Professor de
história contemporânea na Universidade Paris 1, Pierre Vermeren é autor de
várias obras sobre o reino cherifiano, entre as quais “Le Maroc de Mohammed VI,
la transition inachevée” (Poches La découverte, 2012)
Por Pascal Airault
A França e Marrocos podem passar um sem o
outro ?
Em termos
absolutos, é possível, mas parece difícil, tendo em conta a imbricação dos dois
Estados e de seus interesses comuns desde há 50 anos. Há em primeiro lugar a
questão dos cidadãos marroquinos em França e dos franceses de origem
marroquina, estimados em 2,5 milhões de pessoas em quatro gerações. Um agente
em cada dois da Direcção-Geral de Pesquisa e Documentação (DGED, serviços secretos
marroquinos) está trabalhando em França e vigia os seus concidadãos. Depois, há
os interesses comuns na luta contra potenciais terroristas em Marrocos, Europa
e Síria (os dois países compartilhavam uma série de informações, até
recentemente), assim como os interesses económicos dos dois países. Grupos
franceses estão muito presentes em Marrocos no setor automóvel, banca, serviços
e os seus investimentos são importantes.
A França é
também um elemento de influência do reino aluita na Europa e Marrocos um dos
pilares do sistema francês em África. É, sobretudo, uma plataforma para
investimentos conjuntos e conquista de mercados no continente. Mas nem tudo são
rosas… O tráfico de haxixe é um vetor de insegurança e criminalidade em França.
É também o ponto cego do tráfico de armas e de atividades terroristas. Em todos
esses pontos, os dois países fariam bem em fazer o seu aggiornamento.
Não tem a impressão que, com os socialistas
no poder, as relações são mais difíceis do que com a direita ?
Socialistas franceses
como Dominique Strauss-Kahn ou Martine Aubry são muito próximos de Marrocos e
não têm nenhum problema com a «sua monarquia de missão divina», segundo a
expressão empregue pelo falecido Hassan II. Mas há outros socialistas mais
estritos com os valores republicanos e a laicidade. In fine, os dirigentes socialistas que chegaram ao poder (Mitterrand,
Jospin e hoje Hollande) não apresentavam um tropismo particular por Marrocos.
Como a diplomacia e a defesa são geridos pelo palácio e pelo próprio rei, a
qualidade desta relação depende do inquilino do Eliseu. Ora é aí que se tratam tanto os assuntos de
segurança interna e externa como as questões menos substantivas, como o registo
de uma criança de uma boa família numa escola francesa ou outros privilégios. A
França serve de local de repouso e retaguarda das elites marroquinas e da família
real, e alguns dos seus membros aí residem habitualmente. Por seu lado, Marrocos
concede a sua hospitalidade aos franceses, patrões em busca de grandes contratos
ou homens de negócios sem escrúpulos que procuram lucros rápidos,
personalidades retiradas, atores em final de carreira, políticos em busca de exóticos
prazeres lícitos e ilícitos… O reino tem nisso interesse em matéria de obtenção
de divisas e de imagem.
Para a França, é possível ser ao mesmo
tempo amigo de Marrocos e da Argélia ?
Não é
necessariamente do interesse das autoridades francesas escolher entre um e
outro, por razões históricas, geopolíticas, económicas e migratórias, e isso
depende dos dossiers. Esses dois países têm povos muito próximos, que partilham
as mesmas culturas e mais de um século de história com a França. Depois da
guerra da Argélia, a balança pendeu durante muito tempo para o lado de Marrocos,
mas a lógica ditaria que teria que haver um equilíbrio político, mesmo que isso
tenha tornado complicado pela questão do Sahara Ocidental, que arruinou as
relações entre Marrocos e a Argélia. A chegada ao poder de François Hollande
reequilibrou o relacionamento em favor da Argélia, o que é muito mal-encarado em
Rabat.
Fonte : Le
Opinion
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