O artigo publicado esta sexta-feira, 07 de novembro de 2025, pela Africa Intelligence – intitulado «Sahara Ocidental: le lobbying de Paris auprès des capitales européennes» e assinado pelo jornalista Jihâd Gillon – confirma o que já vínhamos denunciando em diferentes meios de comunicação: a França protagonizou uma intensa campanha de pressão diplomática para garantir que os países europeus representados no Conselho de Segurança votassem a favor da resolução 2797 (2025) sobre o Sahara Ocidental. A manobra, cujo objetivo central era blindar a menção do plano de autonomia marroquino no texto final, teve como alvo principal a Eslovénia, país que historicamente defende o princípio da autodeterminação devido à sua própria experiência histórica. Este caso ilustra claramente como os valores fundadores da União Europeia são sacrificados sem qualquer reparo quando se trata de proteger os interesses de um dos seus aliados estratégicos, Marrocos, mesmo à custa de violar princípios como a descolonização ou o direito à autodeterminação.
A reportagem constata que Paris desempenhou um papel fundamental como elo entre Washington e Rabat, assumindo a tarefa de superar as reticências da Dinamarca, Grécia e, sobretudo, da Eslovénia. Uma pressão que não só atuou nas capitais europeias, mas se estendeu ao próprio seio do Conselho de Segurança em Nova Iorque. Destaca-se especialmente a informação recolhida pela Africa Intelligence sobre os avisos franceses de um «possível desaparecimento da MINURSO» em caso de rejeição do texto, o que teria aberto caminho para os Estados Unidos imporem a sua estratégia unilateral e Marrocos o seu «facto consumado» no terreno. A sombra da chantagem paira sobre todo o processo, tornando-se uma estratégia de longo alcance com a qual Paris parece pretender transformar a ocupação num quadro internacionalmente aceitável.
A crónica revela ainda um dado inquietante e revelador: paralelamente a esta pressão diplomática, a França e Marrocos estão a trabalhar numa versão ampliada e «atualizada» do plano de autonomia marroquino, que Rabat pretende apresentar oficialmente a Staffan de Mistura este mês. Um documento «enriquecido» que pretende acrescentar novas camadas técnicas e políticas para conferir maior legitimidade ao que não passa de um projeto anexionista, concebido sem a participação do povo saharaui e contrário ao quadro jurídico internacional. Este plano, cujos primeiros traços remontam à visita oficial de Emmanuel Macron a Marrocos em outubro de 2024, inscreve-se numa estratégia claramente coordenada para normalizar a ocupação com a cumplicidade de certas potências ocidentais. É essencial salientar, tal como o texto o faz, que mesmo com este pacto de corredores, a delegação eslovena teve de o recordar no seu voto: «A Eslovénia continua a considerar o Sahara Ocidental como um território não autónomo». Uma declaração que revela que, apesar das pressões, nem todas as peças do tabuleiro estão alinhadas com o guião de Rabat.
Este episódio ilustra de forma incontestável como a resolução 2797 não foi o resultado de uma negociação multilateral transparente, mas sim de uma operação de lobby impulsionada por governos europeus cúmplices da pilhagem marroquina no Sahara Ocidental. A França, mais uma vez, confirma o seu papel como potência tutelar da monarquia marroquina, agindo contra os princípios do direito internacional que diz defender, enquanto utiliza as suas redes em Bruxelas, Paris e Nova Iorque para distorcer o quadro jurídico em benefício de uma agenda neocolonial. Perante este jogo de sombras, continua a ser urgente denunciá-lo, desativá-lo e voltar a colocar o foco onde ele deve estar: no direito do povo saharaui à autodeterminação, com base na legalidade internacional, nas resoluções da Assembleia Geral e nas sentenças do Tribunal Internacional de Justiça. E também lembrá-lo com uma verdade incómoda para muitos: que a Espanha continua a ser a potência administrante de jure do território e que, para além dos pactos energéticos e das manchetes interessadas, a descolonização continua pendente, e a responsabilidade é partilhada.

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