terça-feira, 6 de novembro de 2012

Sério revés diplomático para Rabat: Referendo de autodeterminação incontornável




O périplo de Christopher Ross pela região é, em si, um revés para a diplomacia marroquina. Em maio último, o ministro dos Negócios Estrangeiros do governo Benkirane [primeiro-ministro], sob instruções do palácio real, tinha comunicado a Ban Ki-moon a «retirada de confiança» de Marrocos a Christopher Ross.
As autoridades marroquinas exigiam então a retirada de cena do diplomata americano que acusavam de «parcialidade» na sua mediação do conflito saharaui. A iniciativa marroquina surgiu um mês após a apresentação pelo Secretário-geral da ONU do seu relatório anual sobre o Sahara Ocidental, informando o Conselho de Segurança dos bloqueios colocados por Marrocos à MINURSO, organismo das Nações Unidas encarregado de vigiar o cessar-fogo sobre o terreno.

Rabat pede a cabeça de Ross

Foi a ocasião para os marroquinos pedirem a cabeça de Ross que eles tinham acusado injustamente de também de ser o autor de uma passagem do relatório do SG da ONU em que era denunciada a introdução em El Aaiún de um sistema de escuta das conversas aos observadores da MINURSO. No entanto, foi Ban Ki-moon em pessoa que recolhera esta informação junto de várias fontes, segundo o que Ross teria confiado a membros da sociedade civil marroquina com quem se havia encontrado a 27 de Outubro em Casablanca.
Não se deixando de modo nenhum intimidar pelas ameaças veladas do chefe da diplomacia marroquina, Saadeddine El Othmani, de pôr um termo definitivo à sua colaboração com as Nações Unidas na busca de uma solução para o conflito do Sahara Ocidental, Ban Ki-moon afirmará publicamente a sua "plena confiança" ao seu Representante Pessoal para o Sahara Ocidental. Em agosto, ele anuncia ao rei Mohamed VI que Christopher Ross irá empreender uma nova missão na região do Magrebe e Europa. A diplomacia marroquina está nas cordas. O rei marroquino capitula. Primeira derrota do ano para Marrocos, que até ocupa um lugar no Conselho de Segurança da ONU até ao final do ano de 2012.

Firma apoio do SG da ONU ao diplomata americano

O SG da ONU foi apoiado na sua firmeza pelas potências ocidentais cuja voz conta no Conselho de Segurança. Estranha coincidência de calendário, a direita francesa, aliada incondicional do Reino de Marrocos, perde o poder em maio. A ameaça de veto francês é menos sentida no Conselho de Segurança. Marrocos fica isolado na sua recusa em aceitar Ross que Rabat gostaria de ver substituído por um diplomata europeu mais sensível às suas teses, mais conquistado pelo seu plano de autonomia, que nunca foi considerado "credível" no Conselho segurança, ao contrário do deixava entender Rabat. A 27 de outubro de Christopher Ross inicia a sua quinta ronda na região antes de viajar também para a Europa.
Ross vai quebrar pela primeira vez um grande tabu, decidindo encontrar-se em Al Aaiún com Aminatou Haidar e os seus companheiros independentistas. Este é o segundo grande revés para a diplomacia marroquina que tudo tem feito para desencorajar o diplomata americano de se encontrar com esses "inimigos da integridade territorial de Marrocos". Ainda em Nova Iorque, e para não ferir frontalmente Rabat, Ross já tinha encontrado a astúcia: envolver a sociedade civil de ambas as partes envolvidas no conflito do Sahara Ocidental, os saharauis, mas também os marroquinos.

Rabat privado do apoio de Paris e de Madrid

Ross ouvirá da própria boca dos seus interlocutores civis marroquinos em Casablanca que a aspiração de independência saharaui é "uma realidade" e que o plano de autonomia do rei Mohamed VI não é "a solução" para o conflito. Essa voz não está só nem isolada, é mesmo o pensamento profundo da opinião marroquina que é controlada de perto pela polícia nesta questão "vital" para a sobrevivência do Reino.
Privado do apoio diplomático de Nicolas Sarkozy e de Chirac, Marrocos não pode também contar com a Espanha, onde os seus amigos socialistas perderam o poder em novembro de 2011. O Governo Rajoy fez saber imediatamente que continuava comprometido com a realização de um referendo sobre a autodeterminação na ex-colónia espanhola. É o que irá dizer Mariano Rajoy a Ross durante sua escala em Madrid. É provavelmente também o que lhe irão dizer os líderes socialistas franceses com quem se reunirá em Paris.
A questão do direito do povo saharaui à autodeterminação, que Marrocos quis fazer cair num impasse, com o apoio de Sarkozy e de Zapatero, é mais do nunca incontornável. Christopher Ross disso deve ter tido a certeza durante a visita que fez desde domingo aos campos de refugiados de Tindouf, onde se encontrou com os líderes da Frente Polisario, entre os quais o presidente Mohamed Abdelaziz. "Várias fontes" disseram a esta agência de notícias que "uma avaliação das diferentes etapas das negociações entre Marrocos e a Frente Polisario e os fatores que explicam a sua atual paralisia " foi feita entre as duas partes.

Abertura de espírito dos Saharauis

Ao contrário dos marroquinos que se mostraram "inflexíveis" em relação ao seu plano de autonomia, mesmo neste período de fraqueza da diplomacia marroquina na cena internacional, Ross encontrou entre os Saharauis uma maior disponibilidade em cooperar. O representante Polisario junto da MINURSO, Mohamed Khadad, não exclui "a necessidade de encontrar novas vias a fim de quebrar o status quo atual."
Ele interroga-se: "Prosseguir as negociações directas (...) e buscar outras vozes" para quebrar o diálogo informal do impasse, isso é possível, porque "os Saharauis continuam abertos a qualquer proposta que tenha em conta o seu direito à autodeterminação ".
O seu colega, o Secretário de Estado saharaui da Segurança, Ibrahim Ahmed Mahmoud, disse, após o encontro com Ross, que a solução do problema do Sahara Ocidental passa, inevitavelmente, pelo " direito dos saharauis a dispor do seu destino ". É exatamente esta linha vermelha que Christopher Ross mostrou sobre a questão do Sahara Ocidental. Foi em 2010 em Tindouf durante a sua primeira viagem ao Magrebe. O que Marrocos nunca lhe perdoou.

Hania A.

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