Os magnatas mundiais do neoliberalismo e o seu aparelho de propaganda
global fizeram-nos crer que a globalização era a solução para os problemas da
humanidade para a paz, enquanto o poder político absoluto e o controlo dos
recursos e do comércio mundial ficava nas mãos de uns poucos.
Hoje, mais de 20 anos após a queda do “Muro de Berlim”, esse mesmo
poder absoluto está, mais do que nunca, a provocar mais desigualdade, fome,
focos bélicos, população deslocada e refugiada.
Segundo dados das agências internacionais dependentes e colaboradoras
da ONU, a população mundial deslocada, exiliada ou refugiada devido a desastres
naturais, conflitos, guerras civis ou invasão militar do seu próprio país,
supera os 45 milhões de pessoas, das quais:
— Quase 29 milhões vivem deslocados ou exiliados em acampamentos de população
refugiada, suportando carências alimentares, sanitárias, higiénicas e condições
climáticas extremas e adversas.
— 15,4 milhões fugiram do seu país, obrigados e perseguidos pela fome,
por questões políticas ou religiosas, em busca de um lugar mais seguro para a sua
integridade física e das suas famílias.
Em menos de uma década duplicaram os conflitos civis e militares nas
zonas do mundo mais ricas em matérias-primas (sobretudo em minerais, hidrocarbonetos,
madeira e outros recursos naturais), fomentados pela ambição da indústria e do comércio
dos países do primeiro mundo, respaldados pelo império da globalização capitalista.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e outras
instituições, referem-nos o Paquistão como o lugar onde se concentra o maior
número de população deslocada e refugiada, fugida do Afeganistão, Iraque, e outros
países limítrofes. No entanto, observando os conflitos mais recentes da Síria,
Sudão, Mali, Quénia, Etiópia e Iraque (invadido e destruído até às suas
fundações, saqueado do seu património histórico e cultural e dos seus recursos
naturais, após a saída das potências multinacionais, entre as quais Espanha,
Reino Unido e EUA), questionamo-nos quando aos dados da agência, e constatamos
que estes últimos países são, por excelência, aqueles com mais pessoas deslocadas
hoje em dia. Além disso, damo-nos conta de como continuam esquecidos das
agendas políticas internacionais, os conflitos que provocaram a condição de
refugiado mais antiga da história recente: o da Palestina e do Sahara
Ocidental: dois povos invadidos e massacrados permanentemente por Israel e Marrocos,
protegidos por esse falso e hipócrita império da globalização, liderado pelo gendarme
do Mundo, os EUA.
O Sahara, Espanha e a Monarquia dos
Borbons. Imaginemos por um instante pormo-nos na pele de todos os/as
refugiados/as e deslocados/as do mundo, hoje dia 20 de Junho, no seu “Dia
Internacional” decretado pela ONU (que, diga-se de passagem, não serve para
nada senão para que nos recordemos bem da sua situação e a gravemos na nossa memória).
O caso do povo refugiado mais próximo e vinculado a Espanha é o do Povo
Saharaui, cuja situação de abandono e desamparo é de absoluta responsabilidade
do Reino de Espanha, da sua Monarquia e, por consequência, de todos os espanhóis
e espanholas. Milhares de cidadãos e cidadãs de todas as comunidades, regiões e
municípios do Estado espanhol não esquecem esta responsabilidade incumprida pelos
partidos políticos e governos, e ajudam a sobrevivência do povo saharaui, cobrindo,
na medida do possível, suas necessidades mais básicas, exigindo que se lhe faça
justiça, reclamando que se cumpra com o dever de Reparação e com a Jurisprudência
Internacional, para que o povo saharaui possa exercer o seu direito de
autodeterminação e independência do Reino de Marrocos, que ocupa de facto o Sahara
Ocidental, causando dor e sofrimento ao nosso povo irmão.
O Povo Saharaui, desde há 40 anos, vive dividido entre os Acampamentos
de População Refugiada em Tindouf, no sudoeste da Argélia, os territórios
ocupados pelo Reino Alauita e a diáspora, especialmente no sul da Europa, ainda
que haja milhares de pessoas espalhadas por todo o planeta. Entretanto, o território
do Sahara Ocidental mantem-se dividido de Norte a Sul pelo muro mais extenso do
mundo, construído nos anos 80 do século passado por Marrocos, com financiamento
de França e Israel e apoio logístico dos EUA, enquanto Espanha, e os seus dirigentes
— tanto de direitas, como social-democratas
—, viravam a cara de vergonha para outro lado, tal como o continuam a fazer
hoje em dia.
O movimento de solidariedade com o Povo Saharaui reclama neste momento,
poucas horas depois da coroação de D. FELIPE VI como novo Rei de Espanha, que
repare o flagrante incumprimento da palavra dada por seu pai JUAN CARLOS I ao Povo
Saharaui na cidade de El Aaiún a 2 de novembro de 1975, quando prometeu solenemente
defendê-lo e não o abandonar, ante a ameaça de invasão marroquina. Dias depois,
a 14 de novembro desse mesmo ano, vendia o “Sahara Espanhol” e a sua gente, na
qualidade de Chefe de Estado espanhol em funções, com a sua assinatura Real, através
dos traidores e infames “Acordos Tripartidos de Madrid”, pelos quais se vendia e
abandonava os saharauis à mercê de Marrocos e Mauritânia. Aquela venda, favoreceu
que HASSAN II de Marrocos reconhecesse como seu “irmão” mais novo Juan Carlos
I, e apoiasse economicamente a consolidação político e patrimonial da monarquia
espanhola, contando além disso com a amizade indissociável e pessoal dos reis da
Arábia Saudita, último país visitado oficialmente pelo velho rei Juan Carlos.
Nesta hora aziaga, em que Espanha herda não só a coroa mas também as dívidas
e os incumprimentos familiares dos Borbons, esperamos ardentemente que, o
primeiro país que Felipe de Borbon visite, após a sua coroação como novo Rei de
Espanha, não seja Marrocos, e que demonstre a sua independência em relação ao Sultão
Alauita, rompendo assim a cadeia de silêncio, que a ação de seu pai provoca na
política exterior espanhola.
Fonte:
porunsaharalibre.org / Por Miguel Castro – vice-presidente da Asociación de
Amistad con el Pueblo Saharaui de Sevilla.