A justiça marroquina voltou a suspender na passada
segunda-feira (e já lá vão seis vezes) o julgamento de recurso de Mohamed
Dihani, o ativista saharaui condenado a dez anos de prisão por suposta conspiração
jihadista. Dihani entrou na sala do tribunal de Rabat gritando palavras-de-ordem
a favor da autodeterminação do Sahara Ocidental e um grupo de polícias marroquinos
saltou sobre ele e puxou-o para fora da sala aos empurrões. Quando a porta se fechou
atrás deles, o público pôde ouvir Dihani gritar, pedindo auxilio para que cessassem
os espancamentos de que estava a ser vítima. Seu pai, que estava entre o público
que assistia ao julgamento, pediu ao juiz que interviesse: “Tem o que merece”, respondeu-lhe
o magistrado.
Antes mesmo que Dihani tivesse entrado na sala de audiências,
já o juiz tinha mostrado uma disposição pouco favorável a que Dihani tivesse um
julgamento justo, tal como o exige ao Governo de Marrocos a campanha
internacional liderada por organizações como a Western Sahara Human Rights
Watch (WSHRW), Asociación Pro Derechos
Humanos de España (APDHE) Sección de Derechos Humanos del Colegio de Abogados
de Zaragoza ou a Asociación Española para el Derecho Internacional de los
Derechos Humanos (AEDIDH). Entre os observadores que viajaram até Rabat para assistir
ao novo julgamento, encontravam-se os dois advogados espanhóis Luis Mangrané e
Magda Such. Com eles, estavam também Brahim Dahane representante da ASVDH (Associação
Saharaui de Vítimas de Violações Graves de Direitos Humanos) e familiares dos
presos de Gdeim Izik que se encontram encarcerados nas proximidades de Rabat.
Segundo o relato de Luis Mangrané, do Observatório Aragonês
para o Sahara Ocidental, ao espacioseuropeos, quando depois de várias sessões
de julgamentos foi a vez de Dihani ser julgado, o juiz tentou uma manobra de
dissuasão para que todos saíssem da sala. "Dihani era o último da manhã e o
único que não compartilhava com outros réus um “aquário” visível ao público. Antes
de dar ordem de entrada para a sala, o juiz, olhando à distância em relação a
nós, perguntou em tom muito irritado: "Quem são vocês? O que estão fazendo
aqui? ". Aparentemente, esperava que nós saíssemos mas, depois de
verificar que nos deixámos ficar nos nossos lugares, mandou entrar Dihani
".
A partir de então, a tensão na sala foi crescendo, como o
confirma Brahim Dahane que chegou a Madrid ontem. O jovem entrou entoando ‘slogans’
que são muito comuns em El Aaiún ("queremos autodeterminação") e
outros, evocando os da Primavera Árabe na Tunísia e no Egito de "queremos
liberdade". Aparentemente, juízes que julgam em El Aaiún os presos
políticos saharauis já estão tão habituados a este tipo de situação que,
inclusive, sorriem para os réus e iniciam o julgamento quando os presos acabam
de gritar as suas palavras-de-ordem. Mas, segunda-feira, em Rabat, o juiz ficou
muito nervoso com Dihani e começou a dar murros na mesa. "Sete policias à
paisana, que estavam sentados na plateia, pularam dos seus assentos e lançaram-se
sobre Dihani e, com a ajuda de outros polícias uniformizados, levaram-no. Mas
nós ouvimos ele gritar por ajuda já no corredor, e também ouvimos os insultos e
os espancamentos que os polícias lhe zurziam", diz Mangrané.
O pai do jovem saharaui Mohamed Dihani |
Segundo este relato, o pai de Dihani, que havia chegado desde
El Aaiún ao julgamento acompanhado por outro dos seus filhos e um sobrinho levantou-se,
e entabulou um diálogo com o juiz. Perguntou-lhe por que não fazia nada para
que deixassem de torturar e insultar o seu filho. “Tem o que merece, por falar”,
respondeu-lhe o juiz.
Dihani foi acusado pela polícia marroquina de ser o chefe de
um gangue de terroristas islâmicos que supostamente se propunha atacar o Vaticano,
a ferrovia italiana, as forças de paz da ONU no Sahara Ocidental, a cinta transportadora
de fosfatos de mina de Bucraa, planeava matar os saharauis favoráveis à anexação
de Marrocos e, até mesmo, uma ação para libertar os presos políticos saharauis
da Prisão Negra de El Aaiún que aí sobrevivem em condições de extrema
dificuldade por se opor à ocupação marroquina da sua terra. Mas, como denunciaram
as organizações de direitos humanos, estas acusações não se baseiam em "provas
sólidas".
Brahim Dahane reiterou ontem que, por detrás da condenação e
da brutalidade policial contra Dihani, o que há é uma retaliação por este se
ter negado a secundar um plano dos serviços secretos marroquinos para que se
prestasse a reivindicar os atentados de uma suposta organização terrorista
saharaui orquestrada por eles.
Aparentemente, o motivo invocado para suspender o julgamento
de Dihani na segunda-feira não foi o incidente que provocou a reação da
polícia, mas um problema com o advogado de defesa do jovem ativista saharaui,
que não foi notificado para se apresentasse para representar o seu cliente. Tudo
indica que o "caso Dihani" se converteu numa batata quente para a
justiça marroquina, que não está interessada em resolver o assunto. O juiz marcou
a nova sessão para o julgamento de recurso para dia 14 de janeiro de 2013.
Espacios Europeas - Ana Camacho
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