Quando já são as
próprias organizações “oficiais” criadas pelo regime a denunciar, com
frontalidade, os abusos e tratamentos inumanos existentes nas delegacias de
polícia, nas prisões “declaradas” ou nos centros secretos de detenção do Reino,
é de perguntar:
— será que o regime
de Mohamed VI está sinceramente empenhado em redimir-se de décadas de vergonha
e iniquidade?
— ou procura, simplesmente, antecipar-se às
condenações que vão surgir a nível internacional com a revelação dos relatórios
de Juan Méndez, Relator Especial das Nações Unidas sobre a Tortura, da Fundação
Robert Kennedy para a Justiça e os Direitos Humanos, ou do Enviado Pessoal do
SG da ONU para o Sahara Ocidental...?
Os presos sofrem "tratamentos cruéis, desumanos ou
degradantes" na maioria das superlotadas prisões de Marrocos. Esta é a
triste conclusão relatada no final da visita de campo realizada pelo Conselho
Nacional de Direitos Humanos (CNDH) [organização «oficial» criada pelo poder
palaciano de Rabat para «lavar a face» de décadas de violações dos DDHH em
Marrocos - Driss El Yazami e Mohammed Sebbar foram nomeados respetivamente Presidente
do CNDH e Secretário-geral pelo Rei Mohamed VI, a 3 de março de 2011], num
relatório intitulado "A crise nas prisões, uma responsabilidade
partilhada", lançado em Rabat, terça-feira 30 de outubro. Muitas vezes
criticado por defensores dos direitos humanos, incluindo o Observatório
Marroquino de Prisões, estas violações são desta vez reconhecidas por um
organismo oficial, presidido por Driss El Yazami, e cujos membros foram
nomeados pelo rei Mohamed VI.
O CNDH, que lamenta "a falta de controlos e inspeções eficazes
", "uso excessivo" da prisão preventiva e da lentidão dos julgamentos,
ou mesmo o abuso de transferências administrativas frequentemente utilizadas
como medida disciplinar contra os salafistas, afirma que os tratamentos cruéis "traduzem-se
através de golpes de cassetetes e mangueiras, suspensão em portas com algemas,
espancamentos nas solas dos pés, murros, picadas com agulhas, queimaduras,
(...) o despir-se forçado”. Nas suas recomendações, a organização apela para
"o desenvolvimento de um plano de ação para a erradicação da
tortura", em parceria com "as autoridades judiciárias, o Parlamento,
o governo e a sociedade civil."
"ausência total contacto
com o mundo exterior"
A situação das mulheres na prisão é ainda pior: elas
"sofrem mais, por considerações socioculturais, os tratamentos cruéis e os
comportamentos degradante [insultos, humilhações], tanto nas delegacias policiais
como nas prisões."
As prisioneiras que dão à luz vêem-se constrangidas, expirado
o prazo que lhes é dado após o nascimento dos seus bébés, e na ausência ou recusa
de parentes seus para deles cuidar, "a abandonar os seus filhos a favor de
terceiros que os exploram, ou levando-os para a mendicidade ou colocando-os em
orfanatos. "
As pessoas vulneráveis e
estrangeiros, em particular os migrantes subsaharianos, não estão em melhor
situação. A juntar aos maus-tratos que sofrem tal como todos outros, "a
falta ou ausência total de contacto com o mundo exterior."
Mohamed VI: jogada de antecipação e lavagem de face...? |
A ACAT-France (Ação dos Cristãos contra a Tortura), que
apoia a iniciativa, anunciou ter informado o relator especial das Nações Unidas
contra a tortura para o caso de dois grevistas da fome: Adil Lamtalsi, produtor
de cinema, e Mustafa Naim animador social. Estes dois franco-marroquinos presos
na prisão de Salé, perto de Rabat, foram condenados por crimes de direito comum.
Os seus testemunhos são muito semelhantes, denuncia a ACAT em comunicado:
" vários dias de sevícias num centro de detenção secreto em Temara, às
mãos da Direção Geral de Vigilância Territorial, assinatura de confissões sob coação,
cumplicidade de juízes e denúncias de tortura permaneceram letra morta ".
A 11 de setembro, o CNDH já havia denunciado uma declaração
crítica sobre a situação nos hospitais psiquiátricos, qualificando-a de
"arcaica e inadequada".
Driss El Yazami, Presidente do CNDH (Conselho Nacional dos
Direitos Humanos)
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