava sujeito à sua soberania."

Trabalhos de casa mal feitos?

Aquando da decisão (2012/497/UE), o advogado- geral Melchior Wathelet, "em especial, o Tribunal Geral considerou que o Conselho não tinha cumprido a sua obrigação de analisar, antes da celebração deste acordo, se não havia indícios de uma exploração dos recursos naturais do território do Sahara Ocidental, sob controlo de Marrocos, susceptível de ser feita em detrimento dos seus habitantes e de prejudicar os direitos fundamentais destes", porque "(...)o Conselho deveria ter tomado em conta a situação dos direitos humanos neste território e o impacto potencial do acordo nessa situação."

Muito embora tenhamos ainda que aguardar dois meses pela decisão final do recurso interposto, as relações entre Marrocos e a UE ficam mais tensas e a R.A.S.D. (Republica Árabe Saharaui Democrática) ganha esta batalha jurídica - "o seu a seu dono".

Apraz-me fazer aqui uma consideração pessoal, mas que considero bastante pertinente. Obviamente que não sou nenhuma "expert" em matéria de Direito Internacional, contudo nestas conclusões o advogado- geral, refere:

"Com efeito, a Frente Polisario é reconhecida pela comunidade internacional apenas como representante do povo do Sahara Ocidental no processo político destinado a resolver a questão da autodeterminação do povo desse território e não como tendo por missão defender os interesses comerciais deste povo. Acresce que a Frente Polisario não parece ser um representante exclusivo do povo do Sahara Ocidental nas relações internacionais, uma vez que não está excluído que a Espanha, antiga colonizadora deste território ainda tenha responsabilidades a este respeito".

Na verdade, a Frente Polisario é a única representante legítima do povo do Sahara Ocidental, reconhecida conforme resolução 34/37 das Nações Unidas na questão do Sahara Ocidental (http://www.umdraiga.com/), povo esse atraiçoado por Espanha que, ao não cumprir o seu papel na descolonização, teria sem mais delongas e rapidamente que emendar o seu erro e entregar definitivamente o Sahara Ocidental ao seu povo, expulsando Marrocos. A Frente Polisario não serve apenas os propósitos dos Saharauis na "busca de uma solução justa e duradoura para a paz na questão do Sahara Ocidental" mas também para atuar em todos os sentidos cenários desde que esses interfiram com os interesses dos Saharauis.


In ESQUERDA.net

domingo, 18 de setembro de 2016

ONU propõe-se controlar em exclusivo zona no sul do Sahara face à crise




A ONU propôs a Marrocos e à Frente Polisario ocupar-se em exclusivo do controlo de uma zona do sul do Sahara Ocidental a fim de baixar a tensão gerada pelo início das obras de asfaltamento por parte de Rabat de uma estrada, informou sexta-feira um porta-voz do SG da ONU. Mas a tensão não pára de aumentar, e a Polisario enviou tanques de comate

Trata-se, explicou o porta-voz Stephane Dujarric, de uma proposta da missão das Nações Unidas na zona (MINURSO), que inclui “a retirada pelas duas partes de todos os elementos armados”.
 “A Minurso manteria a presença exclusiva na área”, explicou Dujarric, que deixou claro que toda a ação empreendida pela missão será levada a cabo com a aceitação das partes e do Conselho de Segurança.

As Nações Unidas, recordou, procura assegurar que se mantenha a paz na zona e que não haja um regresso às hostilidades.

Esta crise no extremo sul do Sahara Ocidental teve início em meados de agosto, quando o Governo marroquino anunciou uma “operação de limpeza” na zona como o alegado objetivo de combater “o contrabando e o tráfico ilegal de drogas e armas”, uma ação denunciada pela Polisario como uma violação do cessar-fogo e que respondeu com uma mobilização de efetivos.
Além disso, Rabat iniciou pouco depois trabalhos de asfaltamento de uma estrada na zona, entre o seu posto aduaneiro de Guerguerat e a fronteira mauritana, para lá do muro defensivo marroquino e dentro da chamada “zona tapão”, uma área que a organização saharaui considera “territórios libertados”.

A Frente Polisario solicitou às Nações Unidas que tome medidas para parar com essas essas obras e deixou claro que não aceitará essa pretensão por parte de Marrocos.

“Fica claro que Marrocos está tentando de novo impor um facto consumado, ignorando não só as suas obrigações sob o cessar-fogo, como a posição adotada no passado pela ONU em relação a outra tentativa de construção de estrada”, referiu o representante saharaui junto das Nações Unidas, Ahmed Bukhari.

Segundo a Polisario, a ONU estaria a considerar construir e financiar ela própria a finalização da estrad com o objetivo de baixar a tensão entre as duas partes.

A organização não prestou até agora qualquer informação a este respeito, ainda que Dujarric tenha ido mais longe e tenha firmado que “a estrada é um instrumento de paz” e que não vai contra o interesse de uma da partes....

Em finais de agosto, o secretario-geral da ONU, Ban Ki-moon, instou a que se mantivesse o “statu quo” na zona e pediu a Marrocos e à Frente Polisario a retirada de todos os elementos armados.

O Conselho de Segurança também já analizou a crise, mas por agora oficialmente manteve o silêncio.
(Fonte: EFE)

Zona sul do Sahara Ocidental - Foto de A. Zeinedine El Confidencial Saharaui

Exército Saharaui envia carros de combate e uma unidade especial para a região de El Guerguerat.


O exército saharaui enviou há dias tanques de guerra e uma unidade de forças especiais do seu Exército para a região de El Guerguerat a fim de reforçar as suas tropas deslocadas para aí desde o passado dia 28 de agosto, segundo informou uma fonte do ministério da Defesa saharaui.
Segundo fontes conhecedoras das operações terão sido enviados tanques do tipo T-250 de fabricação russa, pertencentes às tropas terrestres do exército dela libertação saharaui (ELPS).
Segundo a mesma fonte, as forças especiais que acompanham os tanques têm a missão de proteger as instalações e os equipamentos militares saharauis nas bases provisórias na região.
Este anúncio tem lugar depois de fontes da ONU terem informado sobre a difícil situação na zona, propondo controlar ela própria a região para evitar o enfrentamento bélico entre a Frente Polisario e Marrocos.
O exército saharaui lançou a 28 de agosto a sua primeira operação em muitos anos contra posições do exército marroquino no sul do Sahara Ocidental depois de Marrocos ter violado o cessar-fogo, deslocando as sus tropas para lá do muro, tendo algumas horas depois da operação terem chegado veículos e blindados da MINURSO.
A ofensiva marroquina, realizada pelas forças reais de Marrocos e da gendarmaria, deixou preocupada a comunidade internacional, que criticaram a ação criticado alegando que “Marrocos tinha violado o cessar-fogo”.
No passado dia 14 de agosto teve lugar uma ofensiva militar marroquina que culminou com a tomada dessa região, considerada chave para o comércio dos saharauis com a Mauritânia. Este território está sob controlo da Missão das Nações Unidas para o Referendo do Sahara Ocidental (MINURSO) desde 1992.
Dezenas de soldados marroquinos, apoiados por carros de combate e veículos militares blindados participaram na operação. Algumas escavadoras foram deslocadas para o local com o objetivo, segundo fontes locais, de construir fortificações para estabelecer uma base.

Bir Lehlu. - 18/9/2016 – Fonte: El Confidencial Saharaui.

Ban Ki-moon reconhece o fracasso da MINURSO no seu mais recente relatório




Ban Ki-moon apresentou quarta-feira desta semana um relatório sobre o Sahara Ocidental e a Palestina.
O secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, revelou num novo relatório sobre a questão saharaui divulgado na passada quarta-feira que o seu enviado pessoal para o Sahara Ocidental, Christopher Ross, comentou aos membros do Conselho de Segurança da ONU a gravidade da situação no sul do Sahara Ocidental como consequência da situação de estagnação e do fracasso atual em alcançar uma solução para a questão do Sahara Ocidental.

O relatório, divulgado a 14 de setembro, enfatiza na entrada a importância da negociação sem condições prévias e de maneira diplomática também insta as partes, Frente Polisario e Marrocos, a superar as suas próprias propostas através da procura de novas soluções inovadoras que ajudem a encontrar uma “solução política mutuamente aceitável, que conduza o povo saharaui à autodeterminação”.

O secretário-geral da ONU reconhece o fracasso da Missão das Nações Unidas para o Referendo do Sahara Ocidental (MINURSO) que foi criada pela resolução 690 (1991) do Conselho de Segurança a 29 de abril de 1991, de acordo com as propostas de resolução, tal como foram aceites a 30 de agosto de 1988 por Marrocos e a Frente Popular para a Libertação do Saguía el-Hamra e Rio de Ouro (Frente Polisario).

Depois da assinatura do cessar-fogo, as Nações Unidas enviaram uma missão designada MINURSO para supervisionar o processo para organizar um referendo de autodeterminação no Sahara Ocidental.

O mandato original da MINURSO era:

– Supervisionar o cessar fogo;

– Verificar a redução de tropas de Marrocos no Território;

– Supervisionar o acantonamento das tropas de Marrocos e da Frente Polisario aos lugares assinalados;

– Tomar medidas com as partes para assegurar a libertação de todos os presos políticos ou detidos do Sahara Ocidental;

– Supervisionar a trova de prisioneiros de guerra (Comité Internacional da Cruz Vermelha);

– Concretizar o programa de repatriação (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados);

– Identificar e registrar as pessoas com direito a voto;

– Organizar e assegurar a realização de um referendo livre e justo, e dar a conhecer os resultados.

Ainda que a organização do referendo ainda não tenha sido possível até à data, o secretário-geral da ONU reconhece o fracasso da missão por não efetuar o papel para que foi criada.

O relatório do secretário-geral da ONU adverte que na terceira comissão das Nações Unidas que se realizará nas próximas semanas se discutirá o tema “da perda de confiança na procura de uma solução para o conflito saharaui-marroquino poderá empurrar os jovens nos acampamentos de refugiados a procurar alternativas como o regresso às armas”.

Ban Ki-moon afirma no seu relatório que o Conselho de Segurança da ONU aborda a questão do Sahara Ocidental como uma questão relacionada com a paz e a segurança.

A Quarta Comissão da Assembleia Geral, a direção da Comissão de Política Especial de Descolonização e a MINURSO concluem de forma unânime que com a aplicação da Declaração Sobre a Concessão da Independência a Países e Povo coloniais, a questão do Sahara Ocidental é uma questão de descolonização.

O secretário-geral da ONU destaca que já chegou o momento para alentar as partes a comprometerem-se seriamente com o processo de negociação, destacando que o conflito do Sahara Ocidental poderia levar a região à exposição de um sério risco extremadamente real.
Reiterou que teve que visitar a região (os acampamentos de refugiados saharauis e territórios libertados) para dar um novo impulso ao processo de negociação, afirma Ban no relatório.

O SG da ONU afirma que a visita também serviu como expressão do compromisso pessoal do secretário-geral e a sua participação instando a a que se mostre mais vontade política, para assim se voltar quanto antes à mesa das negociações.

Fonte: El Confidencial Saharaui


sábado, 17 de setembro de 2016

Sahara Ocidental é o segundo país africano com maior taxa de alfabetização




Sahara Ocidental - 16/9/16 - El Confidencial Saharaui – O Sahara Ocidental tornou-se o segundo país mais alfabetizado do continente africano a seguir à Serra Leoa. Os peritos da UNESCO admiram o trabalho dos líderes saharauis em fomentar e impulsionar a educação em condições tão difíceis.

Segundo dados da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) os acampamentos de refugiados saharauis possuem uma alfabetização de 96%. Uma cifra incrivelmente elevada e que no continente africano é apenas superada pela Serra Leoa, que conta com uma taxa de alfabetização de 99%.

Os peritos da organização da ONU referem que no início da invasão marroquina do Sahara Ocidental, em 1975, a taxa de alfabetização não ultrapassava 25% da população. Por isso enaltecem a vontade dos saharauis em aprender apesar das adversidades. Embora reconheçam que não é o primeiro caso de um povo expulso da sua terra e em plena guerra, conseguir um feito dessa dimensão, a Autoridade Palestina também a conseguiu em 2009.


A taxa de alfabetização do Sahara Ocidental é de 96%, a qual se encontra muito acima de outros países como Marrocos, cuja taxa se situa nos 70,1 %, Egipto com 66,4% ou a Tunísia com 77,7%.

terça-feira, 6 de setembro de 2016

Governo saharaui pede à ONU que acelere a aplicação do Plano de Resolução e o respeito do cessar-fogo




Bir Lehlu (Zonas Libertadas), 06/09/2016 (SPS)- O governo da República Árabe Saharaui Democrática (RASD) pediu ontem ao Conselho de Segurança das Nações Unidas que aplique “o Plano de Resolução acordado há mais de vinte cinco anos, com o fim de impor a justiça e os princípios da legalidade internacional e, desta maneira, impor as medidas de pressão necessárias para que o regime de ocupação marroquino respeite os seus compromissos internacionais”.

Em comunicado tornado público por ocasião do vigésimo aniversário da assinatura do acordo do cessar-fogo, o governo saharaui exigiu também que se apliquem “as medidas necessárias consistentes com o estipulado no acordo de cessar-fogo firmado em 1991 entre as partes do conflito, a Frente Polisario e o Reino de Marrocos, condenando a flagrante violação marroquina dos termos do referido acordo na zona de El Guergarat, no sul do Sahara Ocidental”.

“O povo saharaui e seu único e legítimo representante, a Frente Polisario, não podem permanecer calados ante a continuidade das políticas de escalada e provocação marroquinas”, acrescenta o comunicado.


Neste sentido, o governo da RASD enfatiza “a necessidade de que as Nações Unidas e a comunidade internacional assumam as suas responsabilidades de concluir o processo de descolonização inacabado na última colónia africana, destacando que a ocupação ilegal marroquina de zonas da República Saharaui apenas impede o estabelecimento de uma paz duradoura e estimula as políticas marroquinas de inundar a região com as suas drogas, financiando as organizações do crime organizado e espalhando as sementes da discórdia, o terrorismo e a destruição”.

Delegação da Frente Polisario na Festa do Avante!




Durante os 3 duas da 40ª edição da “Festa do Avante”, a delegação do Sahara Ocidental manteve um programa intenso a nível político e de clarificação da situação atual.

Além das mais de 50 delegações estrangeiras, participaram na festa centenas de milhares de visitantes de Portugal e de outros países europeus.


A delegação saharaui era liderada pelo delegado da Frente Polisario em Portugal, Ahamed Fal Enhamed, por Omar Hassan e Ahmed Dahan da UJSARIO (União de Jovens Saharauis) e Sidi Mohamed Balla, membro da AFRAPREDESA  (Associação Saharaui de familiares dos Presos Políticos e vítimas de desaparecimentos forçados), que participaram em numerosas atividades, reuniões com partidos e organizações, atos de solidariedade e contactaram com centenas de visitantes no stand do Sahara Ocidental na “Cidade Internacional” no recinto da festa.

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Invasão marroquina na região de Guerguerat, o “Perejil” do Sahara Ocidental


A 11 de Agosto de 2016 produziu-se o incidente militar mais grave no Sahara Ocidental desde 6 de Setembro de 1991 [data de entrada do cessar-fogo]. É verdadeiramente escandaloso que a imprensa de Espanha, potência administrante do Sahara Ocidental, tenha silenciado (com as únicas exceções de Elena González em “Onda Cero” e Isaac J. Martín do "El Mundo" hoje mesmo) esta violação flagrante dos acordos militares firmados por Marrocos e a Frente Polisario juntamente com as Nações Unidas. A invasão por forças militares marroquinas da região para lá do muro divisório ao sul de Guerguerat, no sudoeste do Sahara Ocidental, tem lugar perto da localidade saharaui mais meridional do território, La Güera, lugar em torno do qual se gerou grande tensão nos últimos dois anos. Este facto tem um profundo significado que requer uma adequada análise @Desdelatlantico.


I. O ESTATUTO DE "LA GÜERA" E DO "KANDAHAR" SAHARAUI
Como já recordei neste blog, La Güera é um território que 1) Marrocos reconheceu , ante o Tribunal Internacional de Justiça, que NUNCA fez  parte do seu territorio; 2)  Marrocos num tratado bilateral de 1976 reiterou que La Güera não faz parte do seu territorio; e, finalmente, 3) La Güera é um territorio que se encontra fora das zonas de restrição militar acordadas por Marruecos e a Frente Polisario ante as Nações Unidas.
Não acontece o mesmo com o denominado "Kandahar" saharaui que é a zona que se encontra entre Guerguerat (onde se localiza o posto de controlo marroquino mais a sudoeste do Sahara Ocidental ocupado) e a fronteira internacionalmente reconhecida entre o Sahara Ocidental e a Mauritânia. A esta zona se aplicam as notas 1) e 2) que dissemos para La Güera, mas não a 3) pois esta zona se encontra regida pelo "Acordo Militar número 1", firmado em 1997 por Marrocos e a Frente Polisario que estabelece várias restrições e entre elas a proibição de que as tropas dos dois lados opositores ultrapassem o muro de divisão.


II. A TENSÃO EM TORNO DE LA GÜERA, DESDE JANEIRO DE 2015
O meu blog foi, não sei se a única, mas seguramente a primeira publicação espanhola que se fez eco do artigo de uma publicação independente, "Futuro Saharaui", a qual em 11 de Janeiro de 2015 afirmou que tropas saharauis tinham tomado o controlo, pela primeira vez desde 1975, da localidade de La Güera, no extremo sul do Sahara Ocidental.
O acontecimento tinha um significado político evidente pois La Güera é o único porto (embora hoje inutilizado) do Sahara O que não está sob ocupação marroquina.
A Frente Polisario desmentiu as informações da "Futuro Saharaui" que, no entanto, a mim me foram confirmadas por fontes figedignas. O que ocorreu exatamente em janeiro de 2015 não o sabemos ainda hoje, mas é um facto que em dezembro de 2015, o presidente mauritano, Mohamed Ould Abdelaziz, recebeu em Nouakchott uma delegação marroquina de máximo nível composta pelo ministro dos Negócios Estrangeiros (Salaheddin Mezuar), o chefe da espionagem exterior (Yasín Mansuri) e o general responsável pelo exército de ocupação do Sahara Ocidental (Bushaib Arrub).
Nesse momento especulou-se sobre o verdadeiro motivo daquele encuentro, mas hoje sabe-se, com segurança, que o objeto fundamental do encontro foi tratar da questão La Güera.
A 8 de janeiro de 2016 uma publicação argelina, "Algérie Patriotique", forneceu importantes revelações. Segundo esta publicação, confirma-se verdadeiro que tenha havido unidades militares saharauis em La Güera, com a complacência mauritana, e frente às pressões marroquíes, a Mauritânia içou a sua bandeira em La Güera, o que suscitou enorme irritação em Rabat.


III. REVESES DIPLOMÁTICOS MARROQUINOS NA EUROPA, ÁFRICA E NAÇÕES UNIDAS
Não é possível entender o que se está a pasar se não tomamos em conta que a diplomacia marroquina sofreu vários reveses neste último ano:
- Revés na União Europeia com a sentença de 10 de Dezembro de 2015 que anula a aplicação ao Sahara Ocidental do acordo entre a UE e Marrocos sobre liberalização de produtos agrícolas e pesqueiros.
- Revés na União Africana, onde a presidência da organização recusou prestar-se às manobras do Makhzen.
- Revés nas Nações Unidas, onde não só se desautorizou a expulsão unilateralmente decretada por Marrocos de membros da Missão das Nações Unidas para o Referendo no Sahara Ocidental (MINURSO), como teve lugar a mais dividida votação na história de todas as resoluções do Conselho de Segurança sobre o Sahara Ocidental.
A isto vem juntar-se o facto de a 1 de Agosto de 2016 o porta-voz do Secretário-Geral das Nações Unidas ter anunciado que o Enviado Pessoal do SG da ONU para o Sahara Ocidental, Christopher Ross, pensava reativar as negociações com uma "proposta formal".
É evidente que as opções diplomáticas para o expansionismo do Makhzen se esgotam. A única opção possível para quem se empenha em manter esse expansionismo é a militar. E essa foi a opção tomada pelo Makhzen.


IV. A INVASÃO MARROQUINA DE 11 DE AGOSTO, UMA DATA SIMBÓLICA
A 11 de Agosto de 2016 teve lugar a incursão de forças militares marroquinas na região denominada de "Kandahar" saharaui, para lá do muro divisório, violando flagrantemente o "Acordo Militar número 1".
Surpreende-me, e espanta-me, que nem uma só análise sobre a situação tenha examinado o simbolismo da data.
Foi num 11 de Agosto, mas de 1979, que teve lugar a segunda invasão marroquina do Sahara Ocidental. Nessa data, as tropas marroquinas entraram em Villa Cisneros (Dakhla), um território que o próprio Marrocos havia reconhecido ante o Tribunal Internacional de Justiça e num tratado bilateral com a Mauritânia que NÃO fazia parte de "Marrocos". Essa invasão, convém recordá-lo, foi condenada por várias resoluções da Assembleia Geral das Nações Unidas.
Que seja  11 de Agosto a data escolhida para esta nova invasão é TUDO MENOS CASUAL.





V. A CUMPLICIDADE COM MARROCOS DO PORTA-VOZ DO SG DA ONU POSTA EM EVIDÊNCIA POR "FUTURO SAHARAUI"
A invasão marroquina foi denunciada numa carta ao SG apresentada por Ahmed Bukhari, representante da Frente Polisario ante as Nações Unidas, cujo contúde pode ser lido num despacho da Inner City Press.
No entanto, de forma assombrosa, o porta-voz do SG da ONU, Farhan Haq, disse a 18 de Agosto que a MINURSO após uma investigação por terra e ar "não observou presença militar ou equipamentos na faixa-tampão " ("buffer strip").
Ante estas declarações a publicação independente "Futuro Saharaui" publicou, no dia seguinte, fotos e vídeos que demonstravam essa presença militar..
A cumplicidade de Farhan Haq ficou ainda mais em evidência quando a 28 de Agosto, o departamento de comunicação do SG da ONU emitiu um comunicado em que mostrava estar "profundamente preocupado" pela "tensa situação" resultante da infiltração de "unidades armadas" de "Marrocos" e da Frente Polisario.
Mas não disse Farhan Haq que não se havia observado presença militar marroquina?
O facto é que, como revelou Omar Slama num importante artigo, houve um comportamento da ONU e da MINURSO que, a não ser suspeito e cúmplice com o Makhzen marroquino, poderia ser qualificado de claramente deficiente na gestão deste grave incidente.


VI. "KANDAHAR", UM “PEREJIL” SAHARAUI
A invasão marroquina de "Kandahar" teve muitas similitudes com a invasão da ilhota de Perejil em Julho de 2002... e um final parecido para Rabat.
Também na invasão de Perejil, como na de Kandahar, foram utilizadas forças da Gendarmeria (forças que são militares). Também em Kandahar, como em Perejil, se tratava de um território sem forças militares presentes. Em Kandahar, como em Perejil, as forças do país soberano (Espanha em Perejil, a RASD em Kandahar) repeliram a agressão içando a sua bandeira no território que sofreu a invasão. E em Kandahar, como em Perejil, o conflito parece ter-se resolvido com uma intervenção de terceiros (EUA em Perejil, a MINURSO em Kandahar).
Com efeito, no momento em que escrevo estas linhas, a publicação "El Confidencial Saharaui" informa que foi garantido o "statu quo ante".
A intervenção militar que pôs fim à invasão de Kandahar foi um sucesso, que deve figurar no ativo do presidente saharaui, Brahim Gali.


NOTA
O site digital marroquino "Le Desk" publicou um amplo artigo sobre La Güera assinado por Christophe Guguen. O artigo em geral é aceitável, mas mas perde-se com informações objetivamente falsas como as relacionadas com a "recuperação" do Sahara Ocidental por Marrocos.
A documentação gráfica é também incorrecta, aunque hay alguna inexactitud, como la de un grabado antiguo que atribuyen a La Güera pero corresponde a Villa Cisneros.


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