quinta-feira, 13 de novembro de 2014

A União Africana considera que Espanha continua a ser a potência administrante do Sahara



  • Assim o afirmou nas Nações Unidas Joaquim Chissano, seu representante para o território
 
Artigo de: Ignacio Cembrero - EL MUNDO 13-11-2014

"Para a União Africana, Espanha continua a ser a potência administrante do Sahara". Esta foi, até agora, a principal mensagem formulada por Joaquim Chissano que, em junho passado, foi nomeado enviado especial desta organização para a antiga colónia espanhola, e que reúne todos os países africanos (54) exceto Marrocos. Rabat recusa qualquer intervenção da UA no conflito do Sahara e por isso a abandonou em 1984.

Chissano, de 75 anos, foi o segundo presidente de Moçambique. É considerado como o político que, após anos de guerra civil e da ditadura, trouxe a democracia a essa ex-colónia de Portugal. Por isso goza de grande prestígio. Após a sua designação visitou a sede da ONU em Nova Iorque e as capitais do chamado Grupo de Amigos do Sahara Ocidental integrado por cinco países (EUA, Rússia, França, Reino Unido e Espanha).
Em Nova Iorque entrevistou-se, em finais de julho, com Jan Eliasson, vice-secretário geral das Nações Unidas. Além de lhe recordar o papel de Espanha, sublinhou que a sua tarefa consiste em pressionar Marrocos para que aceite a autodeterminação dos saharauis a que se opõe. [Marrocos] Oferece em troca uma autonomia para o território.
O embaixador marroquino junto da ONU, Omar Hilale, enviou a 22 de julho um telegrama confidencial a Rabat em que explica os pormenores de visita de Chissano a Nova Iorque. O documento foi desvendado, hoje, quinta-feira, pelo anónimo que, desde princípios de outubro, difunde através do Twitter documentos reservados da diplomacia e dos serviços secretos marroquinos.
Ainda que o telegrama de Hilale não o refira, Chissano desenvolve nessa declaração sobre Espanha a doutrina que o sueco Hans Corell, secretário-geral adjunto e chefe da Assessoria Jurídica da ONU, formulou em 2002 sobre as prospeções no subsolo do Sahara. Defendia então que Espanha continuava a ser a potência administrante do território, como também o afirmam os Acordos de Madrid de 1975, ainda que não possa exercer a sua autoridade porque o território está controlado por Marrocos.

Apesar de Marrocos ter incluído este ano Espanha no «Grupo» dos países hostis à sua posição sobre o Sahara, o embaixador de Marrocos apressou-se — solicito e reverente —, a saudar o MNE espanhol, José Manuel García-Margallom, pela eleição do seu país para o Conselho de Segurança da ONU
Chissano viajou também a Madrid, Paris, Londres, etc., onde a diplomacia marroquina se mobilizou  para que não fosse recebido. Na capital espanhola reuniu, não obstante, com Gonzalo de Benito, secretário de Estado para os Assuntos Exteriores, junto do qual reiterou a mesma mensagem sobre a responsabilidade de Espanha enquanto potência administrante.
O chefe da diplomacia espanhola, José Manuel García-Margallo, não gosta que lhe recordem que Espanha é potência administrante porque, em teoria, isso deveria obrigá-lo a desempenhar um papel mais ativo na procura de uma solução para um conflito que dura desde há 39 anos.
Até agora, o Governo do Partido Popular apoiou discretamente Marrocos. Fê-lo, por exemplo, em abril de 2013, secundando a França para impedir que fosse por diante a ampliação do mandato do contingente da ONU no Sahara (MINURSO) para que pudesse vigiar o respeito dos direitos humanos, proposta apresentada pelos EUA.
Nem sempre García-Margallo foi tão discreto. Em junho de 2012, arremeteu em público em Rabat contra Christopher Ross, enviado pessoal para o Sahara de Ban Ki-moon, o secretário-geral da ONU. Alinhou-se então abertamente com o Governo de Marrocos que um mês antes retirara a sua confiança a Ross, embora tenha tido que retificar a sua postura em agosto, depois de Ban Ki-moon ter chamado por telefone o rei Mohamed VI.
Apesar de todas estas deferências com as teses marroquinas, a diplomacia de Marrocos colocou este ano Espanha entre os países hostis à sua posição sobre o Sahara, junto com a Zâmbia, Nigéria, Etiópia, etc. O embaixador Hilale enviou a 2 de outubro outro telegrama a Rabat em que faz o resumo dos trabalhos da Assembleia Geral da ONU. Nele divide os participantes em três grupos: de amigos; neutrais e adversários do que os marroquinos chamam "a causa nacional".
A inclusão de Espanha entre as potências hostis deve-se, segundo suspeitam fontes diplomáticas espanholas, ao fracasso das iniciativas marroquinas para que [o Ministério de] Assuntos Exteriores desse com a porta no nariz a Chissano quando este visitou Madrid no verão. Apesar de ser um ex-chefe de Estado não foi recebido pelo ministro mas pelo seu número dois.

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