Por Berenice Bento - Com gestos firmes e herdados, a mulher preparava o chá. O líquido quente e escuro era derramado de um copo ao outro. A espuma espessa formava-se depois de longos e ritmados movimentos. Para chegar àquela textura de borda branca do chá, era preciso paciência. A espuma deveria ser cultivada lentamente. Dizem que o primeiro copo de chá preparado pelas pessoas do Saara do Ocidental é amargo como a vida; o segundo, doce como o amor; o terceiro, macio como a morte. Talvez faltasse um quarto: o da paciência.
Dentro de uma tenda, em pleno deserto do saara, escutei a voz daquela mulher misturada ao som do chuá-chuá: “estamos cansados. Até quando?” Ela nasceu em uma tenda, em um campo de refugiados. O povo do saara ocidental está separado há mais 45 anos. Parte da população está sob a dominação do Reino de Marrocos, uma ocupação colonial. Uma segunda parte vive em vários países e uma terceira, em imensos campos de refugiados no deserto.
A covarde posição da ONU diante dos abusos do Reino de Marrocos é vergonhosa. Em fevereiro de 2020 conheci os campos de refugiados. São quase 200 mil pessoas que vivem em situação de profunda precariedade. O curta metragem “Saharaui: memória e exílio” é resultado dessa imersão nos cheiros, sabores e indignação de um povo privado do seu direito à autodeterminação.
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