segunda-feira, 24 de junho de 2013

A fronteira das duas Coreias às portas da Europa

  

Começa a menos de 200 quilómetros a sudeste de Almeria. Com os seus 1.559 quilómetros, é a mais longa fronteira do mundo encerrada e assim vai estar por muito tempo. O Magrebe continuará a ter algo em comum com as duas Coreias ou com a Arménia e o Azerbaijão, cujas fronteiras estão hermeticamente seladas.
 
A Argélia acaba de colocar a Marrocos condições de difícil cumprimento para reabrir a sua fronteira comum que fechou há 19 anos, depois de Rabat ter imposto o visto aos argelinos que desejassem cruzá-la. Em 2005, Rabat suprimiu essa determinação, mas Argel manteve a fronteira fechada. Desde então, o escasso comércio entre os dois pesos pesados do Magrebe transita pelos portos de Valência, Algeciras ou Marselha.

Os marroquinos anseiam a reabertura dessa fronteira terrestre. Mas, para além do drama humano que o seu encerramento provoca, com famílias mistas separadas por uns poucos quilómetros que para se reunirem têm que pegar o avião, o seu fecho implica também um forte golpe económico. Em 1993, Marrocos acolheu dois milhões de turistas argelinos; em 2012, foram apenas 90.000; e todos entraram por via aérea.

Reunidos em Congresso em Saidia, uma localidade de veraneio perto da Argélia, os advogados de Marrocos reiteram, no passado dia 8 de junho, o pedido para a Argélia reabrir a fronteira. Encabeçados pelo Secretário-Geral da Ordem de Advogados Árabes, o libanês Omar Ezzine, promoveram uma manifestação até a beira do rio Kiss, que separa Saidia do povoado argelino de Marsat Ben Mehidi. Queriam deixar clara a sua reivindicação ao exército argelino que guarda a fronteira.

Onze dias depois, o ministério dos Negócios Estrangeiros da Argélia respondeu recusando a sua pretensão. Amar Belani, porta-voz da diplomacia argelina, colocou três condições para reabrir os postos fronteiriços.

A primeira é que Marrocos “deixe de denegrir a Argélia nos meios de comunicação, nas reuniões mundiais e ante personalidades internacionais”. Uma parte da imprensa marroquina reflete fielmente as posições das suas autoridades, mas outra goza de certa independência e fazendo uso dela critica Argel porque acredita que a Argélia se equivoca.

Deve Rabat censurar essa imprensa para agradar ao seu vizinho? Por que razão Argel não segue o exemplo censurando a sua própria imprensa quando arremete contra o vizinho marroquino e especialmente contra o rei Mohamed VI? A petição de Argel faz lembrar aquela que, uma vez, formulou Rabat ao Governo espanhol para que convencesse a imprensa a que deixasse de fazer críticas a Marrocos.

A segunda condição consiste, segundo Belani, em que Rabat desenvolva “uma cooperação sincera, eficaz, que gere resultados e acabe com a agressão quase diária que supõe a introdução de droga” oriunda de Marrocos. Argel pode ter queixas sobre a falta de colaboração do seu vizinho nesse e noutros aspetos, mas Rabat tem outros tantos motivos para estar desgostoso com a atuação argelina em vários âmbitos. A cooperação não funciona e até a ex-secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, o lamentou durante o seu périplo magrebino de 2008.

Marrocos deve, por último, “respeitar a posição argelina sobre o Sahara Ocidental que consideramos como um assunto pendente de descolonização que tem de ser resolvido acatando a legalidade internacional no âmbito da ONU”, segundo Belani.

Esta exigência argelina remonta a 1975, ano em que a Espanha entregou a sua colónia sahariana a Marrocos. A pesar disso Argel manteve durante 19 anos (1975-1994) a sua fronteira comum com Marrocos aberta. O que mudou para que agora ela permanece encerrada?

Os argumentos esgrimidos pela Argélia para recusar a abertura da fronteira escondem outros, de maior peso: a reabertura beneficiaria sobretudo Marrocos que receberia um aluvião de turistas argelinos – como recebe hoje em dia a Tunísia - desejosos de desfrutar de um ócio que não oferece o seu próprio país e comprar bens de consumo nem sempre disponíveis na Argélia.
  
Embora algo menos, os peritos asseguram que a Argélia também poderia ter benefício da reabertura que dinamizaria o conjunto do Magrebe acrescentando dois pontos ao seu crescimento anual. O pequeno tamanho dos seus diversos mercados dissuade, por vezes, o investidor estrangeiro. Levantar barreiras, avançar para a integração é o único caminho para o desenvolvimento.

"A estimativa do custo do encerramento da fronteira fica aquém: 2% de perda de crescimento é um cálculo frequentemente apontado para simplificar a discussão", diz Francis Ghilès, investigador do CIDOB (Centre for International Affaires of Barcelona). "Na verdade, acho que o encerramento da fronteira custa muito mais caro aos países do Magrebe”.


Artigo do jornalista do “EL PAIS” Ignacio Cembrero | 22 de junho de 2013

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