Assembleia Geral das Nações Unidas |
A Palestina empreende agora o caminho que há pouco mais de
uma década foi iniciado pelos timorenses. Quando alcançaram a independência
depois de duas décadas e meia de ocupação estrangeira. Na fila de espera para o
acesso ao numeroso, embora selecionado, clube de Estados soberanos, o próximo
na fila parece ser o Sahara Ocidental.
Apesar dos paralelismos entre os três, os casos que maior similitude
têm são os de Timor-Leste e do Sahara Ocidental.
Descolonização inacabada
e Guerra Fría
15.000 kilómetros
separam Dili, capital de Timor-Leste, de El Aaiún, capital do Sahara Ocidental.
Dois pontos do globo sem conexão aparente que, durante mais de 24 anos,
compartilharam os destinos.
Espanha e Portugal mantiveram durante a sua história muitos pontos
de encontro. A partir de 1945, ambos os países, como também o fez a França, puseram
em prática políticas de “maquilhagem”, e procuraram evitar as pressões das Nações
Unidas para que iniciassem processos de autodeterminação dos territórios que ainda
controlavam, chegando, inclusive, a dar o estatuto de província às suas colónias.
Nessa longa jornada através da história em comum, 1975
marcou um ponto decisivo de viragem para a Península Ibérica. Portugal, com a sua
Revolução dos Cravos, tinha posto um ponto final há um ano à ditadura de
Salazar-Caetano e dispunha-se a liquidar com o seu império colonial. Em Espanha,
o regime de Franco aproximava-se das suas últimas horas mas, ao contrário dos
portugueses, os espanhóis não tinham prestado muita atenção à questão do Sahara
Ocidental (então a 53.ª província espanhola), até que o rei Hassan II de
Marrocos decidiu desencadear a "Marcha Verde ", fazendo saber assim
ao mundo a sua intenção de assumir o controlo do território.
1999: Referendo de autodeterminação em Timor-Leste |
Um mês após a "Marcha Verde", em Dezembro de 1975,
do outro lado do mundo, os timorenses viram como o seu processo de autodeterminação
parecia liquidado pela invasão do território pelas forças armadas da Indonésia.
A comunidade internacional não pareceu dar demasiada importância àquela ação. A
Guerra Fria orientava os interesses dos líderes de ambos os lados, que procuravam
ganhar o apoio dos novos territórios independentes que nasciam. Essa rivalidade
mostrou a sua face mais sangrenta nas guerras civis em Angola e Moçambique e
que acabaram por envolver países vizinhos, como a África do Sul ou o Congo, e
outros tão distantes como Cuba.
Neste contexto, não é difícil imaginar que o controle pela
Indonésia de Timor-Leste, e do Sahara por Marrocos e pela Mauritânia (que depressa
abandonaria as suas pretensões) fosse interpretado mais como um alívio do que
como uma complicação. No entanto, tanto Timor-Leste, tal como o Sahara,
permaneceram como exemplos de violação das regras do direito internacional
público sobre aquilo que as potências mundiais, com as Nações Unidas como farol
orientador, tinham construído a realidade do sistema internacional.
Independência vs. Factos
consumados
Neste jogo de paralelismos históricos, 1991 marcou o segundo
marco na evolução dos destinos do Sahara Ocidental e de Timor-Leste. No
primeiro caso, Marrocos e a Frente Polisario assinaram um acordo de paz que pôs
fim aos combates armados que duravam desde 1976. No segundo caso, a matança pelo
exército indonésio de mais de 200 pessoas a 12 de novembro no Cemitério de
Santa Cruz, em Díli desencadeou os acontecimentos que marcariam o seu destino. O
massacre colocou Timor na agenda da política internacional.
Os mortos e
desaparecidos aumentaram a pressão e o interesse mundial crescente sobre o que
ali se passava. O que, até então, tinha sido considerado um conflito esquecido
voltou às primeiras páginas de todos os jornais. As atrocidades do exército
indonésio ganharam destaque quando os media internacionais decidiram concentrar
a sua atenção naquela pequena ilha do sudeste asiático. As críticas sobre Jacarta
aumentaram, atos de protestos tiveram lugar em vários países, como na Austrália
(até então defensora ferrenha das teses indonésias) e em Portugal, a antiga
potência colonial, gerou-se uma mobilização social como nunca antes tinha
acontecido até então. Em 1996, dois líderes da luta pela independência, José
Ramos Horta e o bispo Ximenes Belo ganharam o Prémio Nobel da Paz, no que foi
um reconhecimento da sua luta e um revés para as intenções de Jacarta.
Timor finalmente acedeu à sua independência em 1999, quando
80% da população votou pela autodeterminação, ingressando, em 2002, na
Organização das Nações Unidas como Estado soberano. Uma viagem não sem escolhos,
com reações violentas das fações residentes pró-indonésias e com a dificuldade
acrescida de recenseamento e se chegar a acordo sobre a população com direito a
votar.
O mesmo ponto parece intransponível nos diálogos
estabelecidos entre Marrocos e a Frente Polisario. No entanto, e apesar da
descrença de muitos e a crítica de outros tantos, Timor é um exemplo da
eficiência do trabalho das Nações Unidas.
Os saharauis aguardam há 37 anos a possibilidade de escolher o seu destino |
O Sahara Ocidental espera e ambiciona ainda por essa autodeterminação.
O conflito torna-se ciclicamente num dos principais obstáculos nas relações
entre Marrocos (potência ocupante ainda) e Espanha. O reconhecimento, há poucos
dias, pelo Parlamento Sueco, sobre a necessidade da via da estabilidade para o contencioso
e para a população saharauis que se arrasta há 35 anos, colocou-o,
temporariamente, sob os holofotes da atenção mundial. Ainda assim, poucos
prenunciam uma resolução do conflito em 2012 e, quem sabe, se mesmo na década
em que vivemos. A presença de Marrocos no Conselho de Segurança das Nações
Unidas como membro não-permanente para o período 2012-2013 não constitui
certamente uma ajuda para os defensores do povo da autodeterminação do povo
saharaui. Isso, apesar de Marrocos ter votado positivamente a favor da candidatura
da Palestina como Estado Membro Observador na ONU no passado dia 29 de novembro.
Muito bom e atual este texto. Parabens ao autor. Excelente trabalho!!!
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