No meio do deserto do Sahara, três mulheres e três homens caminham
pela areia envoltos em pesados casacos azuis. As mulheres têm as suas cabeças cobertas
por um turbante e a cara protegida por uma máscara de plástico. Em torno da sua
cintura, alguns “aparelhos” assobiam sempre que se deparam com um objeto metálico.
As suas pernas movem-se no interior de um retângulo amarelo
frágil. Tudo acontece em com muita lentidão. Exploram o território com
movimentos prudentes e medidos que fazem lembrar as passadas silenciosas de um
puma.
Elas chamam-se Toufa, Chaia e Mariam e são as primeiras
mulheres saharauis a trabalhar no programa de desminagem no Sahara Ocidental. Há
um ano que arriscam as suas vidas para a desativar minas anti-pessoal, bombas
de fragmentação, mísseis e todo o tipo de artefactos explosivos enterrados no
deserto.
"Antes de começar este trabalho, não fazia ideia que existissem
tantas minas na nossa terra", diz Mariam, 23 anos , e um olhar firme.
"Nunca na minha vida tinha visto uma mina perto de mim, a não ser na
televisão", diz Toufa, vestida com uma Melfa rosa, o traje tradicional da
mulher saharaui.
Mais de 10 milhões de minas e bombas de fragmentação ocultam-se
ao longo dos 2700 km de extensão do "muro da vergonha", a forma como
os Saharauis se referem à enorme fortificação que separa o Sahara ocupado por
Marrocos desde 1975, dos territórios reconquistados pela Frente Polisário, após
16 anos de uma guerra sangrenta, que terminou em 1991.
É uma longa ferida de arame farpado e areia que separa em
dois um povo e o seu país. O reino alauíta construí-o na década de oitenta para
repelir os ataques dos guerrilheiros saharauis e chegou a gastar, na sua manutenção,
a astronómica cifra de três milhões de dólares por dia.
Permanentemente vigiado por 165.000 soldados armados até os
dentes, o muro do Sahara é considerado o maior campo de minas do mundo. Desde
2006, a ONG britânica Landmine Action (LMA) luta para recuperar este território
martirizado pelas bombas e muito rico em fosfatos, matéria-prima valiosa para a
produção de fertilizantes e a verdadeira razão deste conflito esquecido
Landmine Action atua em países como o Iraque, Paquistão,
Líbano ou Libéria. No Sahara, têm o seu quartel-general em Tifariti, uma pequena
aldeia do deserto a 600 quilómetros de Tindouf (Argelia), onde mais de 150 mil
refugiados saharauis vão sobrevivendo há 37 anos.
Tifariti é um emblema na história recente dos saharauis. Aqui
chegaram os primeiros refugiados após a ocupação de Marrocos, depois da retirada
de Espanha. Sobre estes acampamentos improvisados caíram as bombas marroquinas
de napalm e fósforo branco, em 1976.
Desde então, este povoado é habitado apenas por nómadas e um
punhado de militares polisarios. Uma escola sem alunos, um hospital sem pacientes,
e uma dezena de casas em ruinas são os únicos edifícios deste povoado, que faz
recordar um filme do Oeste.
"As minhas amigas ficaram surpreendidas quando lhes disse
que vinha trabalhar aqui e neste projeto", lembra Toufa, 28 anos.
"Algumas disseram-me que poderia ser perigoso, mas, no fim, elas e a minha
família entenderam a minha escolha", acrescenta em Hassania, o dialeto dos
saharauis.
A entrevista desenvolve-se na sala de jantar da sede da ONG,
uma sala pequena e escura onde apenas cabe uma mesa, uma televisão e um
frigorífico. Mohamed traduz, palavra por palavra, num castelhano muito erudito.
Toufa e Mariam ouviram falar do da AML através de um anúncio na rádio saharaui.
Texto: Valeria Saccone
Fotos: Pablo Balbontín e Landmine Action
Artigo publicado
pelo Semanário Mexicano "Día Siete"
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