sábado, 13 de março de 2021

Figuras nacionais pedem a Governo para apoiar a ocupação de Marrocos no Sahara Ocidental



 

Paulo Portas, José Luís Arnault, mas também Jorge Lacão (PS), são algumas das figuras portuguesas que pedem ao governo que dê "apoio" a Marrocos na sua politica colonial de ocupação da antiga colónia espanhola do Sahara Ocidental - O texto é publicado hoje no DN.

 

Em artigo publicado hoje no DN, e assinado pela jornalista Paula Sá, “Deputados de vários partidos e figuras políticas portuguesas, entre os quais o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros e vice-primeiro ministro Paulo Portas, escreveram uma carta ao primeiro-ministro, enquanto presidente do Conselho Europeu, a apelar para que a Europa apoie a integridade do Reino de Marrocos e das províncias ‘sarianas’. Sobretudo para “impedir a desestabilização do Magrebe, levada acabo pelo grupo independentista Polisario” - diz o artigo.

Além de Paulo Portas, subscrevem esta carta José Luís Arnaut, antigo ministro adjunto de Durão Barroso, António Figueiredo Lopes, antigo ministro da Administração Interna, e deputados do PSD e do PS, entre os quais Paulo Neves, Luís Leite Campos (ambos PSD) e Jorge Lacão (PS).

Os subscritores, que segundo a sua própria lógica argumentativa poderiam utilizar os mesmos termos para defender a ocupação do território de Timor-Leste pela ocupante Indonésia, tal a similitude dos dois processos de descolonização (desconhecemos se, na altura, o fizeram), referem: "Acreditamos que concordará que um Magrebe estável e próspero é ao mesmo tempo um imperativo e um objetivo que merece toda a atenção de Portugal e da Europa", escrevem na missiva a António Costa. Manifestam também preocupação com as consequências nefastas que poderá ter um prolongamento indefinido do status quo e um impasse político no "Sahara Ocidental" (colónia espanhola até 1975).

Os subscritores lobbyistas da ocupaçao territorial do território que as Nações Unidas definem como não Autónomo e, portanto, em processo de descolonização, afirmam ainda: "Com efeito, esta situação agravou-se recentemente com os atos de desestabilização levados a cabo pelo grupo independentista Polisário numa zona altamente estratégica e cuja estabilidade está intimamente ligada à do continente africano, à região do Sahel e mesmo à bacia mediterrânica", afirmam ainda.

Lembram que “recentemente os EUA, e diversos Estados, reconheceram a soberania de Marrocos sobre as suas províncias sarianas e a abertura, por cerca de vinte países, de consulados nas cidades de Laayoune e de Dakla”. A que acresce, sublinham ainda na carta, que “Marrocos é um país ‘amigo’, com o qual partilhamos uma fronteira marítima comum e" interesses políticos e económicos, deveria acompanhar esta dinâmica e, sob a sua presidência do Conselho da União Europeia, levar a Europa a adotar posições muito mais construtivas.

 

Paulo Portas, em março de 2016, na cidade porto de pesca de Dakhla, no sul do Sahara Ocidental ocupado, a convite das autoridades de Marrocos


Quem são os “lobbyistas” da ocupação marroquina do Sahara Ocidental

 

Paulo Portas - Com 58 anos, foi o menino prodígio da Direita Portuguesa: jornalista, líder do partido CDS-PP, ministro, vice-primeiro ministro, comentador político, lobbyista de negócios e empresas, de tudo foi um pouco. A sua ligação a Marrocos não é de agora. Havendo quem invoque que os serviços secretos marroquinos tem, sobre ele, em seu poder, argumentos que o comprometem. Paulo Portas tem-se prestado a protagonizar algumas encenações de Marrocos nos territórios do Sahara Ocidental. Em 2016, por exemplo, participou, em Dakhla na cidade pesqueira do sul do território, num encontro organizado pelo mafioso grupo suíço Crans Montana Forum.

José Luís Arnaut (PSD)- Já há muitos anos ligado à política pelo PSD, tendo sido ministro, deputado e desempenhado muitos outros cargos, lidera uma importante firma de advogados com ramificações internacionais. Como não poderia deixar de ser, cedo se ligou ao mundo dos negócios, à grande finança e ao dirigismo desportivo. É atualmente Presidente do Conselho de Administração da ANA - Aeroportos de Portugal.

Paulo Neves (PSD) - Com 53 anos de idade, professor universitário e advogado, é natural do Funchal, e deputado nacional há duas legislaturas pelo PSD eleito pelo círculo da Madeira. Pertence à Comissão de Negócios Estrangeiros e Cooperação do Parlamento.

António Figueiredo Lopes (PSD) - Com 84 anos, é atualmente um político na reforma. Advogado, foi ministro da Defesa Nacional e também da Administração Interna em Governos do seu partido.

Jorge Lacão (PS) - Com 66 anos, é um verdadeiro “dinossauro” entre a classe política portuguesa, sendo deputado nacional há 11 legislaturas (cerca de 44 anos). É membro da Comissão Política Nacional do Partido Socialista.

 

 

Nota da AAPSO à notícia do DN:

Na realidade, 45 anos passados sob a ocupação da antiga colónia espanhola do Sahara Ocidental, nenhum país reconheceu «oficialmente» a soberania do Reino de Marrocos sobre esse território do noroeste de África. O ex-presidente dos EUA, Donald Trump, emanou através de um tweet uma proclamação presidencial a 10 de dezembro de 2020, reconhecendo as reivindicações territoriais ilegais do Reino de Marrocos sobre o Território Não Autónomo do Sahara Ocidental, a troco como contrapartida o reconhecimento e o estabelecimento de relações diplomáticas de Israel por parte do Estado marroquino.

A proclamação acima mencionada, e ainda não revertida pela atual Administração Biden, constituiu uma violação flagrante do direito internacional e da Carta das Nações Unidas em muitos aspetos e atropelou aquilo que foi a política norte-americana em relação ao Sahara Ocidental e o direito de autodeterminação dos povos sob jugo colonial.

O Sahara Ocidental, uma ex-colónia espanhola, é um território definido por fronteiras internacionais herdadas da época colonial e habitado por um povo soberano cujo direito inalienável à autodeterminação foi reconhecido pela Assembleia Geral das Nações Unidas desde 1963 com a inclusão deste território na lista de Territórios Não Autónomos das Nações Unidas.

Esta condição foi ainda consolidada pelo parecer consultivo do Tribunal Internacional de Justiça em outubro de 1975, além de outras decisões relevantes, incluindo as do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) que decidiu, em 2016 e 2018, que em virtude da Carta das Nações Unidas o Sahara Ocidental tem "um estatuto separado e distinto" em relação ao Reino de Marrocos e "que o território do Sahara Ocidental não faz parte do território do Reino de Marrocos".


"O Povo Saharaui, tendo como seu único representante a Frente Polisario, e o Reino de Marrocos, subscreveram em 1991 um acordo de resolução que previa, entre outras coisas, o estabelecimento de um cessar-fogo, e a realização de um REFERENDO livre, justo e transparente à população autóctone. Para isso a ONU criou então a MINURSO - Missão das Nações Unidas para o Referendo no Sahara Ocidental".


A Frente Popular de Libertação do Saguia El Hamra e Rio de Ouro (POLISARIO) é um movimento de libertação, constituído em 1973, ainda no tempo colonial espanhol, e reconhecido pelo ONU como representante único do Povo do território

Nas últimas três décadas, o Reino de Marrocos e a Frente Polisario — o único e legítimo representante do povo saharaui (AGNU Res. 34/37 de 21 de novembro de 1979) — acordaram, sob os auspícios das Nações Unidas, um Plano de Resolução que permitisse ao povo saharaui exercer o seu direito inalienável à autodeterminação e à independência através de um REFERENDO livre, transparente e democrático; que, infelizmente, está paralisado desde que as autoridades marroquinas decidiram unilateralmente retirar-se desse acordo vinculativo.

Com esse objetivo, as parte em conflito, o Povo Saharaui tendo como seu único representante a Frente Polisario, e o Reino de Marrocos, subscreveram um acordo de resolução que previa, entre outras coisas, o estavbelecimento de um cessar-fogo, e a realização de um Referendo livre, justo e transparente à população autóctone. Para isso a ONU criou então a MINURSO - Missão das Nações Unidas para o Referendo no Sahara Ocidental. O REFERENDO que estava estipulado se realizaria seis meses depois da assinatura do acordo de resolução (em 1991) está ainda por realizar.

O Sahara Ocidental continua a ser, pois, o último território da África por descolonizar e o povo saharaui, que desde 1975 sofre a ocupação militar de partes da sua pátria em violação das Convenções de Genebra de 1949, tem defendido incansavelmente o seu direito à autodeterminação e independência, com pleno respeito pelo direito internacional e com fé absoluta no resolução pacífica do conflito.

As cerca de duas dezenas de países que abriram consulados de «fachada» nos territórios ocupados do Sahara Ocidental fizeram-no basicamente por duas razões: ou por solidariedade monárquica com o regime alauita de Mohamed VI — boa parte deles são monarquias do Médio Oriente, pouco recomendáveis em termos de honorabilidade —; a outra parte são Estados pobres ou empobrecidos de África ou da América Latina, em grandes dificuldades financeiras, seduzidos pelos cantos de sereia da corrupção de Marrocos. Fizeram a troco de...

Nenhum deles afirmou, porém, que reconhecia de jure a soberania marroquina sobre o Sahara Ocidental. Não tiveram essa coragem...

Por último refira-se que o reatamento da guerra no Sahara Ocidental, no passado dia 13 de novembro de 2020, se deveu à falta de palavra e compromisso de Marrocos em cumprir e respeitar os acordos que estabeleceu em 1991 com a Frente Polisario e com a ONU. Ao invadir e ocupar a zona desmilitarizada-tampão de El Guerguerat, junto à fronteira com a Mauritânia, no extremo sul do território do Sahara Ocidental, por forma a garantir a exportação dos recursos naturais que explora ilegalmente do território e que lhe rendem anualmente muitos milhões de euros, Marrocos não só quebrou violenta e ostensivamente o cessar-fogo como veio pôr em perigo a estabilidade e segurança em toda a região do Norte de África.

 

13-03-2021

AAPSO - Associação de Amizade Portugal - Sahara Ocidental

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